SARS-CoV-2 e o sistema nervoso central: como acontece a neuroinvasão viral?

O SARS-CoV-2 leva a uma síndrome clínica, a doença coronavírus 2019 (Covid-19). Há evidências crescentes de complicações neurológicas.

O SARS-CoV-2 leva a uma síndrome clínica, a doença coronavírus 2019 (Covid-19). Suas manifestações pulmonares foram bem descritas, no entanto, há evidências crescentes na literatura de complicações neurológicas.

médico avaliando exame de sistema nervoso central de paciente infectado pelo sars-cov-2

SARS-CoV-2 e sistema nervoso central

Dois coronavírus humanos semelhantes (CoV), síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV) e síndrome respiratória aguda grave (SARS-CoV-1), também foram associados a doenças neurológicas em casos raros. Isso levanta a questão de saber se o SARS-CoV-2 é neurotrópico e se contribui para as complicações neurológicas pós-infecciosas. Ainda não se sabe até que ponto o SARS-CoV-2 lesa o sistema nervoso central (SNC) ou se os sintomas neurológicos são atribuíveis a mecanismos secundários.

Estudos recentes mostraram que o SARS-CoV-2 (além do SARS-CoV e MERS-CoV) requer o receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2) e a serina protease transmembrana 2 (TMPRSS2) para entrada nas células epiteliais.

Em humanos, a ACE2 é expressa no epitélio das vias aéreas, células renais, intestino delgado, parênquima pulmonar e endotélio vascular e SNC.

Leia também: O que sabemos até agora sobre as manifestações neurológicas da Covid-19?

Recentemente, estudos com camundongos, descobriram que ACE2 é expressa em neurônios, astrócitos e oligodendrócitos. Em relação a topografia, altamente concentrada na substância negra, ventrículos, giro temporal médio, córtex cingulado posterior e bulbo olfatório. A sua expressão também foi identificada no córtex motor, membrana e citoplasma de neurônios, células gliais e vias simpáticas no tronco cerebral.

A expressão generalizada de ACE2 no cérebro levanta a preocupação de que o SARS-CoV-2, da mesma forma que o SARS-CoV-1, tem o potencial de infectar neurônios e células gliais em todo o SNC. Mas quais seriam os potenciais mecanismos de neuroinvasão?

Mecanismos potenciais de neuroinvasão

A neuroinvasão viral poderia ser alcançada de forma plausível por várias rotas, incluindo transferência trans-sináptica através de neurônios infectados, entrada pela via olfatória, por quebra da barreira hematoencefálica ou uma combinação de mecanismos.

Há evidências crescentes de que CoV humano e não humano invadem terminais nervosos periféricos, espalham-se retrógradamente ao longo das sinapses nervosas e penetram no SNC. A transferência trans-sináptica de vírus foi demonstrada para vários CoV, incluindo HCoV-OC43, vírus da encefalomielite hemaglutinante 67 (HEV67) e vírus da bronquite aviária.

Por exemplo, o HEV67 entra na cavidade oronasal e infecta a mucosa nasal, o epitélio pulmonar e o intestino delgado de leitões lactentes e ratos. Em seguida, infecta os nervos periféricos e se espalha retrógradamente para o gânglio da raiz dorsal, terminando nos neurônios medulares.

Durante o surto de Covid-19, foi relatada perda isolada do olfato (anosmia) e do paladar (ageusia), com ou sem sintomas respiratórios. A entrada direta ao longo do nervo olfatório é outro mecanismo potencial para a entrada do SARS-CoV-2 no SNC.

Em um modelo de camundongo transgênico que expressa ACE2, camundongos inoculados com SARS-CoV-1 intranasal, mostraram que o vírus invadiu o SNC por via olfativa. Ainda não está claro se o SARS-CoV-2 pode se espalhar para o SNC de forma semelhante. Alguns estudos já identificaram que o epitélio olfatório expressa ACE2 e são vulneráveis ​​à infecção, enquanto neurônios sensoriais olfativos não expressam ACE2, sugerindo que SARS-CoV-2 não pode obter acesso às células nervosas. Esses achados preliminares sugerem que o dano ao epitélio olfatório está na base da anosmia clínica, ao invés de lesão neuronal.

Uma outra possibilidade de invasão, é via barreira hematoencefálica. A própria inflamação sistêmica que caracteriza Covid-19 provavelmente aumenta a permeabilidade da barreira, permitindo assim que células imunológicas infectadas, citocinas e, possivelmente, vírus passem para o SNC.

Ouça também: Anosmia relacionada à Covid-19: por que acontece e como podemos tratar? [podcast]

Conclusões

Até o momento, o SARS-CoV-2 infectou milhões e afetou bilhões de vidas. A compreensão da doença neurológica em pacientes com Covid-19 está evoluindo, e os médicos devem continuar a monitorar os pacientes.

A detecção precoce de déficits neurológicos pode levar a melhores resultados clínicos e melhores algoritmos de tratamento. As avaliações neurológicas longitudinais dos pacientes após a recuperação serão cruciais para a compreensão da história natural de Covid-19 no SNC e monitoramento de sequelas neurológicas potenciais.

Referências bibliográficas:

  • Adeel S.Z. et al. Neuropathogenesis and Neurologic Manifestations of the Coronaviruses in the Age of Coronavirus Disease 2019. A Review. JAMA Neurol. 2020;77(8):1018-1027. doi:10.1001/jamaneurol.2020.2065

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo

Selecione o motivo:
Errado
Incompleto
Desatualizado
Confuso
Outros

Sucesso!

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Avaliar artigo

Dê sua nota para esse conteúdo.

Você avaliou esse artigo

Sua avaliação foi registrada com sucesso.

Baixe o Whitebook Tenha o melhor suporte
na sua tomada de decisão.