EM. PED 2023: Via aérea e ventilação na parada cardiorrespiratória pediátrica

Congresso Sul-americano de Urgências e Emergências Pediátricas aborda melhores métodos para reanimação da PCR pediátrica.

Durante o 4º Congresso Paulista de Urgências e Emergências Pediátricas, um dos temas que mais se destacou foi o de Reanimação Cardiopulmonar (RCP), uma vez que esse tema é extremamente relevante em emergências pediátricas. Apesar da relevância do tema, os palestrantes concordaram que o conhecimento de pediatras a respeito da RCP é limitado, já que a exposição a situações de parada cardiorrespiratória (PCR) na infância é menos frequente do que nos adultos.  

A palestra da pesquisadora Tania Miyuki Shimoda Sakan sobre o manejo da via aérea e ventilação na PCR trouxe Informações a respeito dos modos de ventilação disponíveis para serem utilizados durante a RCP pediátrica. A palestrante no entanto ressaltou que a maioria das evidências vêm de estudos observacionais e de opinião de especialistas. A maioria dos estudos foram realizados em ambiente pré-hospitalar e não há estudos randomizados comparando o efeito da via aérea avançada na PCR pediátrica pré-hospitalar. Todos esses fatores limitam o conhecimento a respeito da melhor maneira de ventilar uma criança em PCR.  

Modo preferencial de reanimação

Uma das questões abordadas na palestra é a realização apenas das manobras compressivas durante a RCP. Sabe-se que a maioria das PCR em pediátricas tem causa respiratória, e por isso, a manutenção da via aérea e da ventilação é uma parte fundamental da RCP pediátrica. Dessa forma, existem recomendações atuais de que, para crianças com PCR pré-hospitalar por causas não cardíacas, a RCP convencional, ou seja, aquela realizada tanto com ventilação quanto com compressão cardíaca, é o modo preferencial de reanimação, pois favorece o prognóstico neurológico. Já nas crianças com PCR pré-hospitalares por causas cardíacas, a RCP convencional, ou só com a compressão, são igualmente efetivas.  

Respiração boca a boca

A ventilação na PCR pediátrica pode ser realizada de forma básica, através da respiração boca a boca e da bolsa válvula-máscara (BVM), ou de forma avançada, através da via aérea avançada (intubação orotraqueal ou dispositivos supra-glóticos). Apesar da ventilação avançada ser preferida em ambientes hospitalares, existem vantagens e desvantagens associadas a realização desse tipo de ventilação em pacientes com PCR pediátrica. Dentre as vantagens citadas pela palestrante, podemos destacar: ventilação mais efetiva, compressões torácicas sem interrupção, redução do risco de broncoaspiração e realização de feedback da reanimação através de dispositivos como a capnografia. As desvantagens, porém, podem ser citadas como a interrupção das compressões durante o procedimento de instalação da via aérea avançada, hiperventilação mais frequente com esse dispositivo, possível deslocamento do tubo orotraqueal e experiência insuficiente da maioria dos profissionais envolvidos RCP pediátrica.  

A máscara laríngea, um dispositivo supraglótico com uso em ascensão durante a RCP pediátrica, apresenta a vantagem de maior facilidade de inserção e consequentemente, menor interrupção das compressões cardíacas, podendo ser utilizada em situações de RCP.  

A capnografia na via aérea avançada durante a PCR também apresenta vantagens, uma vez que pode auxiliar na confirmação do posicionamento do tubo, na avaliação da qualidade da compressão torácica, no reconhecimento do retorno da circulação espontânea e na estratégia de tratamento de causas reversíveis da parada. 

Uma dúvida que se encontra na literatura com relação às estratégias de ventilação na PCR pediátrica diz respeito as evidências de benefício do uso de via aérea básica ou da via aérea avançada. Durante a palestra, a pesquisadora trouxe alguns artigos de revisão e metanálises sugerindo que dispositivos de intubação oratraqueal ou supraglóticos não são superiores ao uso da BVM na PCR pediátrica. Apesar disso, as evidências disponíveis são baixas ou muito baixas, ou ainda, discrepantes, e portanto, estudos randomizados de maior eficácia são desejáveis. O próprio Pediatric Life Support de 2020 sugere o uso da BVM ao invés da intubação orotraqueal ou do dispositivo supraglótico em PCR pediátrico pré-hospitalar, sendo essa uma recomendação fraca com evidência muito fraca. Além disso, as evidências são insuficientes para recomendar o uso de IOT ou de dispositivos supraglóticos na PCR pediátrica hospitalar.  

Para finalizar, a pesquisadora resumiu sua palestra afirmando que a ventilação é fundamental na RCP pediátrica, mas que o papel da via aérea avançada na PCR pediátrica não está esclarecido. Assim, os médicos devem pôr em prática a técnica com maior experiência e escalonar o manejo assim que um provedor mais experiente esteja presente. 

Uso de ultrassom na Reanimação Cardiopulmonar do paciente pediátrico 

O uso do ultrassom no tratamento de crianças graves já é uma realidade em muitos hospitais do país. Seu uso na parada cardiorrespiratória (PCR), porém, ainda não é disseminado, e foi a respeito desse tema que a Dra Marcela Preto Zamperlini palestrou no 4º Congresso Paulista de Urgências e Emergências Pediátricas.  

A palestrante, que tem ampla experiência no uso de ultrassom na PCR, trouxe algumas aplicações possíveis do ultrassom nessas situações. 

A primeira aplicabilidade discutida foi a avaliação de causas reversíveis da PCR. O uso do ultrassom pode proporcionar o diagnóstico de tromboembolismo pulmonar, através da visualização de sobrecarga de ventrículo direito, de tamponamento cardíaco, através da identificação de conteúdo anecoico delineando o pericárdio, e de hipovolemia através do kissing walls, uma evidência ecocardiográfica de colabamento das paredes ventriculares.  

A utilização de protocolos específicos para o uso do ultrassom durante a PCR pediátrica pode ser muito útil nessas situações. Um protocolo sugerido pela palestrante é o CASA, que avalia a presença dessas causas reversíveis, e de outras, como pneumotórax e lesões abdominais, dentro do próprio protocolo de reanimação cardiopulmonar. É importante enfatizar que nesses casos a realização do ultrassom não deve atrasar ou interromper as manobras de reanimação cardiopulmonar (RCP), devendo ser realizado geralmente na janela subxifoide durante os períodos de pausa habituais da reanimação cardiopulmonar, ou seja, a cada 2 minutos, e sempre levando menos de 10 segundos para a aquisição das imagens.  

Benefícios prognósticos

A pesquisadora trouxe dados de artigos científicos sugerindo benefícios prognósticos com o uso do ultrassom na reanimação cardiopulmonar, porém esses estudos ainda são escassos, heterogêneos e geralmente voltados para a população adulta, o que limita a utilização rotineira desse dispositivo durante a RCP pediátrica.  

Outra aplicabilidade discutida pela palestrante foi o uso do ultrassom para avaliação de prognóstico. Durante a PCR, o ultrassom pode avaliar a presença ou ausência de contratilidade miocárdica, com estudos sugerindo que pacientes com contratilidade miocárdica ausente apresentam pior prognóstico e menor retorno da circulação espontânea, além de mais óbitos. Ainda assim, o International Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR) coloca a certeza dessa evidência de forma geral é muito baixa.  

Mais uma utilidade do ultrassom na PCR é a avaliação do pulso e da presença de AESP versus pseudo AESP. Alguns estudos sugerem que a avaliação da presença de pulso, mesmo em situações de não PCR, é muito difícil, sendo que os profissionais muitas vezes não conseguem avaliar adequadamente esse parâmetro tão importante na RCP. Dessa forma, a ultrassonografia pode colaborar com a confirmação da presença ou ausência de pulso em pacientes suspeitos de PCR, ou em que se suspeita que houve o retorno da circulação espontânea. Além disso, o ultrassom também permite a avaliação das situações de AESP e de pseudo AESP, já que nas situações de pseudo AESP espera-se que haja algum grau de contratilidade cardíaca mesmo não causado um pulso efetivo a partir dessa contratilidade.  

Apesar dos esperados benefícios do uso do ultrassom na reanimação cardiopulmonar pediátrica, pode-se também citar alguns possíveis prejuízos, principalmente com relação ao atraso das compressões torácicas e da checagem de pulso. Esses problemas ocorrem especialmente em situações em que o uso do ultrassom não é organizado, sendo reduzido consideravelmente com o uso de protocolos tipo CASA. 

Mensagem prática

Assim, o uso do ultrassom durante a RCP de pacientes pediátricos pode ser considerado se há ultrassonografista experiente no setor, embora no atual momento sua utilidade não possa ser estabelecida. Alguns cuidados devem ser realizados no caso de se usar ultrassonografia na RCP: deve-se evitar atrasos no início e na manutenção nas manobras cardiopulmonares; é importante a realização de aquisição de imagens através de gravação de vídeos de 10 segundos, com interpretação dos resultados apenas após o retorno das manobras de reanimação; deve ser realizado com o ultrassonografista mais experiente da sala, de forma seriada e com controle externo do tempo de uso do ultrassom.   

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