Acupuntura e a neuropatia do diabetes mellitus

A acupuntura tem sido usada para o tratamento da neuropatia e resultados positivos têm sido relatados, baseados na observação empírica.

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A neuropatia diabética periférica (NDP) é uma complicação crônica e frequente do diabetes mellitus. Está relacionada com a duração da doença e com o controle inadequado da glicemia. É definida por sinais e sintomas de disfunção das terminações nervosas periféricas, mas a neuropatia diabética pode acometer qualquer nervo do corpo humano. Afeta mais de 30% dos pacientes com diabetes, e estima-se que mais de 50% desenvolverão neuropatia após 25 anos de doença. Ainda que essa complicação seja apenas subclínica, em quase 100% dos casos as alterações eletrofisiológicas indicativas de neuropatia estão presentes. A dor da NDP tem intensidade moderada a grave e é descrita como formigamento, queimação ou sensação de agulhadas. É contínua e por vezes lacerante, localizada distal, bilateral e simetricamente, e pode cursar com alterações sensoriais anormais, como a alodinia ou hiperagelsia.

Cerca de 10% dos pacientes que desenvolvem neuropatia apresentam dor grave. A medicina tradicional dispõe de tratamento medicamentoso para a dor e a parestesia características da NDP, mas infelizmente o tratamento não é eficaz na sua totalidade, nem isento de efeitos colaterais, e muitas vezes o paciente só obtém alívio parcial dos sintomas.

O tratamento da dor é complexo, muitos fármacos como os antidepressivos tricíclicos, anticonvulsivantes, simpatomiméticos e agentes tópicos têm sido utilizados buscando melhora da funcionalidade nervosa e bloqueio da transmissão dos impulsos dolorosos, porém os resultados ainda são pouco satisfatórios. Associado a isso, os efeitos adversos dos diferentes fármacos motivam a busca por novas abordagens que possam contribuir no manejo adequado da dor, uma vez que interfere diretamente na qualidade de vida dos pacientes, levando-os frequentemente à incapacidade e invalidez.

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diabetes

Acupuntura e a neuropatia

A acupuntura tem sido usada há décadas para o tratamento da NDP e resultados positivos têm sido relatados, baseados na observação empírica e em alguns estudos-piloto. Entretanto, a eficácia da acupuntura ainda não está definida devido à escassez de ensaios clínicos de qualidade¹.

Recentemente (julho 2018) foi publicado um artigo sobre trabalho realizado na Coreia do Sul entre os anos de 2014 e 2016, quando foram selecionados 126 pacientes com NDP. Nesse trabalho, os pacientes foram divididos em dois grupos, com e sem tratamento com eletroacupuntura, e os resultados mostraram melhora significante nos sintomas dolorosos para o grupo tratado com eletroacupuntura. A avaliação dos resultados é limitada, pois não houve grupo tratado com placebo ou acupuntura “falsa”, logo efeito placebo não pode ser descartado. Ainda assim, o tratamento foi bem tolerado e seguro, e mais estudos se fazem necessários para embasar cientificamente o tratamento².

Tomando por base o banco de dados BVS/BIREME nos últimos 20 anos, conseguimos encontrar 12 artigos relacionados e publicados em inglês, cujo propósito foi verificar a eficácia da acupuntura no tratamento da NDP.
Bailey selecionou 25 pacientes para um estudo no qual foram tratados com acupuntura e obtiveram melhora significante nos níveis de dor, queimação, sensação de agulhadas e alodinia, mas a dor lancinante não diminuiu significativamente³.

Uma revisão feita por Chen analisando artigos publicados até 2013 não encontrou nenhum dado cientificamente relevante para indicar o tratamento4. Já havia sido feita uma revisão em 2012 por Bo com avaliação semelhante, ou seja, a qualidade dos trabalhos sobre acupuntura para o tratamento da NDP é considerada moderada a baixa5.

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Realmente, a realização de estudos randomizados, duplos cegos e placebo controlados é bem mais complicada quando se trata de acupuntura, dada a dificuldade de fazer uma acupuntura “falsa” e devido os efeitos gerais da acupuntura. De qualquer modo, autores ressaltam que, quando a acupuntura é usada de forma responsável, pode constituir uma opção terapêutica para os pacientes que não respondem ou sofrem com os efeitos colaterais do tratamento convencional6.

Um estudo piloto publicado em 2010 compara quarenta e dois casos de pacientes tratados com acupuntura verdadeira e vinte e um pacientes tratados com acupuntura falsa. Houve melhora significativa, após quinze dias de tratamento, da velocidade de condução nervosa e da função sensorial no grupo da acupuntura verdadeira, com alívio da dor e melhora da percepção de sensação térmica nos membros inferiores, assim como melhoraram alguns sintomas menores e subjetivos relacionados à NDP7.

Praticamente no mesmo período, outro grupo de pesquisadores comparou trinta e dois pacientes tratados com acupuntura e trinta e três casos tratados com inositol, encontrando diferença significativa e concluindo que o grupo tratado com acupuntura mostrou melhores resultados8.

Foi encontrado também um estudo objetivando verificar a eficácia da técnica de acupuntura chamada punho tornozelo no tratamento da NDP, e comparando grupos tratados com acupuntura sistêmica, com acupuntura punho tornozelo, e com alopatia (sem acupuntura). Conclui que a técnica punho tornozelo aumenta o metabolismo de glicose e lipídios, diminuindo a viscosidade do sangue nas áreas afetadas e restaurando a função das células nervosas periféricas, aliviando significativamente os sintomas. Ainda que tenha sido um estudo com um número pequeno de casos, os resultados são animadores, pois que esta técnica é de execução relativamente fácil, não demanda tempo prolongado a cada sessão e pode ser utilizada em pacientes que por algum outro motivo não podem ser submetidos à acupuntura sistêmica9.

Todos os dados encontrados sugerem que terapias não farmacológicas vem sendo utilizadas para o tratamento da NDP, e que a acupuntura é um tratamento complementar seguro e isento de complicações, embora seu mecanismo de ação permaneça explicado parcialmente apenas. Ainda falta um consenso sobre sua utilização em adição ao tratamento convencional. Muitos pacientes com dor de difícil controle, expostos ao tratamento, relataram melhora no padrão de sono, na sensação e redução do estresse, com impacto na qualidade de vida. Novos estudos com maior número de casos e de melhor qualidade são necessários para determinar a eficácia, tempo de tratamento e manutenção de resultados no acompanhamento dos pacientes com NDP.

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Referências:

  1. Meyer-Hamme et al. Acupuncture and laser acupuncture for treatment of Diabetic peripheral neuropathy: a randomized, placebo-controlled, partially double –blinded trial. BMC Neurology (2018) 18:40.
  2. Shin, K et al. Electroacupuncture for Painful Diabetic Peripheral Neurophaty: A Multicenter, Randomized, Assessor-Blinded, Controlled Trial. Diabetes Care 2018 Jul: dc181254.
  3. Bailey, A. et al. Acupuncture treatment of diabetic peripheral neurophaty in an American Indian community. J Acupunct Meridian Stud 2017; 10(2):90-95.
  4. Chen, W. et al. Manual acupuncture for treatment of diabetic peripheral neuropathy: a systematic review of randomizes controlled trials. PLos One; 8(9): e73764, 2013.
  5. Bo, C. et al. Assessing the quality of reports about randomized controlled trials of acupuncture treatment on diabetic peripheral neuropathy. PLos One; 7(7): e38461, 2012.
  6. Franco, L.C. et al. Terapias não farmacológicas no alívio da dor neuropática diabética: uma revisão bibliográfica. Acta paul. Enferm; 24(2): 284-288, 2011.
  7. Tong, Y. et al. Fifteen-day acupuncture treatment relieves diabetic peripheral neuropathy. J Tradit Chin Med: 3(2): 95-103, 2010 Jun.
  8. Zhang, C. et al. Clinical effects of acupuncture for diabetic peripheral neuropathy. J Tradit Chin Med; 30(1): 13-4, 2010 Mar.
  9. Jiang, H. et al. Clinical study on the wrist-ankle acupuncture treatment for 30 cases of diabetic peripheral neuritis. J Tradit Chin Med; 26(!): 8-12, 2006 Mar.

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