Caso Clínico: sonda nasogástrica/nasoentérica e suas complicações [vídeo]

Neste episódio, Vinícius Zofoli, editor-chefe médico do Portal, discute uma revisão recente sobre a sonda nasogástrica/nasoentérica.

As sondas nasogástricas e nasoentéricas são utilizadas para diversas finalidades, como administração de dieta e medicações. Elas são utilizadas tanto a nível hospitalar (enfermaria, pronto socorro, UTI) quanto ambulatorial. No entanto, existem sérios riscos durante a sua passagem, como pneumotórax, ruptura esofágica e administração inadvertida de fluidos no pulmão. Por isso, também existem alguns cuidados que você precisa saber para a correta inserção e confirmação do posicionamento das sondas.

Neste episódio, Vinícius Zofoli, intensivista e editor-chefe de terapia intensiva do Portal, discute uma revisão recente publicada sobre a sonda nasogástrica/nasoentérica. O especialista fala ainda sobre as evidências mais atuais a respeito da correta inserção e confirmação do posicionamento das sondas nasoenterais e nasogástricas através de um caso clínico.

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Tópicos abordados no episódio:

  • Indicações e contraindicações da sonda nasogástrica/nasoentérica
  • Avaliação da inserção
  • Confirmação do posicionamento

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Vinicíus [00:11] Bem-vindos a mais um episódio. Meu nome é Vinicius Zofoli, eu sou editor-chefe de terapia intensiva aqui do portal. E a gente vai conversar hoje sobre sondas nasogástricas e nasoentéricas, isso é uma coisa muito comum no nosso dia a dia, seja você um médico que trabalha no hospital, no pronto-socorro, na UTI, na enfermaria ou mesmo na atenção básica, esse é um assunto que você precisa saber. Bom, é um procedimento que é simples, mas não isenta de complicações e as complicações são graves. Então vou comentar alguns pontos com vocês e a nossa discussão vai ser baseada nesse caso clínico aqui.

[00:51] Bom, nossa paciente, é uma paciente de 52 anos com histórico de hipertensão arterial e diabetes. Ela foi admitida com dispneia intensa associada à opressão torácica e náuseas. Apresentava esforço respiratório importante, com crepitações até ápice na ausculta pulmonar, saturando 82% já em máscara não reinalante. Então foi optado por intubação orotraqueal, certo. Perfeito.

[01:15] Em seguida, foi realizado um eletrocardiograma que demonstrava o supra de seguimento ST de V1 até V4. Então foi feita a hipótese de IAM com supra de ST. Então foi acionada uma dinâmica para realização de CATE, como o paciente foi para o CATE e IAM com supra, a ideia é provavelmente mesmo tendo vários vasos com obstrução importante, provavelmente só um deles está fechado 100%. E por isso é que eu estou vendo um supra de V1 até V4. Então a gente está suspeitando que eu tenho uma obstrução na descendente anterior e, portanto, é um paciente que provavelmente vai ganhar um stent, né? Quando eu tenho IAM com Supra, a ideia é fazer DAPT para o paciente para evitar uma trombose aguda de stent.

[02:01] Perfeito? Bom, então foi realizada a passagem de sonda nasoentérica para administração de AAS e clopidogrel e a sonda foi liberada após o teste com injeção de seringa de ar. Esse teste, a gente passa a sonda nasoentérica, pega uma seringa de 20 ml de ar e coloca o esteto no epigástrio. Você injeta essa seringa de ar e vê se você ouve um barulho no epigástrio. Bom, é assim que é feito esse teste, é o teste que a gente usa no dia a dia. Perfeito?

[02:29] Bom, a paciente foi então levada para o CATE, sendo submetida à angioplastia de DA com stent farmacológico. Ela foi em seguida admitida na UTI, com melhora hemodinâmica respiratória, sendo submetida a extubação. No entanto, ela estava esperando avaliação da fono, que iria vir no dia seguinte, foi iniciado dieta enteral e depois do início da dieta enteral, ela evoluiu para uma nova insuficiência respiratória aguda. Eletro igual, então foi realizado um raio-X do tórax que mostra isso daqui, tá. O que que a gente está vendo nesse raio-X de tórax? A gente tá vendo uma sonda nasoentérica que desce aqui pela linha média do paciente, mas chega aqui na altura da Carina ela desvia para direita do paciente, ou seja, ela entrou exatamente aqui no brônquio fonte direito. E aqui tem a porta da dieta no pulmão. Desculpa, a ponta da sonda no pulmão do paciente, injetando dieta, gerando uma pneumonite, né? Então isso é uma complicação grave da sonda.

[03:34] Então eu quero discutir um pouquinho com vocês as indicações, contraindicações e como fazer, e complicações possíveis com a introdução de sonda nasoentérica ou nasogástrica nos nossos pacientes.

[03:46] Bom, essas sondas podem ser usadas tanto para administração de dieta ou fluidos aqui no caso da nasoentérica, mas também para drenagem de secreções e descompressão do trato gastrointestinal. Aqui, no caso, a sonda nasogástrica, principalmente em pacientes que estão com alguma obstrução gastrointestinal. Perfeito? A sonda nasogástrica também pode ser usada para lavagem gástrica e a sonda nasoentérica é usada, claro, para administração de drogas, como o que a gente viu aqui no nosso caso clínico.

[04:16] Bom, quais são contraindicações para a gente fazer a passagem de uma sonda nasoentérica ou nasogástrica? Primeiro paciente com estenose esofágica, seja o paciente com uma estenose esofágica ou aquele paciente que tem um divertículo esofágico grande. Esse paciente tem um risco de perfuração esofágica se você tentar passar uma sonda. Da mesma forma, o paciente com fratura de base de crânio tem uma contraindicação formal a passagem de sonda, já que você pode, sem querer, fazer sonda em vez de descer em direção ao estômago subir para dentro do cérebro do seu paciente, através dessa falha na base do crânio.

[04:53] Já existem algumas contraindicações que não são absolutas, mas são relativas. Por exemplo, o paciente com varizes esofágicas. Isso é uma contraindicação relativa, mas às vezes a gente precisa passar e não tem muito o que fazer. Ou paciente com coagulopatia, plaquetopenia, por exemplo. E aqui o que a gente pode fazer é corrigir com a coagulopatia e depois fazer o procedimento. A gente tem que pesar risco e benefício, quando a contraindicação é relativa. E as complicações, que é aonde eu queria chegar. Bom, uma complicação muito grave é o que a gente viu no nosso caso. O paciente fez uma aspiração, uma pneumonia associada a ponta da sonda estar dentro do pulmão. Perfuração esofágica é uma outra coisa que eu já comentei, mas outras coisas que a gente pode observar é sangramento por lesão, seja do esôfago ou lesão pulmonar, por exemplo, causando hemorragia alveolar, mas também pneumotórax. Se aquela sonda que está no meu paciente, ali no pulmão, for progredido um pouco mais, ela vai causar pneumotórax. Eu já vi vários pneumotórax causados por sonda nasoentérica, e a gente vai conversar um pouquinho sobre como prevenir isso.

[05:57] E a primeira coisa que a gente precisa conversar é o quanto eu tenho que inserir da sonda, quantos centímetros eu preciso introduzir. A gente tem uma distância clássica, que é a distância NEX, que é a distância do nariz, o lóbulo da orelha, apêndice xifoide. Essa é uma distância clássica que a gente mede e eu vou introduzir esse tanto, esses centímetros da sonda. No entanto, essa descrição dessa técnica é super antiga, de 51 e ela tem uma baixa acurácia que fica abaixo de 72%. Então não é uma técnica tão boa, tá? A gente tem duas técnicas alternativas. A primeira é pegar essa mesma distância do nariz, lóbulo da orelha, apêndice xifoide, e somar dez centímetros. Essa é uma opção, ou a outra opção é fazer essa distância corrigida. Chama isso de CoNEX, essa técnica. É um pouco mais complicado. Eu botei a fórmula aqui para vocês. Fica essas duas opções para vocês usarem no seu dia a dia, combinado?

[06:58] Bom, depois de inserir, eu preciso confirmar a posição. E o raio-X de tórax é o padrão-ouro para gente confirmar o posicionamento de uma sonda nasogástrica ou nasoentérica. O que que eu preciso observar aqui nesse meu raio-X de tórax para saber se a sonda está ok? Se ela está bem posicionada. A primeira coisa, a sonda tem que descer aqui pela linha média do paciente. Então você está vendo aqui a sonda descendo aqui na frente da coluna. Beleza? Ela tem que descer pela linha média, necessariamente. Depois você repare aqui está a traqueia, né? Brônquio fonte direito, brônquio fonte esquerdo. E a sonda transfixa, passa pelo meio da Carina e continua seguindo para baixo. Ela não tem nenhum desvio na altura da Carina. Se houvesse desvio, provavelmente ela entrou no pulmão, né? Se a sonda passa reto aqui na Carina, transfixa a ela, provavelmente ela está no esôfago realmente. Então ela transfixa a Carina, continua descendo, ela passa, isso é super importante, olha aqui onde é que a sonda passa pelo diafragma, bem perto da linha média. Então eu tenho uma sonda que passa pelo diafragma próximo a linha média, tá? E aí, o ponto final é a ponta da sonda que está aqui, abaixo, no final da imagem, tem que estar a mais de seis centímetros do diafragma. Se eu fosse medir aqui essa aqui, por exemplo, estaria a mais de seis centímetros do diafragma.

[08:21] Então eu tenho que ter esse cuidado. A sonda tem que seguir esse trajeto, desce pela linha média, transfixa a Carina, bem no meio dela, não sofre desvios, passa pelo diafragma na linha média e a ponta fica posicionada abaixo do diafragma em mais de seis centímetros. Se essas condições não foram... não forem atendidas, eu não posso liberar a minha sonda, combinado?

[08:43] Bom, uma coisa que eu queria chamar atenção é sobre o teste com a seringa de ar. Esse teste a gente usa muito no nosso dia a dia e foi usado aqui no nosso caso clínico, mas ele é inacurado. Ele não é um bom teste, apesar de a gente achar que ele é bom, ele não é. Ele tem uma baixa sensibilidade para detectar sondas bem posicionadas. Ele tem uma baixa especificidade, então a acurácia dele é muito ruim e a gente não pode usar esse teste no dia a dia. A gente tem que confirmar com o padrão ouro, que é o raio-X. Eu entendo que tem lugares que a gente não tem raio-X, mas essa técnica não é uma técnica adequada para fazer essa confirmação, combinado?

[09:23] Bom, quando você tá na dúvida, uma opção é sempre usar o ultrassom. E eu botei aqui, por exemplo, um fluxograma que a gente pode fazer para confirmar se a sonda está adequada com uso de ultrassom. A gente tem duas janelas que a gente precisa usar basicamente. A primeira é uma janela de ultrassom no espaço subxifoide, onde eu vou olhar diretamente o estômago do paciente. Se eu conseguir observar a sonda nessa posição, a sonda está posicionado corretamente. Se eu estou vendo a sonda dentro do estômago, ela está bem posicionada. Beleza? Quando eu estou em dúvida, eu posso fazer a injeção. Enquanto eu estou fazendo ultrassom no espaço subxifoide, eu posso fazer a injeção de uma solução de salina com ar, o mesmo microbolhas que a gente usa, por exemplo, para fazer um eco microbolhas.

[10:10] A gente injeta uma solução de microbolhas, só que feita pela sonda, enquanto eu estou fazendo o ultrassom. E eu observo essa salina agitada com microbolhas entrando no estômago, e aí a confirmação. Se eu não consigo ver a sonda mesmo com microbolhas, eu ainda não posso confirmar que ela está com a ponta no estômago. E aí, o que que eu tenho que fazer? Eu vou fazer um ultrassom cervical e aqui eu vou colocar o probe transversal, aqui no pescoço do meu paciente, e eu vou tentar olhar a sonda para ver se eu consigo observar ela dentro do esôfago. Eu consigo distinguir com o ultrassom nessa região, se a sonda está no esôfago ou não está no esôfago e provavelmente está em outro lugar, por exemplo, a traqueia. Se eu vejo a sonda no esôfago, eu posso ter uma tranquilidade que ela pelo menos não está no pulmão. E aí, o que eu vou fazer? Avançar um pouco mais ela. Porque pode ser que ela esteja no esôfago, mas a ponta ainda não chegou no pulmão... Desculpa, no estômago, e por isso que eu não estou vendo pelo ultrassom subxifoide. Combinado? Se eu não consigo enxergar a sonda nem no ultrassom cervical, eu não posso liberar ela. Necessariamente, eu vou aguardar o raio-X e ver para onde essa ação da foi. Beleza?

[11:19] Aqui eu tenho exemplos justamente desse ultrassom cervical. Aqui eu tenho um probe colocado transversal ao pescoço do meu paciente. Aqui TR é a traqueia, é T de tireoide, A da artéria carótida. E aqui a gente vai observar o esôfago logo abaixo, aqui, do lobo da tireoide. Nessa estrutura circular é o esôfago, nessa primeira imagem, sem a sonda dentro. E na segunda imagem com uma estrutura que é hiperecoica, que forma uma sombra acústica posterior dentro do esôfago, que é a sonda nasogástrica.

[11:54] Bom, já a janela subxifoide que eu queria, mostrar sempre você vai ver o fígado no cantinho da imagem e você vai ver o estômago. Aqui eu tenho uma estrutura também hiperecoica com uma sombra acústica posterior que é a sonda, só que aqui na janela subxifoide.

[12:12] Bom, como eu falei, se eu tiver dúvida e realmente às vezes não é fácil ver a sonda, principalmente se o estômago estiver vazio. O que eu posso fazer é fazer a injeção de uma mistura de 40 ml de soro fisiológico com 10 ml de ar. Eu vou agitar essa salina e vou injetar. E aí o que eu vejo... essas microbolhas entrando no estômago, na forma de uma névoa hiperecogênica que vai estar saindo do tubo.

[12:40] Bom, existem outras formas de confirmar o posicionamento, mas que eu acho menos práticas ou que ainda estão em estudos. Por exemplo, a medida do pH. Lembrando lógico, o pH se estiver ácido, está no estômago e se não tivesse estaria na traqueia, mas várias coisas podem interferir nisso. Por exemplo, o paciente tomar omeprazol o estômago não vai estar tão ácido. O paciente aspirou a secreção gástrica para o pulmão, isso vai alterar também o pH do pulmão. Então tem limitações. A capnografia é uma forma também que está em estudo. Talvez a mais prática que vá surgir nos próximos anos é guiar um guia eletromagnético para saber se a sonda está passando no lugar certo e se chegou no estômago. Da mesma forma como a gente tem isso para guiar inserção de acesso venoso central de seção periférica. E existe também sondas com uma câmera embutida na ponta para conseguir ver o trajeto inteiro, mas é lógico que isso daqui acarreta um aumento muito alto nos custos hospitalares.

[13:45] Bom, quais são as mensagens finais para vocês levarem para casa? A primeira coisa que eu preciso saber é calcular quanto eu tenho que inserir da sonda. E aqui eu sugiro usar aquela fórmula da distância nariz, lóbulo da orelha, apêndice xifoide mais dez, que eu acho mais prática. Sempre confirme a posição com raio-X. “Ah, mas eu vou estar botando ambulatoriamente, eu não tenho raio-X”. Gente, eu honestamente acho mais seguro, nem que você tem que aguardar um pouco mais, mas fazer o raio-X do que inserir às cegas e não ter certeza de que ela está na posição adequada. Tá bom? Lembrar que as complicações não são complicações leves, são complicações graves com risco de vida, né? Nesse sentido também, a gente não tem que usar, não pode usar o teste com a seringa de ar para confirmar a posição da sonda. Esse teste não é acurado o suficiente para garantir que a sonda, a ponta dela, está no lugar correto dentro do estômago. Tá bom? E por último, a confirmação com ultrassom é algo que está em estudo e obviamente exige treinamento e exige que você tenha ultrassom na sua unidade. Mas cada vez mais os ultrassons estão ficando portáteis, então às vezes é até uma solução mais prática para aquelas localidades que não tem raio-X. Você tem um ultrassom comprado pela unidade de saúde para poder fazer essa confirmação. E lógico que o ultrassom vai ter muitas outras aplicabilidades nessa unidade de saúde. Bom, era isso que eu tinha para conversar. Um abraço.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Boeykens K, Holvoet T, Duysburgh I. Nasogastric tube insertion length measurement and tip verification in adults: a narrative review. Crit Care. 2023 Aug 18;27(1):317. DOI: 10.1186/s13054-023-04611-6.