Ácido tranexâmico profilático em plaquetopênicos com neoplasias hematológicas

Conheça um estudo que avaliou diagnóstico de neoplasias hematológicas ou aplasias de medula óssea em pacientes de quimioterapia.

Quem trata pacientes com neoplasias hematológicas sabe que a toxicidade da medular óssea relacionada à terapêutica é um dos principais eventos adversos encontrados no curso do cuidado médico.  

A dependência transfusional é uma constante principalmente na abordagem dos pacientes com doenças primariamente medulares ou com infiltração por outras neoplasias (linfomas ou tumores sólidos, por exemplo). A transfusão de concentrado de plaquetas na forma de pool, aférese ou plaquetas randômicas é utilizada neste contexto tanto de maneira terapêutica, como no caso de sangramentos ativos, quanto de maneira profilática.

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O uso de antifibrinolíticos, como o ácido tranexâmico (TXA), tem sido estudado como uma proposta para redução do uso de hemocomponentes no manejo dos pacientes com neoplasias hematológicas. Esse grupo de drogas tem demonstrado redução de sangramento e mortalidade em cirurgias ortopédicas, cardiotorácicas, transplantes de órgãos sólidos além de trauma e sangramento obstétrico em diversos estudos bem estruturados publicados na literatura mundial. Na prática clínica, são habitualmente utilizados para distúrbios hemorrágicos relacionados à coagulopatias e disfunções plaquetárias.  

As plaquetas são os principais grupos celulares provedores de agentes inibidores do plasminogênio. Sendo assim, os coágulos formados em vigência de plaquetopenia tendem a ser friáveis e se romperem facilmente. A hipótese dos pesquisadores é de que a adição de antifibrinolíticos em pacientes plaquetopênicos graves ajude a suprir essa demanda.

Representações sociais dos sentimentos vivenciados pela pessoa com neoplasia

Novo estudo 

Foi publicado no periódico Blood, em setembro de 2022, um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, placebo-controlado que avaliou 356 pacientes com diagnóstico de uma neoplasia hematológica ou aplasia de medula óssea, que seriam sido submetidos a quimioterapia, radioterapia, imunoterapia ou transplante de medula óssea e nos quais se esperava uma plaquetopenia relevante (≤ 10.000/uL) por mais de cinco dias.  

Métodos 

Esses pacientes não poderiam ter história prévia de eventos tromboembólicos ou cardiovasculares ou, ainda, serem considerados de alto risco para tal. Não poderiam também estar em terapia anticoagulante. Dentre os critérios de exclusão podemos citar: coagulação intravascular disseminada (CIVD), trombocitopenia imune (PTI), leucemia promielocítica aguda (LPA), uremia severa ou pacientes em diálise. Os participantes do estudo foram recrutados em três centros de tratamento hematológico nos Estados Unidos. As características no baseline eram bastante semelhantes. A randomização foi feita com base na doença hematológica de base, exposição à quimioterapia ou imunoterapia, transplante alogênico ou transplante autólogo.  

Após uma perda de 7,3% dos pacientes selecionados para o estudo, os remanescentes foram alocados na proporção de 1:1 (165 indivíduos em cada braço) para receberem placebo ou ácido tranexâmico (TXA) nas doses de 1300 mg por via oral ou 1000 mg por via endovenosa três vezes por dia em um máximo de 30 dias. Os pacientes iniciavam o uso das drogas após a contagem plaquetária ficar abaixo de 30.000/uL. Os pacientes poderiam receber transfusão de plaquetas quando os níveis séricos fossem ≤ 10.000/uL ou a critério do médico assistente. 

Resultados 

A incidência do desfecho primário avaliada em 30 dias em ambos os grupos foi de 50,3% (73/145) e 54,2% (78/144) entre os pacientes alocados no grupo TXA e placebo, respectivamente, com Odds Ratio (OR) de 0,83 (95% Intervalo de Confiança [IC], 0,50-1,34; P = .44). De maneira semelhante, não houve diferença estatisticamente relevante observada entre os desfechos secundários.  

O número de eventos trombóticos e o número de mortes secundárias a sangramentos tampouco apresentou diferença significativa. Os eventos adversos mais comumente observados nos dois grupos de pacientes foram: diarreia, neutropenia febril, fadiga e náusea. Os desfechos de segurança foram semelhantes em ambos os grupos. Infelizmente o estudo não teve poder suficiente para avaliar subgrupos que potencialmente seriam beneficiados pela terapêutica. 

Considerações 

O objetivo primário foi a redução de sangramento grau 2, conforme escala da Organização Mundial de Saúde (OMS). Dois estudos realizados previamente, o TOPPS trial e o PLADO trial, reportaram uma incidência de 43% e 70% de sangramentos com essa graduação entre pacientes hematológicos apesar das transfusões plaquetárias, podendo chegar a 79% nos casos de pacientes submetidos ao transplante alogênico. A tabela a seguir disponibiliza a graduação de sangramento de acordo com a OMS. 

Grau 0   Ausência de sangramento 
Grau 1  Surgimento de petéquias 
Grau 2  Sangramento de pequena monta clinicamente significante 
Grau 3  Sangramento relevante com necessidade de internação hospitalar ou suporte transfusional  
Grau 4  Sangramento severo, debilitante, com necessidade transfusional, associado a fatalidades incluindo sangramentos retinianos e intracranianos 

Dentre os objetivos secundários observamos número de transfusões de plaquetas por indivíduo e número de dias sem sangramento grau 2 ou superior. Os desfechos foram mensurados dentro dos primeiros 30 dias conforme protocolo de tratamento. Os desfechos de segurança foram: mortalidade por qualquer causa, eventos adversos grau 4 na escala CTCAE, eventos trombóticos, eventos venoclusivos e morte relacionadas à trombose (até 120 dias após início do tratamento). A análise estatística foi feita por intenção de tratar.  

Conclusão e mensagem prática

Embora o uso de antifibrinolíticos (mais especificamente o ácido tranexâmico) tenha sido validado como importante terapêutica em outros cenários, ainda não temos evidências suficientes para apoiar o uso dessa droga no contexto de pacientes diagnosticados com neoplasias hematológicas e plaquetopenia intensa. Ao contrário, preferimos não os incluir no arsenal farmacológico desses pacientes.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Ácido tranexâmico profilático em pacientes com malignidade hematológica: um ensaio clínico randomizado controlado por placebo | | de sangue Sociedade Americana de Hematologia (ashpublications.org); https://doi.org/10.1182/blood.2022016308