Uso de corticoide na doença de Kawasaki

A doença de Kawasaki é uma vasculite autolimitada de vasos de médio calibre que afeta predominantemente crianças menores de 5 anos. Saiba mais:

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A doença de Kawasaki (DK) é a principal causa de doença coronariana adquirida na faixa etária pediátrica. É uma vasculite autolimitada de vasos de médio calibre que afeta predominantemente crianças menores de cinco anos. A doença é mais comum no sexo masculino (1 : 1,36 a 1: 1,62) e a região geográfica com maior incidência anual da doença é o Japão (239,6 : 100.000 crianças/ano em 2010). Sua etiologia é desconhecida, mas gatilhos infecciosos parecem estar intimamente relacionados com o desencadeamento da doença.

Os critérios diagnósticos da DK são: febre acima de cinco dias associada a (1) conjuntivite bilateral (80 – 90%), (2) alterações orofaríngeas (80 – 90%), (3) alterações de extremidades (80%), (4) rash polimórfico não vesicular (>90%), (5) linfadenomegalia cervical com pelo menos um linfonodo maior que 1,5 cm (50%). O diagnóstico é feito quando estão presentes: febre acima de cinco dias mais quatro dos cinco critérios, desde que essas manifestações não possam ser explicadas por outra doença.

A complicação mais típica e significativa da DK é o aneurisma coronariano. Como tentativa de evitar essa sequela grave, o tratamento da doença deve ser prontamente instituído, logo o diagnóstico seja realizado. Idealmente recomenda-se que o tratamento seja administrado nos primeiros 10 dias de doença, mas essa conduta não é absoluta e cada caso deve ser avaliado individualmente (ex.: paciente com 15 dias de febre, ainda com provas inflamatórias muito elevadas, com aneurisma coronariano ao eco-doppler cardíaco – independente de passados mais de 10 dias da abertura do quadro, esse paciente merece ser tratado).

Classicamente, o tratamento da DK é realizado com imunoglobulina humana hiperimune (IVIG) 2 g/kg (até 80 g). Caso não haja melhora (ou se houver retorno) da febre ou dos outros sintomas, repete-se a IVIG. Não havendo melhora após segunda IVIG, opta-se por realização de glicocorticoides.

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Vários estudos (incluindo estudos prospectivos multicêntricos e randomizados) mostraram que o uso precoce de corticoide em associação à IVIG é superior ao uso da IVIG isolada nos casos em que há presença sinais preditores de falha à IVIG. A associação da IVIG ao corticoide (oral – 2 mg/kg/dia – ou em pulsoterapia – 30 mg/kg/dia por três dias) teve como benefícios a redução do tempo de febre, diminuição mais rápida das provas de fase aguda, menor tempo de hospitalização e menor incidência de aneurismas coronarianos. Dentre esses estudos, o mais importante e definitivo foi o RAISE, conduzido por Kobayashi e colaboradores em 2012.

Kobayashi et al identificaram alguns fatores como preditores de resistência à imunoglobulina, auxiliando na decisão terapêutica inicial. Os fatores preditores de baixa resposta à monoterapia com IVIG são: hiponatremia, aumento de transaminases, PCR elevada, leucocitose importante com desvio, contagem de plaquetas menor ou igual a 300.000, pouco tempo entre o início da febre e o diagnóstico (quatro dias ou menos) e idade inferior a 12 meses.

Fukushini e colaboradores identificaram, também como preditores de falha terapêutica ao uso da IVIG isolada, hiperbilirrubinemia e aumento da desidrogenase láctica. Demonstrando a importância do controle da inflamação sistêmica para prevenção de coronariopatia, Mori et al relataram que leucocitose importante e aumento do PCR após o uso da IVIG são preditores independentes de dilatação coronariana.

É importante lembrar que após a administração da IVIG, o VHS não pode ser usado como parâmetro para acompanhar a inflamação sistêmica (estará aumentado por causa da medicação). Como a maioria dos estudos em DK são conduzidos no Japão, não podemos afirmar com certeza a validade dessas informações para populações de outras etnias.

Para a prática clínica, tanto o tratamento clássico quanto o tratamento combinado ao corticoide estão respaldados pela literatura. Entretanto, como a casuística japonesa em DK é a maior do mundo, é prudente e fundamental que consideremos os fatores de risco na decisão terapêutica. O controle precoce da doença e da inflamação sistêmica é crucial para a redução da incidência dos aneurismas coronarianos nessas crianças, reduzindo o risco de eventos trombóticos arteriais coronarianos em um futuro próximo.

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Referências:

  • Son MB, Sundel RP. Kawasaki Disease. In: Petty RE, Laxer RM, Lindsley CB, Wedderburn LR. Textbook of Pediatric Rheumatology. 7a Ed. Philadelphia. Elselvier, 2016. 467 – 482.
  • Kobayashi T, Inoue Y, Takeuchi K et al. Prediction of intravenous immunoglobulin unresponsiveness in patients with Kawasaki disease. Circulation. 113 (2006) 2060 – 2612.
  • Kobayashi T, Kobayashi T, Morikawa A et al. Efficacy of intravenous immunoglobulin combined with prednisolone following resistance to initial intravenous immunoglobulin treatment of acute Kawasaki disease. J Pediatr. 163 (2013) 521 – 526.
  • Mori M, Imagawa T, Yasui K et al. Predictors of coronary artery lesions after intravenous gamma-globulin treatment in Kawasaki disease. J. Pediatr. 137 (2000) 177 – 180.
  • Sundel RP, Baker AL, Fulton DR, Newburger JW. Corticosteroids in the initial treatment of Kawasaki disease: report of a randomized trial. J. Pediatr. 142 (2003) 611 – 616.

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