Embora novas subvariantes da variante Ômicron do SARS-CoV-2 pareçam causar doenças menos graves, elas são mais contagiosas do que as variantes anteriores. As taxas de transmissão persistentemente altas, aliadas às possíveis complicações fazem com que os clínicos permaneçam atentos aos novos casos e atualizados sobre as recomendações de tratamento.
Idealmente, estudos publicados desde meados de 2022 deveriam fornecer resultados específicos para subvariantes do SARS-CoV-2, mas isso raramente ocorreu. A maioria dos estudos foram iniciados nos primórdios da pandemia e incluíram pacientes com as variantes iniciais, ou incluíram pacientes ao longo de vários anos, mas não especificaram os resultados estratificados por variantes da covid -19.
Embora a maioria dos pacientes recentemente vacinados não apresente sintomas ou apresente sintomas leves, é prudente adaptar as recomendações de tratamento à gravidade da doença. Os estudos incluídos nesse guideline abordaram pacientes adultos, diagnosticados com covid -19, com acompanhamento mínimo de sete dias.
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Terapia antitrombótica em pacientes não hospitalizados
Na grande maioria dos pacientes com covid -19 e sintomas leves a moderados, a incidência de tromboembolismo, hospitalização ou óbito parece ser tão baixa que não é necessária nenhuma terapia antitrombótica, a menos que seja indicada por outras doenças preexistentes.
Recomendação |
Qualidade da evidência |
Descrição |
Ausência de benefício |
Moderada |
Em pacientes não hospitalizados com covid-19 sintomática, o uso de antiagregantes plaquetários não alterou desfechos de hospitalização, tromboembolismo venoso ou arterial, e mortalidade. |
Ausência de benefício |
Alta |
Em pacientes não hospitalizados com covid-19 sintomática, o uso de DOACs não alterou desfechos de hospitalização, tromboembolismo venoso ou arterial, e mortalidade. |
Considerar (recomendação fraca) |
Moderada |
Em pacientes não hospitalizados com covid-19 e risco de progressão da doença, considerar sulodexida oral dentro de 03 dias do início dos sintomas para reduzir risco de hospitalização. |
Ausência de benefício |
Moderada |
Em pacientes não hospitalizados com covid-19 sintomática, a tromboprofilaxia com heparina de baixo peso molecular não reduziu risco de progressão da doença, hospitalização ou morte por qualquer causa |
Terapia antitrombótica para pacientes internados não criticamente enfermos
O ensaio clínico randomizado ‘FREEDOM COVID’ comparou o efeito da dose terapêutica do DOAC apixabana com as doses terapêuticas e profiláticas de Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM). Os resultados foram semelhantes para apixabana e HBPM em dose terapêutica, ambos demonstrando redução da mortalidade em comparação com doses profiláticas. No entanto, os resultados contradisseram os de outro ensaio clínico randomizado menor (AntiCoagulaTlon cOroNavirus) com um DOAC diferente (rivaroxabana). Por esse motivo, a recomendação informa que isso “não está bem estabelecido”.
Recomendação |
Qualidade da evidência |
Descrição |
Fazer (Recomendação forte) (Benefício > Risco) |
Moderada |
Doses profiláticas de HNF ou HBPM são preferíveis à terapia antitrombótica não farmacológica para prevenção de eventos tromboembólicos ou morte por qualquer causa. Considerar em pacientes com risco elevado de sangramento. |
Fazer (Recomendação forte) (Benefício > Risco) |
Alta |
Doses terapêuticas de HNF ou HBPM são preferíveis a doses profiláticas/intermediárias quando o desfecho avaliado foi evento tromboembólico ou morte por qualquer causa. Não houve aumento de sangramento. |
Ausência de benefício |
Alta |
Doses intermediárias de HBPM ou HNF não são recomendadas para redução de mortalidade ou evento tromboembólico. |
Prejuízo/Dano |
Alta |
Não acrescentar antiagregantes plaquetários ao tratamento. |
Considerar |
Moderada |
Apixabana em dose terapêutica pode ser considerada ao invés de heparinas. |
Terapia antitrombótica para pacientes hospitalizados e criticamente enfermos
Com as atuais variantes menos agressivas do SARS-CoV-2 e com o aumento da imunidade na população devido à vacinação e à exposição prévia à covid-19, o número de pacientes hospitalizados pela doença e que necessitam de terapia suportiva em ambiente de UTI diminuiu. Pessoas sem tal imunidade ainda estão suscetíveis a casos graves de covid-19 e ocasionalmente necessitam de tratamento em ambiente de terapia intensiva. Devido ao aumento na frequência e intensidade dos sangramentos observados com doses terapêuticas das heparinas em pacientes criticamente enfermos, podemos observar uma alteração da recomendação de tratamento nesse grupo em comparação com o visto no tópico anterior. Aqui, as doses profiláticas são preferíveis. Para pacientes que já estão em uso de agentes antiplaquetários com indicações claras, a boa prática clínica sugere a continuação da terapia antiplaquetária motivada por outras comorbidades.
Recomendação | Qualidade da evidência | Descrição |
Ausência de benefício |
Alta |
Doses intermediárias das heparinas não são recomendadas frente a doses profiláticas para redução de mortalidade |
Ausência de benefício |
Alta |
Doses terapêuticas das heparinas não são recomendadas frente a doses profiláticas ou profilaxias mecânicas. |
Ausência de benefício |
Alta |
Adição de antiagregantes plaquetários à doses profiláticas das heparinas não é recomendado. |
Terapia antitrombótica após alta
A taxa de eventos adversos após a alta está diminuindo e atualmente é tão baixa que, para a grande maioria dos pacientes, não há benefício na profilaxia pós-alta com anticoagulantes. Um pequeno subconjunto de pacientes com alto risco de tromboembolismo, com base no histórico de eventos tromboembólicos prévios, elevação do D-dímero ou um escore elevado no modelo de avaliação de risco do ‘Registro Médico Internacional de Prevenção de Tromboembolismo Venoso’ (em inglês – Medical Prevention Registry on Venous Thromboembolism risk assessment model) , ainda deve ser considerado para profilaxia pós-alta com 10 mg de rivaroxabana diariamente.
Recomendação | Qualidade da evidência | Descrição |
Ausência de benefício |
Alta |
Não se recomenda DOACs em doses profiláticas em pacientes de risco padrão para trombose após a alta |
Considerar |
Moderada |
Em pacientes de alto risco para trombose, considerar fazer profilaxia com rivaroxabana 10 mg por 30 dias após a alta |
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Trombose induzida pela vacinação contra covid-19
O caso suspeito de Trombose Induzida por Vacinação (TIV) é definido como alto nível de D-dímero e trombocitopenia (< 150.000/μL) associada a trombose ocorrendo 5-30 dias após a vacinação com vacina baseada em vetor adenoviral para covid-19.
Um grande estudo observacional em pacientes com trombofilias diagnosticadas não demonstrou aumento do risco de trombose durante 3 meses após o uso quase que exclusivo das vacinas de RNA mensageiro. Estudos avaliando a trombose induzida pela vacinação são complexos e com número limitado de casos, o que acaba por gerar vieses e limitar a qualidade da evidência.
Recomendação | Qualidade da evidência | Descrição |
Ausência de benefício |
Moderada |
Não se deve fazer profilaxia antitrombótica medicamentosa ou antiagregantes plaquetários em pacientes ambulatoriais vacinados e com história prévia de trombofilia. |
Fazer |
Moderada |
Para diagnóstico de trombose associada à vacina, pesquisar anticorpos IgG antifator plaquetário (FP) 4. |
Ausência de benefício |
Moderada |
Para diagnóstico de trombose associada à vacina, não utilizar outros métodos rápidos para diagnósticos de trombocitopenia induzida pela heparina (HIT) |
Considerar |
Baixa |
Pacientes com diagnóstico de trombose associada à vacina podem ser tratados com HBPM ou HNF na ausência de agentes anticoagulantes não relacionados à heparina |
Considerar |
Baixa |
O tratamento com imunoglobulina pode ser aventado em pacientes com trombose induzida pela vacina. |