Síndrome do QT longo congênito: o que devemos saber? – parte 2

A síndrome do QT longo pode ser congênita ou adquirida, sendo que as congênitas estão relacionadas a mutações nos canais iônicos e/ou proteínas associadas. Saiba mais:

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Há muitos anos, observou-se em uma família de surdos e mudos, alterações eletrocardiográficas de prolongamento do intervalo QT, com três crianças apresentando morte súbita aos 4, 5 e 9 anos de idade. Um anos após, outra criança de 8 anos faleceu subitamente após ter sido diagnosticada com surdez congênita e um eletrocardiograma (ECG) com intervalo QT prolongado e grandes ondas T. Tempo depois, foram constatados as mesmas alterações em ECG de um dos pais e em outras várias crianças com audição normal, e com síncope recorrente, assim denominado de “síndrome do QT longo” desde 1975 .

No ECG, o intervalo QT representa a repolarização dos potenciais de ação ventricular que é controlado por diversos canais iônicos – canais de sódio, cálcio e potássio – cujas alterações, tanto na perda de função (queda da corrente de potássio) ou ganho da função (aumento das correntes de sódio e cálcio), causados por mutações genéticas, atrasam o potencial de ação, que se manifesta com o prolongamento do intervalo QT no ECG de 12 derivações.

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A síndrome do QT longo pode ser congênita ou adquirida, sendo que as congênitas estão relacionadas a mutações nos canais iônicos e/ou proteínas associadas, e a adquirida é geralmente associada a medicamentos e alterações eletrolíticas (hipocalemia, hipocalcemia e hipomagnesemia).

O sexo é um fator importante, e as diferenças entre o intervalo QT entre homens e mulheres já aparecem durante a puberdade, sendo que os homens apresentam um intervalo QT menor, porém, o diagnóstico da síndrome é mais frequente nas mulheres. Os jovens do sexo masculino tem maior probabilidade de apresentar um evento ao redor dos 15 anos, com a redução diminuição dessa expectativa após a puberdade.

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O que é Síndrome do QT longo?

É uma arritmia hereditária caracterizada por um prolongamento do intervalo QT corrigido (QTc) no ECG de 12 derivações, sendo que são considerados valores aumentados de QTc > 470ms para homens e >480ms para mulheres.

O sintoma mais comum geralmente é a síncope, porém, a parada cardíaca revertida ou morte súbita podem ocorrer em 1% a 3% dos adultos. Em relação aos pacientes sintomáticos, 50% apresentam sua primeira manifestação cardíaca por volta dos 12 anos de idade e 90% dos casos aos 40 anos, sendo uma importante causa de morte súbita infantil.

Tipos de Síndrome do QT longo

Existem 3 tipos mais frequentes da Síndrome do QT longo, que são o tipo 1 (LQT1), o tipo 2 (LQT2) e o tipo 3 (LQT3). Essa subdivisão é baseada no substrato genético, com os principais genes alterados os dos canais de potássio KCNQ1 e KCNH2 e o gene do canal de sódio SCN5A.

O tipo 1 geralmente manifesta seus eventos na atividade física, sendo a principal, a natação. O tipo 2 ocorre pelo estresse emocional e estímulos auditivos, como o som do despertador ou o tocar de telefone, e recentemente foi estudada uma relação com o histórico de epilepsia. O tipo 3 é mais perceptível durante o repouso ou durante a noite.

Existe um escore desenvolvido por Peter Schwartz, figura 2, onde, na ausência de uma causa secundária para prolongamento do QT e na presença de escore de Schwartz>3, é feito o diagnóstico da síndrome. Já nos casos em que a pontuação do escore fica entra 1 e 3, o acompanhamento e exames seriados devem ser realizados para identificar as formas subclínicas.

Os tipos principais da Síndrome do QT longo possuem alteração na morfologia da onda T, ajudando a diferenciar os tipos; Tipo 1: onda T mais alargada (Figura 3); Tipo 2: onda T bifásica (Figura 4); Tipo 3: onda T mais fina, alta e mais tardia (Figura 5).

As manifestações clínicas podem variar desde pacientes assintomáticos diagnosticados através de triagem familiar, até a ocorrência de síncopes, convulsões, arritmias ventriculares malignas, fibrilação ventricular e, tipicamente, torsades de pointes. Figura 6.
A síndrome do QT longo possui alta letalidade em pacientes sintomáticos, e devido a isso, todos pacientes sintomáticos devem ser tratados. De um modo geral, quanto maior o intervalo QT, maior o risco de arritmias malignas, com evidências de QTc excedendo 500 a 550ms com maiores riscos arritmias malignas.

Tratamento

A primeira escolha para o tratamento é o uso de betabloqueadores. Essas medicações diminuem os eventos arrítmicos, sendo que os pacientes com síndrome do QT longo tipo 1 são os mais beneficiados devido a ação adrenérgica em sua patogênese, com o propranolol e nadolol as medicações que se mostraram mais efetivas.

Como tratamento adjunto, deve-se utilizar potássio oral, principalmente no portador da síndrome do QT longo tipo 2, devido a maior sensibilidade cardíaca nessa alteração genética, principalmente quando nível do potássio se encontra baixo. Na maioria das vezes os eventos arrítmicos são bem controlados com uso de betabloqueadores, entretanto, um histórico de parada cardíaca revertida e sintomas como síncope frequentes, a despeito de tratamento medicamentoso otimizado, constituem maior risco, e possuem necessidade do implante do cardiodesfibrilador.

Conclusão

A primeira manifestação da doença pode ser a morte súbita, e algumas alterações eletrocardiográficas, anamnese e exame físico podem levantar suspeita do diagnóstico, com início das medidas de prevenção imediatamente, com o uso de betabloqueador e considerar implante de cardiodesfibrilador naqueles com indicação.

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Referências:

  1. Fragata CS, Moreira DAR, Andalaft RB, Habib RG, Mizzaci CC, Serafim KR, et al. Síndrome do QT longo congênito: o que sabemos até o momento?. Relampa. 2016;29(1):16-23
  2. Fernández-Falgueras A, Sarquella-Brugada G, Brugada J, Brugada R, Campuzano O. Cardiac Channelopathies and Sudden Death: Recent Clinical and Genetic Advances. 2017 Jan 29;6(1). pii: E7. doi: 10.3390/biology6010007

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