Como o tocilizumabe tem agido no tratamento de Covid-19 severa?

O tocilizumabe, um medicamento usado no tratamento da artrite reumatoide, passou por testes no tratamento da Covid-19 durante um estudo realizado na Itália.

Desde dezembro de 2019 a humanidade está enfrentando a epidemia causada pelo Covid-19, uma doença ainda bastante desconhecida que apresenta uma heterogeneidade ampla em relação a sinais e sintomas e evolução, indo desde sintomas leves de um resfriado comum até casos de insuficiência respiratória severa podendo evoluir para o óbito.

Essa doença é caracterizada por duas fases, a primeira de replicação viral e a segunda com quadro hiper inflamatório com acometimento pulmonar severo e posterior acometimento sistêmico, onde os pacientes mais críticos podem desenvolver uma síndrome de tempestade de citocinas que pode ser fatal.

Nenhuma terapia ainda foi oficialmente determinada pelos órgãos responsáveis, para o tratamento da pneumonia pelo Covid 19, porém a prática clínica vem demonstrando casos de sucesso com a combinação de determinados agentes terapêuticos.

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O tocilizumabe é um medicamento usado no tratamento da artrite reumatoide e tem como ação a modificação do curso da doença biológica (MMCDs biológicos), também conhecido como agente biológico, por modificar a resposta biológica do organismo a doença, atuando diretamente no receptor da interleucina 6 (Il-6).Também é utilizado no tratamento de artrite juvenil idiopática, arterite de células gigantes e síndrome de tempestade de citoquinas.

Estudo busca resposta para tratamento da Covid-19 com tocilizumabe

Tratamento da Covid-19 com tocilizumabe

Esse estudo visa identificar os benefícios do uso dessa substâncias, em pacientes infectados pelo Covid 19 com pneumonia em fase crítica, que receberam medicação de rotina para o tratamento, principalmente em relação a evolução para a ventilação mecânica e óbito.

Método

Foi selecionado um grupo de 544 pacientes com diagnóstico de Covid-19 confirmado por PCR ou swab nasofaríngeo, nos centros de Bologna e Modena no período de fevereiro a março de 2020.Os pacientes selecionados tinham pneumonia severa caracterizada por frequência respiratória acima de 30 irpm, saturação de oxigênio menor que 93% em ar ambiente, uma PaO2/FiO2 menor que 300 mmHg em ar ambiente e infiltrados pulmonares acometendo mais de 50% dos pulmões. Pacientes usuários crônicos de glicocorticoides, com história de alergia severa a anticorpos monoclonais, neutropênicos e plaquetopênicos foram excluídos do estudo.

Assim como pacientes que apresentavam qualquer condição clínica que possibilitasse uma perfuração intestinal. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética Regional e todos os pacientes assinaram termo de consentimento para a realização do mesmo.

Tratamento administrado para Covid-19

Todos os pacientes receberam tratamento convencional durante a internação com azitromicina, hidroxicloroquina, antirretrovirais e heparina dependendo dos sintomas e curso da doença. O estudo realizado foi não randomizado e o grupo escolhido para a administração de tocilizumabe apresentou saturação abaixo de 93% em ar ambiente e PaO2/FiO2 menor que 300 mmHg em ar ambiente, ou diminuição de mais de 30% dos parâmetros de PaO2/FiO2 durante as primeiras 24 horas de internação.

A tocilizumabe foi administrada por via endovenosa na dose de 8 mg/Kg de peso (máximo de 800 mg) em duas doses únicas no intervalo de 12 horas. Nos pacientes que por alguma razão não puderam receber a forma venosa, foi administrado a medicação por via subcutânea na dose de 162 mg em cada coxa (total de 384 mg). A dose subcutânea foi realizada no intuito de mimetizar ao máximo a farmacocinética da dose intravenosa, uma vez que a via subcutânea apresenta diferenças de absorção e distribuição. Todos os dados clínicos, como evolução dos sintomas e dados clínicos e laboratoriais foram rotineiramente avaliados e anotados.

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Resultados do estudo sobre o uso de Tocilizumabe

Seguindo diversos parâmetros de avaliação segmentar de estudos clínicos, avaliando diversas variáveis e índices, o estudo em questão apresentou o seguinte resultado: Dos 544 pacientes arrolados no estudo, 359 eram masculinos com idade média de 67 anos. Todos os pacientes evoluíram para piora clínica com falência respiratória e necessidade de oxigênio suplementar, sendo os pacientes de Modena mais comprometidos que os pacientes de Bolonha; 365 (67%) pacientes receberam somente tratamento de rotina convencional e 179 (33%) tratamento com tocilizumabe em adição ao tratametno convencional.

No grupo que recebeu tratamento convencional, a maioria era idoso porém sem tantas comorbidades quanto o outro grupo, onde estava incluído os pacientes com maior severidade (pacientes com hipertensão e diabetes).30% dos pacientes tratados com tocilizumabe receberam corticoterapia contra 17% do grupo “controle”. Em relação a evolução para ventilação mecânica e óbito, o estudo apresentou os seguintes índices:

 

EVENTOS TOCILIZUMABE (179)

  SC   EV
 TOTAL CONVENCIONAL (365) TOTAL  (544)
VM 17(19%) 16(18%)      33(18%)      57(16%)      90(17%)
ÓBITO APÓS VM 2(12%)  3(19%)       5(15%)      14(25%)      19(21%)
ÓBITO   7(8%)   6(7%)       13(7%)      73(20%)      86(16%)
*VM-Ventilação mecânica;*SC-Via subcutânea;*EV-Via endovenosa

Conclusão

O estudo demonstrou que houve uma significante redução na necessidade de ventilação mecânica ou óbito em pacientes com pneumonia severa por Covid 19 que utilizaram tocilizumabe associada ao tratamento padrão tanto por via endovenosa como subcutânea. Alguns outros estudos similares como o francês Klopfenstein e CORIMUNO-ANA (Trial Evaluating Efficacy Of Anakinra In Patients With Covid-19 Infection ) também anteciparam um resultado semelhante com o uso de tocilizumabe associado ao tratamento padrão. Inicialmente evidenciou-se que o papel da tocilizumabe na tempestade de citocinas decorrente da pneumonia severa pelo Covid-19 tende a estabilizar os níveis de Il-6 uma vez que age competindo com seus receptores.

Além disso, observou-se que o efeito da tocilizumabe era duas vezes maior em pacientes com PaO2/FiO2 menor que 150 mmHg. Isso leva a crer um maior benefício da droga em pacientes com maior risco de complicações em relação a ventilação mecânica ou óbito.

Uma grande preocupação encontrada durante o estudo foi o aparecimento de efeitos colaterais como principalmente, o desenvolvimento de infecções secundárias oportunistas, uma vez que a tocilizumabe foi administrada em associação a altas doses de glicocorticoides no combate à Covid-19. Alguns pacientes apresentaram quadro de hepatite herpética tipo I.

Mensagem prática

Alguns pontos ainda devem ser melhor analisados em relação a tocilizumabe, uma droga que ainda está engatinhando a serviço do tratamento do Covid-19. Apesar desse estudo apresentar algumas limitações principalmente em relação aos dados demográficos e  por não ser um estudo randomizado, em uma época de pandemia de uma doença onde muitos pacientes evoluem para um quadro crítico de pneumonia com necessidade de ventilação mecânica e que acaba sobrecarregando o sistema de saúde e onde muitos centros  não possuem  uma estrutura de UTI suficiente para atender toda essa demanda, a introdução de uma medicação coadjuvante ao tratamento protocolar que tem a capacidade de diminuir significativamente as estatísticas de gravidade, é uma opção que deve ser estudada e avaliada mais profundamente.

Referências bibliográficas:

  • Guaraldi G et all.Tocilizumab in patients with severe Covid-19: a retrospective cohort study.The Lancet Rheumatology. 2020 June.
  • Onder G, Rezza G, Brusaferro S. Case-fatality rate and characteristics of patients dying in relation to Covid-19 in Italy. JAMA. 2020;
  • Pedersen SF, Ho Y-C. SARS-CoV-2: a storm is raging. J Clin Invest. 2020; 130: 2202–05

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