Qual é a diferença entre a regurgitação mitral funcional atrial e a secundária?

A regurgitação mitral está entre as mais prevalentes valvopatias, acometendo mais de 2 milhões de adultos em 2000 e espera-se que dobre em 2030. Saiba mais:

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Ao final desse artigo, você deverá ser capaz de diferenciar a fisiopatologia da Regurgitação Mitral Atrial Funcional ( RMAF ), associada à fibrilação atrial (FA) ou à insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP), e da Regurgitação Mitral Secundária à disfunção do ventrículo esquerdo (RMS). Bem como, diferenciar sintomas, apresentação clínica e achados de imagem. E, finalmente, definir o melhor tratamento para cada uma.

Pois bem, a regurgitação mitral (RM) está entre as mais prevalentes valvopatias, acometendo mais de 2 milhões de adultos norte-americanos em 2000 e espera-se que dobre em 2030.  O número de indivíduos com FA em 2010 era de 33,5 milhões mundialmente, com novos casos anuais de aproximadamente 5 milhões. Significativo número de casos de RMAF estiveram presentes em 7% dos pacientes referidos para sua primeira ablação de FA.

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A proporção dos pacientes com insuficiência cardíaca que tinham ICFEP variou em três coortes epidemiológicas de acordo com a faixa etária (53,3%, 46,5% e 36,9%) nos estudos Cardiovascular Health, The Framingham Heart e The Prevention of Renal and Vascular End-Stage Disease, respectivamente. Respectivamente, um terço e dois terços dos pacientes com ICFEP experimentam FA no momento do diagnóstico ou em dado momento durante a doença. Quando FA e ICFEP coexistem, há maior remodelamento do átrio esquerdo (AE), elevação do peptídeo natriurético, intolerância ao exercício, e pior prognóstico.

O reconhecimento precoce da RMAF parece importante porque se correlaciona com o sucesso na ablação, considerando que a manutenção do ritmo sinusal reduz a gravidade da RM significativamente.

ressincronização cardíaca

Fisiopatologia

A RMS se deve ao tethering ou à diminuição das forças de fechamento dos folhetos. A dilatação do ventrículo esquerdo (VE) causa tethering, bem como a disfunção ou o deslocamento dos músculos papilares. A redução das forças de fechamento dos folhetos estão relacionadas à contratilidade diminuída do VE ou à sua dissincronia. Uma RM moderada obrigatoriamente apresenta disfunção do aparelho subvalvar. Já a RMAF, associada à ICFEP ou à FA, apresenta função e tamanho do VE normais, dilatação do anel mitral e malcoaptação dos folhetos.

Múltiplos estudos têm implicado a dilatação isolada do anel mitral (AM) como a causa principal da malcoaptação dos folhetos, independentemente das dimensões do ventrículo esquerdo. ICFEP pode originar RMAF devido à dilatação do AM, mesmo na ausência de FA. Disfunção diastólica e pressões do AE aumentadas, devido ao desequilíbrio neuro-humoral (depleção do peptídeo natriurético atrial e ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona-SRAA) desempenham um papel importante, resultando em fibrose e alongamento do AE. O remodelamento atrial facilita o início e manutenção da RMAF e FA. FA contribui para fibrose do VE, disfunção diastólica, e consequente, ICFEP e RMAF.

Quando o anel mitral se dilata extremamente, o crescimento na área dos folhetos atinge um platô, indicando que a adaptação dos folhetos é insuficiente e um fator contribuinte para RM.

Imagem (ecocardiograma)

Na RMAF, os folhetos são considerados normais, apesar do espessamento fibrótico discreto e calcificação anular que podem ser vistos. Na RMS, a mobilidade dos folhetos parece reduzida e o ponto de coaptação é encontrado à distância do plano anular devido à doença do VE. A altura tendínea (distância do ponto de coaptação ao plano anular) e a área tendínea (área entre os folhetos e o plano anular) permitem a quantificação do tethering que se associa com a gravidade da RM.

Na RMAF, a fração de ejeção e volumes do VE são invariavelmente normais, apesar do strain global longitudinal poder estar deprimido. O ponto de coaptação é tipicamente encontrado sobre o plano anular com o jato da RM localizado centralmente ao longo da linha de coaptação. Aumento biatrial é comumente presente na população com FA e/ou ICFEP de longa data.

Tratamento

No manuseio da RMS, inclui-se a otimização da terapia da insuficiência cardíaca. Beta-bloqueadores, inibidores da enzima de conversão da angiotesina 2 e sacubitril-valsartana reduzem a RMS por causarem o remodelamento reverso do VE. Adicionalmente, o alívio da RMS induzido pela terapia de ressincronização cardíaca (TRC) é atribuído agudamente ao aumento das forças de fechamento aliadas à ressincronização dos músculos papilares e cronicamente às reduções nas dimensões do VE.

A terapia medicamentosa para ICFEP contemporânea e FA não é diferente da com ritmo sinusal, embora nenhuma droga tenha provado diminuir morbidade e/ou mortalidade. A inibição do SRAA pode reduzir a incidência de nova FA e sua recorrência, embora esse efeito seja menor em paciente com ICFEP. Além disso, sacubitril-valsartana, reduziram significativamente volumes do AE, apesar de não alterarem a disfunção diastólica na ICFEP. Se o uso dessas drogas leva a uma incidência menor de RMAF permanece como dúvida.

Uma estratégia de controle do ritmo da FA não mostra diferenças na sobrevida e eventos cardiovasculares comparada com o controle da frequência no estudo AFFIRM (Atrial Fibrilation Folow-up Investigation of Rhythm Management). Entretanto, a RMAF pode ter benefício com a restauração do ritmo sinusal devido ao remodelamento reverso do AE anatômico e mecânico. A ablação provou-se superior à terapia medicamentosa para reduzir a incidência de morte ou re-internação hospitalar na FA.

A anuloplastia restritiva mitral cirúrgica que melhora a coaptação dos folhetos por reduzir as dimensões anulares tem sido a estratégia padrão-ouro para RMS baseada em bons estudos observacionais. Porém, a taxa de recorrência chega a 32,6% após 12 meses de uma anuloplatia inicial de sucesso.

Conclusão

Tethering estimula o crescimento dos folhetos, mas também seu espessamento e fibrose, e pior coaptação. Essa contribuição orgânica é governada pela maior expressão do fator de crescimento beta que resulta na transição de endotélio para mesênquima. Pela inibição do transformador fator de crescimento beta, a losartana pode prevenir mudanças pró-fibróticas eliminando o crescimento compensatório. Sacubitril-valsartana age sinergicamente nesse mecanismo sem interferir nesse crescimento.

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Referências:

  • Deferm S, Bertrand PB, Verbrugge FH, Verhaert D, Rega F, Thomas JD et al. Atrial Functional Mitral Regurgitation. J Am Coll Cardiol 2019;73:2465-76.

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