Associação entre síndrome inflamatória fetal e distúrbio psiquiátrico na infância

Estudo analisou dados de 4.851 crianças nascidas com placentas que atendem aos critérios para diagnóstico de síndrome inflamatória fetal.

Um estudo recentemente publicado no periódico Translational Psychiatry avaliou a ligação entre a síndrome inflamatória fetal (fetal inflammatory syndrome – FIRS), que consiste na inflamação da placenta no período periparto, e distúrbios neuropsiquiátricos durante a infância. A FIRS consiste em funisite ou vasculite coriônica. A funisite é um processo inflamatório que envolve o cordão umbilical, incluindo a veia umbilical, a artéria e a geleia de Wharton. Já a vasculite coriônica envolve os vasos fetais da placa coriônica ou do cordão umbilical.

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Associação entre síndrome inflamatória fetal e distúrbio psiquiátrico na infância

Metodologia

Gibson e colaboradores conduziram um estudo de coorte retrospectivo usando dados de prontuários eletrônicos em um hospital feminino da University of Pittsburgh Medical Center, em Pittsburgh, Pensilvânia, Estados Unidos. Os dados foram coletados durante um período de 19 anos (01 de janeiro de 1999 a 01 de abril de 2018). O estudo inclui dois grupos:

  • Grupo FIRS: 4.851 crianças nascidas com placentas que atendem aos critérios para diagnóstico de FIRS (placenta com funisite e/ou vasculite coriônica); e
  • Grupo controle: 31.927 crianças nascidas com placentas normais durante o mesmo período (ou sem relato da placenta).

As crianças deveriam estar em período de estudo por, pelo menos, 5 anos. O desfecho primário do estudo foi a incidência de distúrbios neuropsiquiátricos durante a infância. Já os desfechos secundários foram as prescrições de medicamentos psiquiátricos e internações/tratamentos psiquiátricos nesses pacientes.

Resultados

Nas análises univariadas, os pesquisadores descreveram que crianças nascidas com FIRS eram mais propensas a serem diagnosticadas com quaisquer distúrbios neuropsiquiátricos (odds ratio [OR] = 1,21, intervalo de confiança de 95% [IC 95%] = 1,09-1,35). Especificamente, essas crianças foram mais propensas a serem diagnosticadas com:

  • Transtorno do espectro do autismo (TEA) (OR = 1,35; IC 95% 1,08-1,67);
  • Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) (OR = 1,27; IC 95% 1,07-1,49);
  • Transtorno de conduta (OR = 1,50; IC 95% 1,24-1,81);
  • Transtorno do estresse pós-traumático (TEPT) (OR = 2,46; IC 95% 1,21-5,04).

Com relação aos desfechos secundários, associações univariadas semelhantes foram encontradas para quaisquer medicamentos psiquiátricos, medicamentos para TDAH em geral (apenas estimulantes, inibidores da recaptação de noradrenalina e antagonistas dos receptores alfa-2) e narcóticos para TDAH especificamente. No entanto, os pesquisadores não encontraram nenhuma diferença significativa entre as crianças nascidas com FIRS e aquelas sem o uso de medicamentos ansiolíticos, antipsicóticos, antidepressivos e estabilizadores de humor.

Os pesquisadores analisaram também os possíveis fatores de confusão: história materna de transtornos psiquiátricos, uso materno de substâncias durante a gravidez, história materna de comportamento suicida e prescrições de medicamentos anti-inflamatórios. Não houve diferença na história materna de transtornos psiquiátricos, história materna de comportamento suicida ou prescrição de anti-inflamatórios entre crianças nascidas com FIRS em comparação com o controle. Todavia a exposição in utero a qualquer substância, e especificamente álcool, maconha e nicotina, foi significativamente aumentada para crianças nascidas com FIRS. Por fim, o diagnóstico neonatal de transtorno por uso de substâncias também aumentou significativamente naqueles com FIRS em comparação com aqueles sem.

Conclusões

O estudo mostrou um risco aumentado de distúrbios neuropsiquiátricos em crianças nascidas com FIRS em comparação ao grupo controle. De acordo com os pesquisadores, mais especificamente, houve aumento da incidência de TEA, TDAH, transtorno de conduta, TEPT e qualquer transtorno psiquiátrico nessas crianças, o que foi significativo mesmo após o ajuste para história materna de transtornos psiquiátricos, uso materno de substâncias durante a gravidez e história materna de suicídio ao longo da vida tentativas. Embora os diagnósticos maternos de álcool, anfetaminas, transtorno por uso de cannabis e transtorno por uso de substâncias neonatais tenham aumentado significativamente em crianças nascidas com FIRS em comparação com aquelas sem, as crianças nascidas com FIRS continuaram a apresentar risco aumentado de transtornos psiquiátricos mesmo após o ajuste para esses fatores de confusão potenciais. Portanto, os resultados desse estudo sugerem que a inflamação da placenta tem um papel crítico na patogênese dos distúrbios neuropsiquiátricos durante a infância, independentemente de muitos fatores de confusão em potencial.

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Comentários

Estudo de extrema relevância, com uma excelente amostragem, abrangendo um período longo de observação. Seus resultados nos indicam que as crianças nascidas com FIRS tiveram mais chances de serem diagnosticadas com qualquer transtorno psiquiátrico em comparação com crianças sem FIRS durante todo o período de acompanhamento (citado pelos autores como uma média de 7,5 anos). Além de destacar a importância de abordagens de prevenção da FIRS, reforça que as crianças nascidas com placenta que atendem aos critérios de inflamação da placenta devem ser monitoradas para identificação e tratamento precoces, de modo a otimizar os desfechos neuropsiquiátricos desses pacientes.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Gibson B, et al. Fetal inflammatory response and risk for psychiatric disorders. Transl Psychiatry. 2023;13(1):224. DOI: 10.1038/s41398-023-02505-3