O puerpério é caracterizado pela mudança efetiva da identidade de papel da mulher dentro do contexto familiar e social. Nesse período também ocorre o reconhecimento do bebê real, que às vezes se difere do bebê imaginado. E, além disso, as mudanças nos hábitos de vida podem ser radicais, interferindo no sono, repouso, alimentação e sexualidade.
As alterações orgânicas, caracterizadas pela labilidade de ocitocina e hormônios gonadais, e de neurotransmissores do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, somam-se às alterações sociais e psicológicas e podem causar instabilidade emocional para as mulheres durante o período puerperal. Nesse contexto, identificar de maneira precoce essas alterações e o limite de normalidade entre elas pode ser essencial para uma experiência de maternidade positiva.
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Depressão pós-parto e Baby blues
O Baby blues atinge a maioria das gestantes entre o terceiro e 14º dia após o parto, causando sintomas leves como tristeza, irritabilidade, choro, ansiedade, alteração da concentração. Dentre os fatores de risco estão histórico de depressão pessoal ou familiar, alteração de humor pré-menstrual ou relacionado ao uso de anticoncepcionais, estresse com os cuidados com o bebê, problemas psicossociais, econômicos, relacionados ao apoio familiar, autoimagem e modificação da vida e inseguranças quanto ao cuidado do bebê.
Já a depressão pós-parto ocorre após a terceira semana do parto, tendo o pico dos sintomas com seis meses. Nesse quadro, ansiedade, irritabilidade, anedonia, alterações do sono, desânimo, sentimento de culpa, ideação suicida, medo de machucar o filho, perda de apetite e libido, e ideações obsessivas ou supervalorizadas podem ocorrer. Além dos fatores de risco psicossociais para Baby blues, gestação não planejada, abortamento prévio, ausência de relacionamento afetivo com a própria mãe, e não amamentar estão dentre as causas prováveis.
Tendo em vista que essas duas condições são comuns e responsáveis por complicações significativas na vida da mulher e família, além de rastrear e diferenciar o Baby blues da depressão pós-parto nas consultas puerperais, o incentivo ao aleitamento materno surge como uma intervenção efetiva. No Baby blues o tratamento está relacionado a trabalhar os sentimentos e emoções da mulher, que deve expor o que sente e caso tenha rede de apoio, este é o momento para que haja o apoio das pessoas ao redor. Já a depressão pós-parto por se caracterizar como um transtorno de humor é indicado a psicoterapia e o tratamento medicamentoso.
Papel da enfermagem
O profissional de enfermagem deverá diferenciar o baby blues da depressão pós-parto. Como o Baby blues atinge um grande número de mulheres no pós-parto e há flutuação do humor causado por flutuações hormonais, que geram sintomas depressivos, provocando o errôneo diagnóstico de depressão pós-parto, que é um caso mais grave que o baby blues, por provocar rejeição da mãe ao bebê, ideal de automutilação e outras agressões a si, além de provocar atos de violência ao bebê. Na depressão pós-parto, o curso da doença pode se aproximar de 2 anos e gerar diversos sintomas logo após o nascimento do bebê, sendo os mais comuns a insônia, a irritabilidade, ansiedade e tristeza na maior parte do tempo.
A amamentação é um fator de proteção por atenuar a liberação de cortisol, que é comum em situações de estresse; aumentar a liberação de prolactina e ocitocina, que possui o efeito ansiolítico e antidepressivo; melhorar a qualidade do sono das mães que amamentam e a interação entre mãe e bebê. Além da amamentação, a orientação do profissional quanto aos cuidados e o processo de desenvolvimento do bebê, podem diminuir os anseios da mãe. O apoio familiar também pode ser instrumento de cuidado das enfermeiras que devem orientar a família quanto a sua importância.
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O profissional de saúde reconhecendo o baby blues ou a depressão pós-parto, junto a equipe, paciente e sua família, deve criar um projeto terapêutico singular e construir cuidados a saúde da mãe e do bebê. Após o reconhecimento da doença que é o primeiro passo, deve-se evidenciar a gravidade e construir cuidados de proteção, de apoio, relacionados às emoções que envolvem o momento, considerando as vulnerabilidades da mulher. O cuidado deve-se iniciar antes do parto. A mulher deve ser orientada desde o pré-natal sobre as possibilidades de alteração do humor, isso pode ajudar a identificar as complicações de cada condição.
Autoria:
Hérica Pinheiro Corrêa
Enfermeira e coordenadora da Estratégia Saúde da Família. Mestranda em Cuidado Primário em Saúde na Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES). Enfermeira obstetra pelo Hospital Sofia Feldman. Enfermeira pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Rafael Polakiewicz
Doutorando em Ciências do Cuidado em Saúde (UFF), Mestre em Ciências do Cuidado em Saúde (UFF) e Especialista em Atenção Psicossocial.