A tomografia computadorizada (TC) representou um importante avanço em termos diagnósticos para pacientes em UTI. No entanto, o transporte para o setor de Radiologia às vezes possui um risco inaceitável, em função de instabilidade hemodinâmica ou respiratória. A tomografia por impedância elétrica (TIE) foi desenvolvida para monitorização da ventilação alveolar, e mais recentemente da perfusão pulmonar, em tempo real, à beira do leito, sem utilização de radiação. Nesse texto discutiremos como funciona o método, além das utilizações clássicas e emergentes do método.
Como funciona a tomografia de impedância elétrica?
A TIE utiliza uma cinta, contendo 8 a 32 eletrodos, que é colocada ao redor do tórax do paciente. Quando um par de eletrodos é ativado, um deles emite uma corrente elétrica que percorre o tórax, em direção ao outro eletrodo. A corrente elétrica alternada emitida possui alta frequência (50–80 kHz) e baixa intensidade (5–10 mA). Enquanto um par de eletrodos emite e recebe a corrente, os demais instalados em torno do tórax realizam a leitura das voltagens percebidas. Os pares de eletrodos se revezam na tarefa de emissão e leitura das voltagens (figura 1).
Quanto maior a aeração pulmonar, maior será a dificuldade para a passagem da corrente elétrica através do tórax (maior impedância elétrica). Por exemplo, durante uma respiração superficial, a impedância do tecido pulmonar muda apenas em 5% (entre a inspiração e a expiração). Durante uma respiração profunda a variação na impedância chega a 300% (do volume residual até a capacidade pulmonar total).
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Em situações de preenchimento do parênquima pulmonar (ex: infiltrado inflamatório na SDRA), ou colapso alveolar (ex: atelectasia), a resistência para passagem das correntes elétricas será menor (menor impedância elétrica). A perfusão do parênquima pulmonar também interfere na sua impedância elétrica (quanto maior a perfusão, menor será a impedância elétrica).
A TIE não consegue realizar a leitura de valores absolutos de impedância, mas somente a sua variação. São realizadas comparações entre a impedância de base (quando o aparelho foi instalado) e a atual, ou mesmo, entre a impedância elétrica inspiratória e expiratória. Essas variações percebidas na impedância, são utilizadas para criar uma reconstrução, em tempo real, da ventilação pulmonar, através de um algoritmo.
Estima-se que a TIE consegue avaliar uma região do parênquima pulmonar com 3 cm de profundidade e 10 cm de comprimento craniocaudal, ao redor da região onde os eletrodos são colocados. A imagem produzida possui 32 × 32 pixels, com cada pixel representando a variação na impedância em uma região de interesse diferente. Assim, obtemos uma amostra do parênquima pulmonar, mas não atingimos a resolução de uma tomografia computadorizada de tórax (a resolução espacial da TIE é menor do que a da TC). São geradas em torno de 50 imagens por segundo, de forma que a resolução temporal da TIE é superior à da TC. Essa alta resolução temporal permite o diagnóstico de algumas condições impossíveis de serem visualizadas de outra forma, como o fenômeno de pendelluft.
A imagem é apresentada na tela do aparelho de forma semelhante a um corte tomográfico, com o hemitórax esquerdo apresentado à direita da tela, e o hemitórax direito na parte esquerda da tela. A porção anterior do tórax aparece na parte superior da tela, e as porções posteriores na parte inferior da tela (figura 1). Podemos observar as assimetrias na ventilação entre os hemitóraces, ou entre as porções anterior e posterior do pulmão (figuras 2, 3 e 4).




Avaliação de Sobredistensão e Colapso pulmonar 3
O aparelho de TIE também fornece uma pletismografia ciclo a ciclo, demonstrando o volume corrente fornecido. Ele também é conectado ao circuito do ventilador mecânico, para avaliação das pressões de via aérea. Assim, o TIE consegue medir a complacência pulmonar ciclo a ciclo. Uma das ferramentas do aparelho é a de titulação da PEEP, através da manobra decremental, com avaliação da complacência a cada nível de PEEP. Assim é fornecida a PEEP ideal (aquela em que a complacência é máxima).
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O aparelho assume que a perda da complacência, quando aumentamos a PEEP acima do nível ideal, ocorre por hiperdistensão. Ele também assume que a perda de complacência, com níveis de PEEP abaixo do ideal, ocorre por colapso alveolar. Dessa forma, com essas duas suposições, o TIE cria um gráfico do percentual de colapso versus de sobredistensão alveolar.

Detecção de Pneumotórax
A ocorrência de pneumotórax produz uma alteração abrupta da impedância elétrica na região do acúmulo de ar. A TIE demonstra isso com um aumento súbito no brilho da imagem na tela (figura 6) . Essa ferramenta de detecção de pneumotórax com TIE está em desenvolvimento.

Perfusão Pulmonar
A perfusão pulmonar é avaliada durante uma pausa expiratória, com injeção concomitante de salina hipertônica através de acesso venoso profundo, a fim de promover variação na impedância elétrica pulmonar. O aparelho de TIE possui uma ferramenta específica para essa finalidade, com a ideia de identificar regiões de ventilação preservada, sem perfusão adequada, que poderiam representar um tromboembolismo pulmonar (figura 7).
Um estudo recente (FRESH trial 4), também utilizou um monitor de variação de impedância torácica (Cheetah Medical’s Starling SV monitor) para avaliação de fluido responsividade de forma totalmente não invasiva (figura 8).


Mensagem final
A TIE é um método a beira leito que possui diversas finalidades, como titulação de PEEP para otimizar a relação entre sobredistensão e colapso alveolar; detecção de pneumotórax e tromboembolismo pulmonar; além da identificação assincronias como pendelluft. No entanto, a TIE possui algumas limitações. Ela avalia a variação da impedância em relação a um valor de base prévio, e não valores absolutos, de forma que alterações presentes antes do início da monitorização (ex: consolidação ou derrame pleural prévio) não conseguem ser detectadas. Além disso, a calibração adequada de algumas dessas ferramentas, assim como a construção de eletrodos mais acurados, e cintas com melhor adaptação ao tórax, ainda estão em contínua evolução.
Boa parte dos trabalhos que avaliaram a TIE até o momento envolvem estudos em animais, ou estudos em humanos avaliando desfechos fisiológicos. Alguns estudos em andamento prometem avaliar o impacto dessas ferramentas em desfechos clínicos importantes.
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