Melhor opção para MIS-C: metilprednisolona ou imunoglobulina humana?

Um estudo comparou a resposta de pacientes com MIS-C ao tratamento com IGIV e metilprednisolona. Confira os detalhes.

Por suas semelhanças com a doença de Kawasaki (DK), os primeiros casos de síndrome inflamatória multissistêmica na criança (MIS-C) foram prontamente tratados com imunoglobulina humana intravenosa (IGIV). Felizmente, apesar de se tratar de doenças diferentes, logo ficou claro que essa também era uma opção terapêutica na MIS-C, o que sem dúvidas reduziu a mortalidade do quadro. Em se tratando de uma doença que cursa com hiperinflamação, outras alternativas para seu controle também vêm sendo estudadas desde o surgimento da enfermidade.  

A revista The Lancet publicou, esse mês, um estudo multicêntrico randomizado comparando a resposta de pacientes com MIS-C ao tratamento com IGIV e metilprednisolona. 

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Metodologia 

O estudo foi realizado em dez hospitais da Suíça (incluindo serviços de terapia intensiva e de enfermaria) entre maio de 2021 e abril de 2022 e era composto de dois braços com a proporção de 1:1 em relação ao número de pacientes. O primeiro grupo tinha como intervenção o uso de metilprednisolona (10 mg/kg/dia por três dias consecutivos, sem desmame posterior) e, no segundo, os pacientes diagnosticados com MIS-C fizeram uso de IGIV (2 g/kg em dose única).  

O desfecho primário avaliado foi tempo de internação (tempo até a alta ou óbito). Como desfechos secundários, foram avaliadas a proporção e a duração da necessidade de suporte orgânico (circulatório, respiratório e etc.). Foram incluídos pacientes com menos de 18 anos que completavam os critérios diagnósticos de MIS-C.  

Resultados

Setenta e cinco pacientes com MIS-C participaram do estudo (37 no grupo da metilprednisolona e 38 no grupo da IGIV). Os pacientes tinham uma mediana de idade de 9,1 anos e apenas 25% eram do sexo feminino. Oito pacientes (11%) tinham comorbidades associadas (não descritas). Os sinais e sintomas presentes de forma mais consistente foram febre, linfopenia, marcadores inflamatórios aumentados, como a proteína C reativa, e elevação de pro-BNP. O tempo de internação, desfecho primário do estudo, foi semelhante nos dois grupos, com mediana de seis dias. No entanto, foi observada maior frequência de necessidade de suporte ventilatório no grupo da metilprednisolona (três [8%] de 37 vs 11 [29%] de 38, p= 0,040), mesmo após regressão logística multivariada para sexo, idade e índice de massa corpórea (p – 0,030). A duração do suporte ventilatório, assim como o uso de inotrópicos e seu tempo de uso não tiveram diferença entre os grupos. O mesmo ocorreu nos desfechos secundários, como ectasia de coronárias ao final do 28º dia de acompanhamento. Em nove pacientes (24%) do grupo da IGIV foi identificado ecocardiograma com fração de ejeção do ventrículo esquerdo inferior a 55%, sendo observado o mesmo em cinco (14%) dos pacientes do grupo da metilprednisolona.  

Diferente do que foi encontrado em outros estudos, os autores descrevem que o uso da IGIV não foi superior a metilprednisolona mesmo nos pacientes com fenótipo clínico de DK-like. 

Os autores fazem ressalvas com relação aos seus achados, já que a proporção de pacientes que necessitou de internação em CTI foi menor em comparação com outros estudos sobre o assunto, assim como a amostra de pacientes, que foi menor do que o número pretendido (80) e relativamente pequena em comparação com os outros artigos com proposta semelhante. Também foi salientado que houve 15 pacientes excluídos devido a decisão clínica de que o respectivo tratamento randomizado para o paciente não era adequado.  

Conclusões 

Os dados do estudo sugerem que o uso de metilprednisolona não afetou o tempo de internação, mas embora tenha tido diversas limitações, o tratamento com metilprednisolona parece estar associado a menor necessidade de suporte ventilatório. Além disso, o uso do corticoide não coincidiu com o aumento do número de complicações da doença, incluindo envolvimento cardíaco agudo ou subagudo em curto prazo. Dessa forma, embora sejam necessários mais estudos, os autores sugerem que a metilprednisolona pode ser considerada como opção de primeira escolha para o tratamento da MIS-C.

Leia também: Algoritmo para diagnóstico de síndrome inflamatória multissistêmica na criança

Comentários 

O estudo é interessante e importante, já que o tratamento com IGIV, além de muito mais caro do que com metilprednisolona, é menos disponível. Ainda assim, é preciso cautela na interpretação dos dados. Os próprios autores destacaram pontos importantes, sendo o principal, na minha opinião, o fato de terem sido excluídos pacientes randomizados para um determinado grupo por decisão médica de que aquele não seria um tratamento adequado. Também deve estar claro que o benefício da metilprednisolona sobre a IGIV demonstrado no estudo foi modesto e sem significância estatística. Além disso, o acompanhamento dos pacientes foi realizado por apenas 28 dias, não sendo possível identificar possíveis complicações ou recaídas após esse período.  

Por fim, é preciso atenção para o fato de que o esquema utilizado no tratamento com a metilprednisolona é o habitualmente usado para pulsoterapia, não a dose usual de 1-2 mg/kg/dia prescrita em outros cenários clínicos.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • LAM, Jonathan et al. A machine-learning algorithm for diagnosis of multisystem inflammatory syndrome in children and Kawasaki disease in the USA: a retrospective model development and validation study. Lancet Digit Health., v.4, n.10, p.e717-e726, 2022

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