A torção ovariana é definida como a torção do ovário sobre seus próprios ligamentos de sustentação, resultando em isquemia e eventual necrose. O tratamento cirúrgico imediato é imperativo para restaurar a perfusão anexial e salvar a função ovariana. Convencionalmente, a ooforectomia é realizada para um ovário isquêmico ou necrótico devido aos riscos de trombose e sepse com a conservação ovariana. No entanto, estudos recentes têm mostrado que o manejo conservador com distorção não parece aumentar as complicações pós-operatórias em comparação com a ooforectomia, mesmo na configuração de um ovário de aparência necrótica. Portanto, a conservação ovariana é agora considerada o padrão de cuidados para torção anexial.
Em novembro de 2016, o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) publicou o Practice Bulletin nº 174 recomendando a conservação ovariana sobre ooforectomia para o tratamento da torção anexial entre mulheres que desejam permanecer férteis. Especificamente, o Bulletin afirma: “Nos casos de torção, a conservação anexial deve ser priorizada porque, na maioria dos casos, o ovário residual recuperará a perfusão e permanecerá viável”. Apesar disso, não está claro se os padrões de prática mudaram desde a emissão desta orientação atualizada.
O estudo aqui descrito foi publicado recentemente e o objetivo principal foi descrever as últimas tendências no tratamento cirúrgico da torção ovariana entre 2008 e 2020. E o objetivo secundário foi descrever as mudanças no manejo antes e depois da publicação das diretrizes atualizadas do ACOG.
Metodologia
Foi realizado um estudo de coorte retrospectivo usando a base de dados americana National Surgical Quality Improvement Program. Foram identificadas mulheres submetidas a cirurgia para torção anexial entre 2008 e 2020. Foram agrupadas conforme o tipo de cirurgia: conservadora ou ooforectomia. As pacientes também foram agrupadas em coortes de anos com respeito à publicação das diretrizes atualizadas do ACOG (2008–2016 em comparação com 2017–2020).
Principais resultados
Um total de 2.503 pacientes foram submetidas a cirurgia para torção anexial durante o período do estudo. Destas, 1.791 pacientes atenderam aos critérios de inclusão e exclusão. A coorte de 2008-2016 continha 402 pacientes (22,4%) e a coorte de 2017-2020 continha 1.389 pacientes (77,6%). Durante o período do estudo, 542 pacientes (30,3%) foram submetidas à cirurgia conservadora, e 1.249 pacientes (69,7%) foram submetidas à ooforectomia.
Não houve diferença significativa na proporção de ooforectomias realizadas antes de 2017 em comparação com depois 2017 (71,9% vs 69,1%, razão de chances [OR] 0,89, IC 95% 0,69–1.16; OR ajustado 0,94, IC 95% 0,71–1,25). Entretanto, uma significativa diminuição na proporção de ooforectomias realizadas a cada ano foi identificada durante todo o período de estudo (-1,6%/ano); porém, as taxas não diferem antes e depois de 2017 (p=0,16).
Conclusões
Apesar de ser observada uma discreta diminuição nas ooforectomias para o tratamento cirúrgico da torção anexial ao logo dos anos, esse procedimento continua sendo comum, mesmo depois da publicação do guideline do ACOG em 2016.