Os pacientes com anemias falciformes geralmente requerem um cuidado médico multidisciplinar ao longo da vida, incluindo monitoramento regular, tratamento da dor aguda e prevenção de complicações.
Neste episódio, a médica hematologista e conteudista do Whitebook, Lívia Coelho, aborda todo o panorama clínico desses pacientes.
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Fisiopatologia
A hemoglobina normal do adulto (hemoglobina A) é composta por duas cadeias de globina α e duas cadeias ß. Mutação no gene ß da globulina resulta na substituição do ácido glutâmico pela valina na posição 6, o que leva à formação da hemoglobina S. Quando em homozigose (SS), denomina-se anemia falciforme, porém a hemoglobina S pode se associar a outras hemoglobinas variantes (ex.: hemoglobinopatia SC, hemoglobinopatia Sß).
Anamnese
Quadro clínico:Indivíduos heterozigotos (traço) são assintomáticos, enquanto os portadores da doença (homozigotos) têm sintomatologia mais exuberante. As manifestações clínicas são decorrentes principalmente da hemólisee da vaso-oclusão causada pela hemoglobina S, que reduz a deformabilidade das hemácias, levando à maior adesão ao endotélio vascular, processo inflamatório local e ativação de mecanismos hemostáticos.
A principal consequência é a dor. Os pacientes podem ter episódios intermitentes de dor aguda, a qual pode cronificar com grande impacto negativo na qualidade de vida. Os sítios de dor são variáveis (ex.: costas, peito, extremidades, abdome).
A sintomatologia costuma surgir após 6 meses de vida, quando os níveis de hemoglobina fetalcaem. A gravidade da anemia, a frequência e intensidade dos episódios de vaso-oclusão e os órgãos acometidos variam entre os indivíduos acometidos. Infartos cerebrais silenciosos levam a prejuízo cognitivo.
Infartos esplênicosresultam em aspleniafuncional nos primeiros anos de vida, aumentando o risco de infecção por germes encapsulados. O fígado também pode sofrer infartos, com consequente disfunção hepática progressiva. Necrose papilar é uma manifestação renal comum, levando à isostenúria. O miocárdio é afetado pela anemia crônica e por microinfartos, além de haver risco de depósito de ferro nos pacientes politransfundidos.
Assim como nas demais anemias hemolíticascrônicas, os pacientes têm maior risco de colelitíase. Gestantes com anemia falciforme apresentam maiores taxas de abortamento espontâneoe descolamento de placenta, além de maior risco de recém-nascido prematuroe/ou com baixo peso.
Marcadores de gravidade:
- Crise aplásica por infecção pelo parvovírus B19;
- Sequestro esplênico;
- Isquemia ou infarto causados por obstrução da microvasculatura (crise vaso-oclusiva) – ex.: acidente vascular encefálico, síndrome torácica aguda, infarto agudo do miocárdio, complicações obstétricas, priapismo, infarto ósseo;
- Complicações crônicas (ex.: infecções secundárias à aspleniafuncional, necrose avascular da cabeça do fêmur, atraso de desenvolvimento, retinopatia, úlcera em membros inferiores, cardiomiopatia, colelitíase, sobrecarga de ferro, depressão, ansiedade, hipertensão pulmonar);
- Reações transfusionais(ex.: hiper-hemólise).
Fatores de risco:
- História familiar positiva.
Fatores de risco para crises vaso-oclusivas:
- Frio;
- Hipoxemia;
- Febre/ infecção;
- Desidratação e acidose;
- Estresse físico ou emocional;
- Abuso de álcool;
- Menstruação e gestação.
Exame Físico
Os principais achados relacionam-se à anemia hemolítica(ex.: taquicardia, palidez, icterícia). A ausculta cardíaca pode revelar sopro sistólico, dependendo do grau de anemia.
Alterações musculoesqueléticas podem ser observadas, em consequência de infartos ósseos, hiperplasia medular compensatória, osteomielitee/ou defeitos de crescimento.
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