ADA 2023: Manejo de pacientes com DM1 e atividade física

O tema foi discutido na sessão “ask the expert” e abordou o manejo de atletas e pacientes com DM1 que praticam atividade física. Confira!

No primeiro dia de congresso da American Diabetes Association (ADA) 2023, um dos temas discutidos na sessão ask the expert foi o manejo de atletas e pacientes com DM1 que praticam atividade física. A medicina esportiva vem se desenvolvendo e cada vez mais vemos a possibilidade da inserção de indivíduos com diversas condições médicas crônicas dentro do mundo esportivo.

O diabetes (DM) pode ser uma situação particularmente desafiadora para o manejo, já que a resposta do metabolismo glicêmico ao exercício pode variar conforme o tipo  (exercício resistido ou aeróbico), intensidade, estado alimentar (jejum ou pós prandial), nível de competitividade, tempo de atividade, dentre outros. Ou seja: requer uma coordenação de diversos cuidados como o bom entendimento do que a modalidade praticada vai exigir e a condição em que o paciente se encontra. Por outro lado, o controle glicêmico pode afetar o desempenho do atleta, de forma aguda ou no momento da prática em si (como hipoglicemias, hiperglicemias graves e risco de cetoacidose) ou por meio de complicações crônicas, como retinopatia e neuropatia diabética.

ADA 2023: Semaglutida oral no controle da diabetes é tema do PIONNER PLUS

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FISIOLOGIA, METABOLISMO E PADRÕES DE TREINAMENTOS

Para iniciar a discussão sobre o tema, o Dr. Michael Riddel, PhD (York University) abordou conceitos gerais sobre o tema em atletas competitivos vivendo com DM1.

Além dos desafios já mencionados, o Dr Riddel, que recentemente publicou uma revisão sobre o tema na Nature Endocrine Reviews, ressaltou aspectos da diferente fisiologia de atletas com DM1. Em primeiro lugar, atletas com DM1 apresentam níveis de insulina muito maiores que atletas sem insulina uma vez que sua administração é subcutânea. Além disso, apresentam também maior dificuldade para oxidação de carboidratos, menor estoque hepático e muscular de glicogênio (o que torna os pacientes particularmente suscetíveis a hipoglicemia após a atividade física), além de uma possível menor recuperação muscular que atletas ou pessoas sem DM.

Um ponto interessante é que em dias de treinamento e de competição se comportam de formas diferentes, com menor risco de hipoglicemia e maior risco de hiperglicemia, provavelmente relacionados ao maior estresse, liberação de hormônios contrarreguladores e também maior VO2 nesses dias de competição. No entanto, é fundamental que sobretudo em dias de competição os atletas estejam com seus níveis glicêmicos ainda mais adequados. Em outro estudo do grupo do Dr Riddel (publicado na revista Diabetologia em 2020), é sugerido que em dias de competição o atleta atinja níveis de time in range próximos de 75%, às custas da redução de episódios de hipoglicemia para menos de 1%, com objetivo de segurança e manutenção da performance esportiva.

Ainda, de acordo com o palestrante, exercícios que atingem uma VO2 máxima acima de 80% tendem a gerar elevação da glicemia, enquanto atividades com VO2 menor ou próxima de 70% podem levar a uma queda da glicemia. A VO2 deve ser considerada de forma conjunta com a insulinemia – em estado pós prandial, devido à aplicação da insulina da refeição, o efeito final observado pode ser a atenuação da hiperglicemia gerada pelo exercício resistido, enquanto que quando um exercício resistido é realizado em jejum, a tendência maior é de hiperglicemia devido aos níveis estáveis e basais de insulina, que não aumentam em resposta à hiperglicemia como acontece num indivíduo sem DM1. O raciocínio oposto vale para o exercício aeróbico, desde que iniciado em uma faixa segura de glicemia.

ESTRATÉGIAS CLÍNICAS PARA SUPORTE DE PRATICANTES DE ATIVIDADE FÍSICA E ATLETAS COM DM1

A Dra Lori Laffel (Joslin Diabetes Center, instituição filiada à Harvard) trouxe insights sobre estratégias que podemos lançar mão para o adequado suporte de praticantes de atividade física com DM1. Trazemos aqui de forma didática:

1) Recomendações gerais sobre atividade física em pacientes com DM1
Em primeiro lugar, mesmo para não atletas, é importante lembrar que a atividade física traz diversos benefícios aos pacientes com DM, como melhora de resistência, força, equilíbrio, saúde óssea, controle glicêmico, complicações microvasculares, psicológicas e melhora de fatores de risco cardiovasculares. Portanto, devemos encorajar todos os pacientes sem contraindicações a praticar atividade física, idealmente 150 a 300 minutos por semana. Logo, algumas destas recomendações podem ser trazidas também para o contexto de pacientes que desejam praticar ou que já estão praticando atividade física e que tem dúvidas ou não realizam um preparo adequado para sua prática de forma segura.

2) Saber o tipo, duração e intensidade do exercício
Este é o ponto fundamental – diferentes tipos de exercícios levam a diferentes padrões de glicemia.
a) Exercícios anaeróbicos
– Exercícios com VO2 acima de 80% utilizam exclusivamente glicose como fonte de energia. Em pacientes sem DM, há aumento da liberação da insulina nesse momento, porém em pacientes com DM1, não.
– Recomendação prática: Pacientes que tem hiperglicemia relacionada ao exercício resistido podem se beneficiar da realização de exercícios aeróbicos antes de iniciar seu treino;
– O resfriamento passivo após o treino pode reduzir o risco de hiperglicemia por reduzir a liberação de hormônios contrarreguladores

b) Exercícios aeróbicos
– Exercícios mais demorados e com intensidade moderada (ex: corrida leve-moderada) tendem a levar um paciente, sobretudo se em hiperinsulinemia (no pós prandial) a hipoglicemia. Portanto, tais pacientes podem se beneficiar da prática de exercícios resistidos antes de iniciar o aeróbico.
– Sempre levar insulina e carboidratos, caso necessário o uso.

3) Iniciar a atividade física quando níveis de glicemia adequados
– Monitorar com CGM (Monitorização Contínua de Glicemia) ou aferir o dextro antes, durante e após a atividade física;
– Iniciar atividade idealmente com glicemia entre 90 e 180 mg;dL

4) Ajustar as doses de insulina
– Tanto em pacientes em uso de bomba de insulina como em pacientes utilizando múltiplas doses diárias (MDI), é fundamental termos cuidado tanto com a dose de insulina basal como na dose prandial.
Algumas recomendações práticas para pacientes que praticarão atividades aeróbicas:
– Reduzir 20% a dose da insulina basal; em pacientes que estão em uso de bomba, reduzir a taxa de infusão basal 1-2h antes do início da atividade física e 1h após
(reduzir em 50% a taxa de infusão)
– Reduzir a dose de bolus em 50% 2h antes e 2h após a atividade;
– Em pacientes que praticaram atividade pela tarde, reduzir a velocidade de infusão basal em 20% por até 6h.
– Em pacientes adultos com atividade que não estava planejada ou programada, orientar a suplementação de aproximadamente 0,5 a 1g de carboidrato a cada minuto de atividade realizada.

Perspectivas futuras

As perspectivas futuras são o uso de mais ferramentas tecnológicas para o auxílio na monitorização e tratamento. Nos últimos anos, diversos dispositivos “closed-loop” vem surgindo, que podem variar a taxa de infusão de insulina basal conforme o nível glicêmico, que pode sobretudo reduzir o risco de hipoglicemia em praticantes de atividade física e mesmo fazer uma correção mais segura para hiperglicemias. O uso dos CGMs também pode facilitar o manejo mesmo sem o uso de dispositivos de infusão, uma vez que nos revela tendências e fornece uma chance de intervenção mais precoce, seja para a correção de uma hiperglicemia ou de uma tendência a hipoglicemia.

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Reveja os estudos que foram destaques no ADA 2022 e ADA 2021.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Riddell MC, Peters AL. Exercise in adults with type 1 diabetes mellitus. Nat Rev Endocrinol. 2023 Feb;19(2):98-111. doi: 10.1038/s41574-022-00756-6. Epub 2022 Oct 31. PMID: 36316391.
  • Riddell MC, Scott SN, Fournier PA, Colberg SR, Gallen IW, Moser O, Stettler C, Yardley JE, Zaharieva DP, Adolfsson P, Bracken RM. The competitive athlete with type 1 diabetes. Diabetologia. 2020 Aug;63(8):1475-1490. doi: 10.1007/s00125-020-05183-8. Epub 2020 Jun 12. PMID: 32533229; PMCID: PMC7351823.

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