Uma epidemia antrozoológica: a disseminação descontrolada de SARS-CoV-2 entre cervos

A pandemia de Covid-19 em seres humanos, associada ao coronavírus SARS-CoV-2, tem sido responsável por mais de 5 milhões de mortes em todo o mundo desde novembro de 2019, e segue desafiando a ciência. A origem zoonótica do vírus não está ainda esclarecida, especialmente devido ao desconhecimento, até o momento, das espécies de hospedeiros e potenciais reservatórios virais.

A pandemia de Covid-19 em seres humanos, associada ao coronavírus SARS-CoV-2, tem sido responsável por mais de 5 milhões de mortes em todo o mundo desde novembro de 2019, e segue desafiando a ciência. A origem zoonótica do vírus não está ainda esclarecida, especialmente devido ao desconhecimento, até o momento, das espécies de hospedeiros e potenciais reservatórios virais.

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Uma epidemia antrozoológica a disseminação descontrolada de SARS-CoV-2 entre cervos

SARS-CoV-2 entre cervos

A infecção natural por SARS-CoV-2, a partir do contato com seres humanos infectados, em outros animais já foram descritos em domésticos, como gatos, cães e furões, e em selvagens sob cuidados humanos, como tigres, lontras, visões e gorilas. O rastreio para a detecção de receptores para a enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2) em diferentes espécies têm sugerido que cetáceos, roedores, morcegos, primatas e várias espécies de cervos estão sob alto risco de infecção por esse vírus.

As infecções experimentais em laboratórios também verificaram outras categorias de animais suscetíveis à infecção por SARS-CoV-2 e a possibilidade de transmissão interespécies e intraespécies, assim como a transmissão vertical. Em julho de 2021, por exemplo, anticorpos anti-SARS-CoV-2 já tinham sido descritos entre 152 cervos de vida livre (soroprevalência de 40%) nas regiões de Michigan, Pennsylvania, Illinois e Nova Iorque nos Estados Unidos da América (EUA).

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Em fevereiro de 2022, Hale e colaboradores publicaram um artigo no jornal científico Nature com os detalhes que descrevem uma pandemia antrozoológica de SARS-CoV-2 em 129 (de um total de 360, 35,8%) cervos da espécie Odocoileus virginianus distribuídos em 9 localidades no nordeste de Ohio, no período de janeiro a março de 2021. O diagnóstico foi obtido a partir de secreção nasal por swab e detecção pelo método de reação de polimerização em cadeia em tempo real com transcrição reversa (real-time RT-PCR). Foi realizado também o estudo de sequenciamento genômico de 14 amostras de SARS-CoV-2 e verificou-se também o isolamento de vírus viáveis infectantes. Foram detectadas três linhagens de SARS-CoV-2 distribuídas entre cervos em 6 localidades no nordeste de Ohio: B.1.2, B.1.582 e B.1.596.

Os vírus da linhagem B.1.2., dominantes em seres humanos residentes na região naquele período, foram encontrados em cervos de 4 regiões estudadas. Verificou-se também provável e subsequente transmissão horizontal das partículas virais interespécie com evolução para a observação de mutações do tipo substituição em proteínas da espícula e na região ORF1 que eram incomuns entre as variantes isoladas de seres humanos até aquele momento.

Conclusão

Tais achados reforçam a  hipótese de ocorrência de epidemias concomitantes entre diferentes hospedeiros, as que favorecem novas vias evolutivas que podem contribuir para o surgimento de outras variantes e tipos virais. Entre cervos, observou-se que tais animais apresentam alta incidência de infecções e sugere a alta capacidade adaptativa de SARS-CoV-2 para a infecção em diversos hospedeiros. Adicionalmente, a descrição de detecção de partículas virais viáveis de SARS-CoV-2 em fezes de humanos e no esgoto, sugere que a exposição ambiental também pode favorecer a adaptabilidade evolutiva do coronavírus em diferentes tipos de hospedeiros na natureza.

Considerando que há aproximadamente 30 milhões de cervos distribuídos em ambientes rurais, urbanos e suburbanos nos EUA, essas observações reforçam a necessidade de estabelecimento de programas de monitoramento e vigilância dos vírus circulantes entre cervos, outros hospedeiros selvagens e no ambiente nos diversos continentes.

Referências bibliográficas:

  • Hale VL, Dennis PM, McBride DS, Nolting JM, Madden C, Huey D, Ehrlich M, Grieser J, Winston J, Lombardi D, Gibson S, Saif L, Killian ML, Lantz K, Tell RM, Torchetti M, Robbe-Austerman S, Nelson MI, Faith SA, Bowman AS. SARS-CoV-2 infection in free-ranging white-tailed deer. Nature. 2022 Feb;602(7897):481-486. DOI: 10.1038/s41586-021-04353-x

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