Síncope: nova diretriz indica as melhores condutas para a prática

Este mês fomos presenteados com uma diretriz da ESC sobre síncope. O texto principal fala da classificação, mecanismos fisiopatológicos, atendimento na emergência, opções de tratamento e síncope em situações especiais.

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Este mês fomos presenteados com uma bela diretriz da European Society of Cardiology (ESC) sobre síncope. O texto principal fala da classificação, mecanismos fisiopatológicos, atendimento na emergência, opções de tratamento e síncope em situações especiais. O material está muito bem escrito e didático e recomenda a leitura do texto completo pelos especialistas na área (cardiologia e arritmias). Como a própria ESC escreveu, o documento é prático e voltado a tomada de decisões, “our patients seek solutions, not only explanations”.

1.Defina se o episódio é mesmo síncope

A síncope é uma perda transitória da consciência causada por hipoperfusão cerebral. Esta redução na perfusão pode ocorrer por alterações na frequência cardíaca, na pressão arterial ou em ambas (formas mistas). Por sua vez, a síncope pode ser reflexa ou causada por doença cardiovascular estrutural e sua missão será separar os pacientes de baixo e alto risco para recorrência e, principalmente, morte súbita.

Os principais diagnósticos diferenciais são trauma/concussão, epilepsia e conversão/histeria (causa psicológica).

Doença Dica
Epilepsia Liberação esfincteriana

Abalos musculares

Estado pós-ictal*

Histeria ou conversão Duração excessivamente prolongada

Sabe te contar tudo que aconteceu (não há amnésia)

“Pálpebras ficam piscando”

Avaliação neurológica após despertar sugere simulação

Trauma História

Sinais de trauma**

*O estado pós-ictal é o melhor método para diferenciar síncope e convulsão. O paciente que sincopou acorda mais cedo e mais lúcido em comparação com o estado pós-ictal, no qual o paciente permanece confuso e letárgico mais tempo.
**Lembrar que a síncope, principalmente de causa cardíaca, quando ocorre sem pródromos, pode levar ao trauma na queda.

2.Atendimento inicial e triagem de risco

Toda avaliação clínica começa pela história e exame físico e, neste caso em particular, é importante obter informações de pessoas que testemunharam o evento, pois na síncope verdadeira o paciente não irá se recordar do período no qual ficou inconsciente. Além disso, o ECG é mandatório em todo paciente com síncope.

O que você deve estar atento?

História

  • Pródromos
  • Trigger
  • Postura / posição corporal
  • Se foi durante ou após exercício
  • Como foi despertar
  • Histórico cardiopatia

Exame Físico

  • Sinais vitais – medido supina e de pé
  • Sinais cardiopatia

Ao final, classifique o paciente em alto ou baixo risco. Se você ficar na dúvida, a diretriz classifica como “neither high nor low-risk” (intermediário), mas no final acaba tratando este grupo como se de alto risco fosse.

Alto Risco Baixo Risco
História Palpitações, dor precordial ou dispneia

Durante exercício

Sem pródromos

Cardiopatia prévia

Presença pródromos ou trigger

Ocorre com rotação da cabeça***

Ao levantar

Ausência cardiopatia

Síncopes recorrentes em situações similares

Exame Físico PAS < 90 mmHg

Sangramento digestivo*

Sopro sem diagnóstico prévio

FC < 40 bpm em não-atletas

Normal
ECG Major BRE ou BRD > 120 ms

Onda Q patológica

HVE

Brugada

FC < 40 bpm

BAV 3º grau ou 2º grau Mobitz 2

Isquemia aguda

Pausa sinusal > 3 seg

TV ou TVNS

Disfunção marcapasso

QT longo > 460 ms

Normal
ECG Minor BAV 1º grau ou BAV 2º grau Mobitz 1

FA ou TSV

FC 40-50 bpm

Pré-excitação

QT curto < 340 ms

Brugada atípico

Ondas T invertidas precordiais direitas**

Normal
*Inclui toque retal com fezes na luva
**Levando à suspeita de displasia arritmogênica do VD
***Suspeita hipersensibilidade seio carotídeo

Quem você vai manter internado?

  • Alto risco
  • Risco intermediário (“neither high nor low-risk”)
  • Baixo risco, se síncope recorrente

A diretriz diz que a internação pode ser simplesmente ficar na emergência em observação, em uma unidade especializada em síncope ou em unidade de internação. Uma vez decidido por internar, é fundamental a monitorização cardíaca contínua. Portanto, não faz sentido internar o paciente em um quarto de andar sem monitor. Um primeiro episódio de síncope em paciente de baixo risco pode ser investigado ambulatorialmente.

Da mesma forma, o documento não indica escores de risco específico para síncope, pois nenhum se mostrou, até então, superior ao julgamento clínico.

3.Exames a serem realizados após avaliação inicial

A escolha dos exames que devem complementar sua avaliação inicial depende da estratificação de risco e possível mecanismo fisiopatológico. De qualquer forma, hemograma, bioquímica, d-dímero, BNP, troponina e TC de crânio não devem ser usados de rotina, conforme diretriz.

*Principalmente com síncope recorrente (1 ou mais episódios por semana).
**Síncope recorrente sem causa definida; suspeita de epilepsia; queda não testemunhada, onde não se sabe se caiu e perdeu consciência (concussão) ou se a síncope foi a causa da queda.

 

A diretriz não recomenda o Holter de rotina, mas apenas quando há suspeita de uma causa cardiogênica ou na síncope recorrente. Ainda assim, neste cenário há preferência na diretriz pelo monitor de eventos implantado (ILR – implantable loop recorder). Em estudos prévios, o uso deste dispositivo permitiu identificar arritmias com maior precisão e evitar a necessidade de estudo eletrofisiológico em muitos pacientes!

O teste funcional para pesquisa de isquemia miocárdica (ergometria, por exemplo) está indicado apenas nos casos onde a síncope ocorra durante exercício.

Dispositivos com vídeo são encorajados, como, por exemplo, filmar a pessoa durante um tilt test. O tilt test é útil não só para diagnosticar casos de síncope reflexa, quando há alteração na FC e/ou PA associada a sintomas sincopais, como também para avaliar se o mecanismo é bradicardia (cardioinibitório), hipotensão (vasodepressor) ou misto, o que orientará a escolha do tratamento, conforme explicado adiante.

Em todos os exames, só há certeza no diagnóstico se houver reprodução da síncope com identificação do mecanismo subjacente. Por exemplo, uma pausa sinusal com compressão do seio carotídeo sem sintomas é mera hipersensibilidade do seio carotídeo, ao passo que se houver pródromos ou síncope, pode-se classificar como síndrome do seio carotídeo. Isso terá importância no tratamento: quando há relação sintoma – arritmia, a chance de sucesso do tratamento é muito maior.

4.Tratamento

O tratamento dependerá do mecanismo fisiopatológico identificado. Na presença de cardiopatia estrutural, é indispensável o tratamento concomitante da mesma.

*Ao perceber pródromos, sentar ou deitar, de preferência com elevação de MMII, o que aumenta o retorno venoso e, por conseguinte, a pressão arterial. Se não for possível, acocorar-se. Há, ainda exercícios que podem ser usados para aumentar a resistência vascular periférica e reduzir a hipotensão, o chamado “physical counter-pressure manoeuvres” (PCM).
**Inclui aumento da ingestão de sódio para 10g/dia de cloreto de sódio.
***Principalmente nitratos e diuréticos, mas estar atento para medicações que podem causar hipotensão, como antidepressivos e antipsicóticos.

 

A midodrina e a fludrocortisona são as duas medicações com melhor evidência para corrigir a hipotensão. Os betabloqueadores foram usados no passado mas ensaios clínicos recentes levaram a diretriz a contraindica-los na síncope reflexa.

Já na síncope cardiogênica, o tratamento dependerá da doença cardíaca identificada.

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Referências:

  • Michele Brignole, Angel Moya, Frederik J de Lange, Jean-Claude Deharo, Perry M Elliott, Alessandra Fanciulli, Artur Fedorowski, Raffaello Furlan, Rose Anne Kenny, Alfonso Martín, Vincent Probst, Matthew J Reed, Ciara P Rice, Richard Sutton, Andrea Ungar, J Gert van Dijk, ; 2018 ESC Guidelines for the diagnosis and management of syncope, European Heart Journal, , ehy037, https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehy037

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