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A troponina é uma proteína presente no miócito que participa fisiologicamente na contratilidade cardíaca e é classificada em três tipos: C, T e I. Durante a contração miocárdica, há uma sequência de eventos: o cálcio se liga à unidade C da troponina → há mudança na configuração anatômica das proteínas → deslocamento do complexo tropomiosina-troponina → interação actina/miosina → contração (encurtamento) do miócito.
A troponina T é estrutural, ligando o complexo das três troponinas com a tropomiosina e a actina. A troponina I é auxiliar à troponina C na interação com o cálcio e a ATPase. Clinicamente, é tudo “troponina” (ou como o americano gosta de chamar: “cardiac-troponin”, cTn).
Uso clínico da troponina
Mas de onde veio o interesse pelo seu uso clínico? Durante muitos anos, a CK foi a principal enzima explorada no diagnóstico de IAM. A fração MB e a CK-massa são o grande exemplo de uso clínico. E a mioglobina tinha a fama de “rapidinha”: a primeira a se elevar mas a menos específica de lesão cardíaca.
Contudo, esses exames apresentam uma acurácia que, apesar de boa, está longe do ideal. A troponina surgiu então como um marcador de lesão miocárdica mais sensível – detecta mesmo lesões menores – e mais específico – é “quase exclusivo” de lesão miocárdica. O problema é que as técnicas laboratoriais de dosagem foram se aprimorando tanto que hoje somos capazes de detectar níveis ínfimos… e a confusão está armada. Isso porque, ao contrário dos ensinamentos iniciais, a elevação de troponina não é exclusiva da lesão miocárdica isquêmica, mas sim de qualquer lesão do miócito, incluindo doenças não isquêmicas / não ateroscleróticas. Por isso, os dois conceitos iniciais são:
- A troponina é altamente específica de lesão miocárdica. Você pode abandonar CK, mioglobina e cia.
- Mas a lesão miocárdica pode não ser isquêmica.
(Obs: há uma exceção: o reinfarto. Como a meia vida da troponina é de 7 dias, um paciente com dor recorrente pode permanecer com a troponina elevada e você não saberá se é um novo IAM ou apenas a tropo da injúria inicial. A solução nesses casos é usar a CK-MB ou a CK-Massa)
Tabela 1: conheça as causa não coronarianas/isquêmicas de elevação da troponina
Prinzmetal* | Contusão miocárdica | Maratona |
Takotsubo* | Sepse | Grande queimado |
Insuficiência cardíaca | DRC em diálise | Miocardite* |
Embolia pulmonar | AVC | Anticorpos heterófilos (“erro laboratorial”)* |
Drogas cardiotóxicas | Grandes cirurgias | Desfibrilação e cardioversão |
*Podem causar grande elevação na troponina similar a um IAM.
Valores de troponina
Há diversas técnicas laboratoriais para dosagem, mas o “princípio universal” são anticorpos marcados que detectam a troponina T ou I no soro. Clinicamente, não há diferença relevante entre os métodos ou o tipo de troponina dosada, mas o valor de referência e, principalmente, o limiar de detecção variam. Portanto, fique atento aos valores recomendados no laboratório que realizou o exame.
E o que é a badalada “Troponina Ultra-Sensível” (TropoUS)? Nada mais é do que uma nova técnica que detecta quantidades ainda menores de troponina no plasma. Por isso, é capaz de mostrar lesão miocárdica mais precocemente, em menos de três horas!!!
Como o mundo não é perfeito e nosso cobertor é curto, aumentar a sensibilidade – isto é, detectar mesmo pequenas lesões de modo muito precoce – afeta a especificidade – e aumentam os casos de causas não coronarianas. A idade e o sexo parece ser dois dos principais fatores na TropoUS e está sendo estudada a necessidade de pontos de corte diferentes conforme faixa etária e sexo, sendo o limite de “normalidade” maior (limiar/cutoff mais alto) para idosos e homens.
Uma dúvida frequente é se há correlação entre a troponina e o tamanho do IAM. Primeiramente, estudos epidemiológicos mostram correlação positiva (mas não linear!) com pior prognóstico. Isto é, quanto mais elevada a troponina, maior a chance de eventos adversos cardiovasculares. Mas e o tamanho do IAM? Essa é uma área de estudos. O melhor é avaliar a área sob a curva (AUC): áreas maiores em 72-96h (e não no primeiro dia!) estão melhor correlacionadas com o tamanho do IAM.
LEIA MAIS: Como interpretar níveis de troponina em paciente com disfunção renal?
Cenários práticos para uso
1) Paciente com dor precordial que melhora com tratamento inicial e o ECG é normal. Uma TropoUS em 1 a 3 horas negativa consegue descartar um evento de alto risco e o paciente pode continuar o tratamento ambulatorialmente. Repare: não se exclui doença coronariana, mas sim um alto risco de morte, permitindo manter o tratamento oral e os exames “eletivos”.
2) Troponina positiva em um contexto fora da síndrome coronariana aguda – exemplos: sepse, pós-operatório, IC. É necessário curvar a troponina a cada 6-8h durante 24h. Uma lesão isquêmica apresentará elevação-pico-redução, ao passo que nas demais causas o valor flutua mais ou menos igual. Essa curva no sentido literal da palavra é uma das ferramentas práticas mais importantes! Mas há um problema: quantificar o grau de variação na troponina que nas dosagens seriadas está relacionada com etiologia coronariana. Não há um consenso, mas a melhor evidência atual sugere que variações vale-pico acima de 20% são indicativas de IAM/DAC.
Exemplo prático:
Cenário | Tropo 6h | 12h | 18h | 24h |
A | 0,10 | 0,11 | 0,09 | 0,10 |
B | 0,10 | 0,15 | 0,17 | 0,11 |
– No cenário A, não há curva e as variações são inferiores a 20%. Logo, devemos pensar em causas não coronarianas.
– No cenário B, há uma curva ascensão → pico → descenso. Com isso, a causa mais provável é de fato um IAM.
Autor(a):
Excelente informação!!! Parabéns muito útil abraço
Olá! Sou Ana Carolina, médica e colunista da PEBMED. Que bom que nosso texto foi útil para você, Pablo! Agradecemos pelo retorno e lhe convidamos a continuar acompanhando nosso portal para receber as principais atualizações do meio médico!
Obrigado Dr. Ronaldo Gismondi
Excelente explicação!
Muito proveitoso estas informações.
Excelente texto. Parabéns!!
Excelente esse texto ! De imortãncia ímpar e escrito numa didática melhor que as diretrizes. Parabéns!
Pode me dar uma informação? Trabalho num hospital de médio porte em Minas Gerais. É referência em cardiologia , tem Hemodinamica 24h ,etc. Mas pelo fato de ser na maior parte custeado pelo SUS, há resistencia financeira enorme da direção em pagar a Troponina. Entretanto, nós cardiologistas sabemos a importancia da troponina , e como os novos scores que estão chegando ( como o Heart Score) trazem ela como o pilar da estratificação de risco para os pacientes com Dor torácica.
Vocês podem me dar alguma informação sobre levantamentos financeiros? ….. Que possam embasar aos hospitais ( SOBRETUDO PÚBLICOS) a adoção da troponina, mostrando que uma melhor estratificação de risco significa maior segurança: tanto em liberar os pacientes de baixo risco , como em internar aqueles com alto risco para “MACE” ! Na teoria sabemos que uma adequada estratificação vai gerar menos internações / exames / cateterismos /menor permanência no pronto-socorro etc. E no pólo aposto, aqueles pacientes de alto risco não vão correr o risco de entrarem nas estatísticas de “”IAMs” perdidos. Então….. como justificar a adoção da Troponina ( que justificam como sendo bem mais cara) em hospitais que o SUS é o principal provedor.
só elogios mesmo, excelente artigo!
simplesmente, obrigado…
Muito bom! Estou sempre tentando aprender essas coisas,
mas preciso melhorar o entendimento ainda. Facilitar passar
nos testes
sou gineco e agora estou estudando sobre esses assuntos pois infarto na minha espacialidade é muito raro acho que deveria ser mais difundido