Recompensação hepática após abstinência de álcool e sobrevida de cirróticos 

O consumo excessivo de álcool e a doença hepática relacionada ao álcool estão entre as principais causas de morbimortalidade relacionadas ao fígado em todo o mundo.

Pacientes que evoluem para cirrose hepática etanoica frequentemente apresentam descompensação hepática, a qual está associada a um aumento significativo da mortalidade. A remoção ou tratamento do fator causal da doença hepática crônica avançada permite a restauração da função hepática, muitas vezes com recompensação do quadro. Hofer e colaboradores avaliaram os benefícios clínicos associados à obtenção da recompensação hepática pelos critérios de Baveno VII em pacientes com cirrose descompensada relacionada ao álcool. 

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Recompensação hepática após abstinência de álcool e sobrevida de cirróticos 

Metodologia  

Trata-se de estudo observacional unicêntrico, que incluiu pacientes com doença hepática crônica avançada descompensada de etiologia etanólica submetidos a medida basal do gradiente de pressão venosa hepática na Universidade de Viena entre janeiro de 2004 e dezembro de 2020. Após a avaliação inicial do gradiente pressórico, pacientes em abstinência alcoólica foram acompanhados a cada 3 meses no ambulatório de hepatologia da Universidade de Viena. Posteriormente, todos os pacientes foram avaliados retrospectivamente quanto a recompensação hepática definida pelos critérios de Baveno VII: (i) a remoção da etiologia subjacente (ou seja, abstinência persistente de álcool), (ii) resolução de ascite e encefalopatia hepática, definida por descontinuação de diuréticos e de tratamento específico para encefalopatia, (iii) nenhum sangramento varicoso nos últimos 12 meses e (iv) melhora sustentada na função bioquímica do fígado (albumina, bilirrubina e INR). 

A aderência à abstinência alcoólica ao longo do estudo foi avaliada em todas as consultas ambulatoriais por médicos hepatologistas com base em dados clínicos e laboratoriais, bem como informações fornecidas pelos próprios pacientes e seus familiares. Análises laboratoriais incluíram a dinâmica da gama-glutamiltransferase (GGT) e do volume corpuscular médio das hemácias. 

Resultados 

Foram incluídos 204 pacientes, sendo 75% homens, com mediana de idade de 57 anos. O gradiente de pressão venosa hepática mediano foi de 20 mmHg, sendo que 56,9% dos pacientes apresentavam valores basais superiores a 20 mmHg. Ao longo do estudo, 37 pacientes (18,1%) evoluíram com recompensação hepática de acordo com os critérios de Baveno VII. A incidência cumulativa de recompensação hepática foi de 9,0% em um ano, 16,3% em dois anos e 17,7% em três anos. Ao início do estudo, os pacientes que recompensaram durante o acompanhamento apresentavam escore de CHILD-PUGH (7 [6–9] vs. 8 [7-10]) e gradiente de pressão venosa hepática (19 [17–21] versus 21 [18–24] mmHg) significativamente menores, além de uma pressão arterial média mais alta (101 [94-108] versus 94 [86–104] mmHg). 

Os pacientes foram acompanhados por uma média de 24,4 (10,9–50,4) meses. No geral, 62 pacientes (30,4%) morreram durante o acompanhamento. Dessas mortes, 52 (83,9%) e 10 (16,1%) foram classificadas como relacionadas ao fígado e não relacionadas ao fígado, respectivamente. Transplante hepático foi realizado em 29 pacientes (14,2%). A recompensação hepática foi associada a uma redução de 91% no risco de morte relacionada ao fígado (aHR: 0,091 [IC 95%: 0,012–0,677]; p= 0,019), bem como a uma redução de 78% no risco de morte por todas as causas (aHR: 0,220 [IC 95%: 0,066–0,735]; p= 0,014). Um novo episódio de descompensação hepática ocorreu em 3 pacientes (8,1%) que já haviam alcançado a recompensação hepática e permaneceram abstinentes.  

Treze pacientes (6,4%) foram diagnosticados com carcinoma hepatocelular (CHC) durante o período de acompanhamento. O CHC ocorreu em dois pacientes recompensados (5,4%) em comparação com 11 pacientes descompensados (6,6%). Apesar da tendência de redução do risco de desenvolvimento de CHC em pacientes recompensados, esse achado não alcançou significância estatística (HR: 0,398 [IC 95%: 0,084– 1,878]; p= 0,245).  

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Mensagens práticas sobre recompensação hepática

A abstinência de álcool levou à recompensação hepática em aproximadamente um quinto dos pacientes com cirrose alcoólica descompensada. Alcançar a recompensação hepática resultou em uma redução acima de 90% na mortalidade relacionada ao fígado, sendo um importante fator prognóstico. Pacientes recompensados permaneceram em risco de desenvolvimento de CHC, o que destaca a importância dos programas de rastreamento em pacientes com cirrose, mesmo após a recompensação. A cirrose hepática etanólica descompensada é associada a alta mortalidade. 

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Hofer BS, Simbrunner B, Hartl L, Jachs M, Balcar L, Paternostro R, Schwabl P, Semmler G, Scheiner B, Trauner M, Mandorfer M, Reiberger T. Hepatic recompensation according to Baveno VII criteria is linked to a significant survival benefit in decompensated alcohol-related cirrhosis. Liver Int. 2023 Jul 20. DOI: 10.1111/liv.15676

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