As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no mundo e no Brasil e a doença aterosclerótica é o principal mecanismo fisiopatológico, responsável pelo AVC isquêmico e pela doença arterial coronariana. A dislipidemia desempenha um importante papel nesse cenário – é a partícula de LDL que infiltra a parede vascular, através do endotélio não funcionante, ativa a resposta inflamatória e inicia a cascata de formação das placas gordurosas.
As estatinas são drogas que reduzem o LDL por inibição da enzima HMG-CoA (3-hidroxi-3-metil-glutaril-coenzima A reductase), reduzindo a síntese hepática do colesterol. Até aqui, nenhuma novidade, vocês aprenderam isso tudo na fisiologia e farmacologia. Esse conceito “se reduzir o colesterol-LDL → impede-se a formação da aterosclerose” levou as indústrias a buscar estratégias de tratamento da dislipidemia para os paciente que, mesmo em dose máxima da estatina, mantinham um LDL alto. Em tempos remotos, o probucol e até a neomicina (acreditem!) já foram estudados, mas os resultados práticos foram ruins e, como tal, estes tratamentos foram abandonados.
Os quelantes de ácidos biliares (colestiramina, no Brasil) estão disponíveis para uso. São “amigos” dos cirurgiões, principalmente nas diarreias após colecistectomia ou colectomia e, na clínica médica/cardiologia, reduzem o LDL em 10-15% por inibição da absorção. O seu limitador são os efeitos colaterais intestinais: há náuseas, distensão e meteorismo e a maioria dos pacientes não tolera a dose necessária, principalmente de modo contínuo.
O ezetimibe foi a grande aposta da indústria. É uma droga que inibe a absorção do LDL colesterol e é capaz de reduzir os níveis séricos em até 20%. Foi inicialmente comercializado em associação com estatina ou como monoterapia, na dose de 10 mg, e apresenta poucos efeitos colaterais.
O problema é que seus resultados nos ensaios clínicos ficaram aquém do esperado. No estudo IMPROVE-IT, a associação de ezetimibe/sinvastatina foi comparada com placebo/sinvastatina e a mortalidade foi semelhante entre os grupos – até houve redução do LDL e das taxas de AVC e IAM combinadas, mas apenas eventos não fatais. Isso contrasta com a marcada redução nos eventos cardiovasculares observada nos estudos com estatinas.
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Na prática, muitos pacientes estavam recebendo ezetimibe/sinvastatina, ficavam felizes que seu LDL despencava, mas seu risco não foi reduzido como poderia! Seria melhor se estivessem com uma estatina mais potente em dose máxima. Por isso, hoje o ezetimibe tem papel complementar, apenas para redução do LDL quando a dose máxima tolerada de estatina já foi alcançada.
Todavia, o futuro do tratamento da dislipidemia pode estar mudando. Os inibidores do PCSK9 estão fazendo barulho no mercado e prometem grandes resultados. O seu mecanismo de ação é o bloqueio da enzima “Proprotein convertase subtilisin/kexin tipo 9”, o que promove maior expressão do receptor de LDL no hepatócito e redução maciça (até 60%) do LDL-colesterol.
Além disso, os estudos fase 1 e 2 mostraram ótima tolerabilidade, com baixa incidência de efeitos colaterais – o mais comum são reações “flu-like” leves. O seu calcanhar de Aquiles é a forma de administração, ainda por injeções subcutâneas a cada 15 ou 30 dias. Contudo, dois riscos potenciais estão em avaliação, e só conheceremos o real impacto após a entrada das drogas no mundo real: piora da função neurocognitiva (risco < 1%) e maior propensão à infecção e lesão hepática pelo vírus HCV.
Hoje há 2 drogas aprovadas nos EUA/Europa e que chegaram ao Brasil: Evolocumab e Alirocumab. Um trabalho recente mostrou que o evolocumab, em pacientes com doença aterosclerótica estabelecida, reduziu em 20% um desfecho combinado de morte por doença cardiovascular, IAM, AVC, hospitalização por angina instável e/ou revascularização miocárdica. Claro que novos estudos são necessários, mas um primeiro e importante passo já foi dado! Veja abaixo uma tabela com droga, nome comercial e posologia dos fármacos para reduzir LDL quando a dose máxima de estatina é alcançada.
Olá,
de fato o IMPROVE IT não alterou a mortalidade quando associado a estatina. No entanto, devemos lembrar que esses estudos que complementam o papel da estatina na reducão do LDL não vão apresentar os mesmos desfechos que os estudos iniciais com estatinas apresentaram. Seu texto está perfeito, mas não acho que dá para afirmar que uma estatina em dose alta é melhor do que a estatina dose intermediaria associada ao ezetimibe.
De fato, no contexto do uso das estatinas, há evidencia de quanto maior a redução do LDL, maior a redução de mortalidade. O IMPROVE IT mostrou redução de LDL em 16mg/dl, mas nao mostrou redução de mortalidade. Porém, acho que toda droga adjuvante na redução do colesterol nao irá apresentar resultados importantes na mortalidade, como os apresentados com as estatinas. O evolucumab, por exemplo, teve redução importante do colesterol LDL, mas também nao houve diminuição de mortalidade.
Parabéns pelo texto. Abraço
Olá Rafael! Sou Ronaldo, colunista do portal e autor do texto. Muito obrigado pelas palavras!! Nós procuramos sempre fazer o melhor material para manter vocês atualizados e com um texto prático e objetivo.
Em relação ao duelo “estatina dose máxima vs estatina/ezetimibe”, respeito e entendo sua posição, mas eu acredito muito na estatina, por seus resultados confiáveis em vários estudos e na minha prática tenho usado atorvastatina 80 mg ou rosuvastatina 40 mg e só então adiciono o ezetimibe.
Abraços, Ronaldo.