A vacina de RNA mensageiro BNT162b2 (Pfizer) demonstrou alta eficácia na prevenção da infecção por SARS-CoV-2, hospitalização e morte. Estudos em grandes populações demonstraram bom perfil de segurança, mas foi identificado algum risco aumentado para complicações sistêmicas como a infecção por varicela zoster, a linfadenopatia, a síndrome de Guillian Barre e a miocardite. Associações prévias entre vacinas e complicações oculares como uveítes foram sugeridas, incluindo a uveíte. A maioria dos relatos de casos são de apenas um ou poucos casos e incluem neuroretinopatia macular aguda, retinopatia serosa central, rejeição de transplante de córnea, paralisia de nervo craniano e uveítes.
A maioria dos casos de uveíte são relacionados a uveíte anterior (mas alguns incluem MEWDS, síndrome de Vogt-Koyanagi-Harada e panuveíte idiopática). Em todos esses casos a associação a vacina foi feita pela proximidade temporal, com os achados tendo sido um a trinta dias após a dose da vacina. Não ficou claro ainda quando a vacina é relacionada a um aumento da incidência de uveíte e quando a associação é por termos populações de mais alto risco.
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Estudo
Um estudo publicado em maio de 2022 na Ophthalmology examinou uma grande população que recebeu a vacina em questão e comparou as taxas de uveíte não infecciosa ativa. O estudo foi uma coorte retrospectiva e realizado em Israel. Os casos observados de uveíte não infecciosa ativa após a vacinação para covid-19 foram comparados com os casos de uveíte ativa esperados antes da vacinação para covid-19 com base nos dados de 2019 antes da pandemia e 2020 durante a fase da pandemia pré-vacina. Foram incluídos os pacientes que receberam pelo menos uma dose de vacina, com mais de 16 anos, que receberam a primeira dose entre dezembro de 2020 e abril de 2021. 2.602.557 pessoas com média de idade de 46.8 ± 19.6 anos receberam a primeira dose da vacina entre 20 de dezembro de 2020 e 30 de abril de 2021. Dessas 2.441.719 receberam a segunda dose entre 10 de janeiro de 2021 e 30 de abril de 2021. Um diagnóstico prévio de uveíte não infecciosa foi documentado em 18.236 (0.7%) dos que receberam a primeira dose e 17.250 pessoas (0.7%) dos que receberam a segunda dose.
Resultados
Após a vacinação, 188 pessoas tiveram uveíte ativa e dessas 100 pessoas durante os 21 dias após a primeira dose e 88 pessoas durante os 21 dias após a segunda dose, refletindo um risco de 3.85 e 3.61 por 100.000 vacinados. A média de tempo para o surgimento da uveíte foi de 8.5 dias após primeira dose e 10 dias pós-segunda dose com 68% e 67% dos eventos ocorrendo nos primeiros 14 dias. A taxa de incidência de uveíte ativa foi de 66.8 a cada 100.000 pessoas- ano na primeira dose e 62.7 por 100.000 pessoas-ano na segunda dose. A taxa nas populações referência (2019 e 2020) foi de 45.7 por 100.000 pessoas- ano e 45.1 por 100.000 pessoas- ano. Entre pessoas sem história de uveíte o risco de um quadro de uveíte foi de 1.63 e 1.98 eventos a cada 100.000 vacinados após primeira e segunda dose.
Comparando-se com a população referência de 2019 sem história de uveíte, o risco para um quadro de uveíte foi de 1.3 e 1.57. Os dados mostraram que uma pessoa com história de uveíte tem um risco maior de uveíte recorrente ativada pós-vacina. Em relação as características clínicas da uveíte não infecciosa pós-vacina, dos 188 casos, 166 foram unilaterais (88.3%). A uveíte anterior foi o achado principal em 171 olhos (90.96%). A média da acuidade visual foi de 0.3±0.44logMAR. A investigação clínica foi feita em 127 eventos (67.55%) com a uveíte idiopática sendo a etiologia mais comum (n=106, 56.38%), seguida por pacientes com uveíte associada a HLA-B27 (n=12, 6.38%) e doença de Behҫet (n=2, 1.06%).
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Conclusão
O estudo de forma alguma desencoraja a vacinação, mas os pacientes devem ser orientados sobre os sintomas da uveíte ativa, particularmente durante os primeiros 14 dias após vacina e devem procurar imediatamente o oftalmologista caso ocorram. É importante lembrar que a causalidade envolve mais do que a associação temporal. Por isso apesar de sugerir um aumento do risco de uveíte pós-vacina, o estudo em questão não consegue estabelecer uma relação de causa efeito.
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