Essa semana no Portal da PEBMED falamos sobre o vírus da Zika na infertilidade masculina. Por isso, em nossa publicação semanal de conteúdos compartilhados do Whitebook Clinical Decision, separamos os critérios sobre diagnóstico e apresentação clínica das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti.
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Definições: São doenças produzidas por um grupo de vírus denominados arbovírus, transmitidos pelos mosquitos do gênero Aedes. Abordamos aqui as viroses: Dengue, Zika e Chikungunya.
Fisiopatologia: Após entrada do vírus no hospedeiro através da picada do Aedes aegypti, ocorre viremia seguida de resposta inflamatória com produção de substâncias vasoativas e destruidoras de plaquetas; o aumento da permeabilidade vascular com extravasamento de líquidos do meio intravascular é importante mecanismo de instalação das formas graves e choque da dengue.
- As três doenças podem ser difíceis de serem diferenciadas apenas pelo quadro clínico e exame físico, devido às similaridades de manifestações clínicas.
Dengue:
- Pode cursar com 3 fases em sua apresentação:
- Fase febril: Febre alta de duração de 2-7 dias, de início abrupto, associada a cefaleia, adinamia, mialgias, artralgias e dor retrorbitária. Podem haver náuseas, vômitos e diarreia. Pode ocorrer exantema de caráter maculopapular, atingindo face, tronco e membros, que não preserva palmas das mãos ou plantas dos pés, em geral no final da febre, podendo haver ou não prurido associado.
- Fase crítica: Após a defervescência da febre, os pacientes entram na fase crítica, onde devem ser observados para surgimento de sinais de alarme da doença, que pode sugerir evolução para formas mais graves da doença.
- Fase de recuperação: Relacionada à complicações da hiper-hidratação durante o tratamento (edema generalizado), débito urinário normalizado ou aumentado, rash cutâneo com ou sem prurido; pode haver infecções clínicas associadas.
- Dengue clássica: Relato de febre entre dois e sete dias de duração, e duas ou mais das seguintes manifestações: náuseas, vômitos, exantema, mialgia, artralgia, cefaleia, dor retrorbitaria, petéquias, prova do laço positiva, leucopenia. Também pode ser considerado caso suspeito toda criança com quadro febril agudo, usualmente entre dois e sete dias de duração, e sem foco de infecção aparente.
- Dengue grave: Presença de choque circulatório (Síndrome do Choque da Dengue), hemorragias graves associadas ou não à hemoconcentração e/ou trombocitopenia (febre hemorrágica da dengue) e disfunção de órgãos (hepatites, miocardites, encefalites). Para avaliação da gravidade, vide tópico “Classificação e Gravidade”.
- Dengue em crianças pequenas: Em crianças abaixo de 2 anos, os sinais e sintomas podem se manifestar por choro intenso, adinamia, irritabilidade, sonolência e recusa alimentar. Um alto índice de suspeição deve ser mantido para o diagnóstico. Questionar sobre sintomas neurológicos, diurese e comorbidades existentes.
- Zika: Febre de baixa intensidade com rash maculopapular (pode persistir por 14 dias com duração média de 6 dias), artralgia (principalmente em pequenas articulações de mãos e pés), e conjuntivite não purulenta. Outras manifestações incluem: mialgia (dores articulares e dor lombar discreta), cefaleia, dor retrorbitária, astenia, náusea, vômitos, diarreia, prurido intenso. Existe uma relação conhecida de alguns casos que desenvolvem Síndrome de Guillain-Barré que deve ser pensado em todo paciente com fraqueza progressiva em dois ou mais membros, arreflexia e evolução no máximo em 4 semanas.
- Chikungunya: Febre alta com duração de 3-5 dias; poliartralgia envolvendo múltiplas articulações de alta intensidade, podendo ter edema associado, principalmente de mãos e pés; rash maculopapular; cefaleia; mialgia; e sintomas gastrointestinais.
- Ao exame físico: Sempre avaliar estado de consciência com escala de Glasgow, hidratação, estado hemodinâmico do paciente, sinais de doença respiratória, manifestações hemorrágicas espontâneas ou provocadas (prova do laço).
- Prova do laço: Manter esfigmomanômetro insuflado no ponto médio entre os valores de pressão arterial máxima e mínima por 5 minutos (no adulto) ou 3 minutos (na criança). A prova é positiva caso, após o determinado tempo, o número de petéquias for de 20 ou mais (em adultos) ou 10 ou mais (em crianças) em um quadrado imaginário de 2,5 cm de lado no antebraço do paciente. Prova do laço positiva caracteriza pacientes no grupo B de risco (dengue com manifestações hemorrágicas).
Pearls & Pitfalls:
Diferenciando Dengue X Zika X Chikungunya | |||
Característica | Dengue | Zika | Chikungunya |
Febre | +++++ | + | ++++ |
Exantema | ++ | ++++ | ++ |
Mialgia / Artralgia | +++ | ++ | ++++ |
Edema | Ausente | +++ | ++++ |
Dor retrorbital | +++++ | ++ | + |
Hemorragia | ++ | Ausente | Ausente |
Hepatomegalia | ++ | Ausente | +++ |
Leucopenia / Trombocitopenia | +++ | Ausente | +++ |
Importante: Considere este quadro de maneira auxiliar, porém privilegie as características epidemiológicas da região para o diagnóstico diferencial. |
Abordagem Diagnóstica
Exames laboratoriais de rotina para Dengue:
-
- Os exames laboratoriais dependerão da classificação da dengue:
- Tipo A: Nenhum exame indicado de rotina. Serão realizados a critério médico;
- Tipo B: Hemograma completo. Outros exames a critério médico;
- Tipos C e D (presença de sinais de alarme e/ou gravidade): Hemograma completo, albumina sérica e transaminases, radiografia de tórax (PA, perfil e incidência de Laurell), ultrassonografia de abdome. Solicitar glicemia, ureia, creatinina, eletrólitos, gasometria arterial e ecocardiograma conforme necessidade. Realizar hemograma para avaliação de hematócrito a cada 2 horas. Para confirmação diagnóstica, PCR ou NS1 (até 5 dias) ou sorologia (após 5 dias).
Confirmação etiológica do dengue: Em situações de epidemias, nem sempre será necessária a confirmação etiológica do caso. Para confirmação etiológica, usar detecção de antígenos virais (NS1, RT-PCR) nos primeiros cinco dias e sorologias a partir do sexto dia. Se a detecção de antígenos virais é positiva, o diagnóstico é confirmado; se é negativa, deve-se realizar sorologia IgM após o sexto dia para confirmação ou descarte.
Classificação e Gravidade
Dor abdominal intensa (referida ou à palpação) e contínua; vômitos persistentes; acúmulo de líquidos (ascite, derrame pleural, derrame pericárdico); hipotensão postural e/ou lipotimia; hepatomegalia maior que 2 cm abaixo do rebordo costal; sangramento de mucosa; letargia e/ou irritabilidade; aumento progressivo do hematócrito.Condições clínicas especiais e/ou risco social ou comorbidades: Lactentes ( < 2 anos), gestantes, adultos com idade> 65 anos, HAS, outras doenças cardiovasculares, diabetes mellitus, DPOC, doenças hematológicas crônicas (principalmente anemia falciforme), doença renal crônica, doença ácido péptica e doenças autoimunes.
Diagnóstico diferencial com outras síndromes febris agudas:
- Enteroviroses;
- Influenza;
- Hepatites virais;
- Malária;
- Febre tifoide;
- Rubéola;
- Sarampo;
- Escarlatina;
- Eritema infeccioso;
- Exantema súbito;
- Febre amarela;
- Leptospirose;
- Meningococcemia;
- Síndrome do choque tóxico.
- Crianças até 10 kg: 130 ml/kg/dia;
- Crianças de 10-20 kg: 100 ml/kg/dia;
- Crianças acima de 20 kg: 80 ml/kg/dia;
- Acima de 13 anos: 60 ml/kg/dia;
- Manter a hidratação até 24-48 horas do término da fase febril.
Dengue tipo B: Acompanhamento e observação no serviço de saúde até resultado de exame laboratorial; durante a espera, realizar hidratação oral conforme descrito para dengue tipo A.
Dengue tipo C: Realizar avaliação de sinais vitais, diurese e pressão arterial horária:
- Fase de expansão: Reposição volêmica com 20 ml/kg de soro fisiológico EV nas primeiras duas horas. Se não houver melhora do hematócrito e das condições hemodinâmicas após expansão, repetir expansão até 3 vezes;
- Fase de manutenção: Em casos de melhora clínica e laboratorial após expansão, fazer 25 mL/kg em 6 horas, seguido de 25 mL/kg em 8 horas, sendo 1/3 com soro fisiológico 0,9% e 2/3 com soro glicosado (hidratação em Y). Se não houver melhora, tratar como dengue D.
Se hematócrito em ascensão: Realizar expansores plasmáticos (Albumina 0,5-1 g/kg) ? solução de albumina a 5% (para cada 100 mL da solução, usar 25 mL de albumina a 20% e 75 mL de soro fisiológico 0,9%).
Em caso de hemorragias: Concentrado de hemácias (10-15 mL/kg).
Em caso de coagulopatias: Plasma fresco (10 ml/kg) e crioprecipitado (1 U para cada 10 kg).
Transfusão de plaquetas: Sangramento persistente não controlado, depois de corrigidos os fatores de coagulação e do choque, e com trombocitopenia e INR > 1,5. Fazer 1 U para cada 10 kg.
Hiper-hidratação: Se há queda de hematócrito e resolução do choque, com sinais de desconforto respiratório ou de insuficiência cardíaca, deve-se avaliar hiper-hidratação e reduzir a hidratação, usar diuréticos (Furosemida 0,5 mg/kg/dose EV 3 ou 4 vezes ao dia) e/ou inotrópicos (Dopamina 5-10 mcg/kg/min; Dobutamina 5-20 mcg/kg/min; Milrinona 0,5-0,8 mcg/kg/min).
Critérios de interrupção de tratamento com terapia hídrica parenteral: Quando houver término do extravasamento plasmático; normalização da pressão arterial, pulso, e da perfusão periférica; diminuição do hematócrito, na ausência de sangramento; diurese normalizada; resolução de sintomas abdominais.
Suporte ventilatório: Oferecer suporte ventilatório com O2 em todas as situações de choque, e avaliar via aérea invasiva nos quadros de insuficiência respiratória.
Monitorização hemodinâmica: Indicada em pacientes com critérios de choque.
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