Mielomas múltiplos: Lenalidomida até progressão de doença ou TMO? Qual a melhor abordagem?

Um estudo a manutenção com lenalidomida até progressão de doença no tratamento de mielomas múltiplos. Saiba mais.

O mieloma múltiplo é uma doença clonal de plasmócitos que acomete principalmente indivíduos a partir da sexta década de vida. O tratamento de primeira linha continua evoluindo para os pacientes com a doença recentemente diagnosticada. O estudo IFM 2009 trouxe resultados interessantes que favoreciam a terapia tríplice com bortezomib, dexametasona e lenalidomida (VRD) seguidos por transplante de medula óssea autólogo (TMO auto) e manutenção pós-TMO com lenalidomida por um ano, conferindo maior sobrevida livre de progressão para este grupo quando comparado a VRD isoladamente. O estudo DETERMINATION, publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) em junho deste ano de 2022, inicialmente desenvolvido em paralelo ao trabalho anteriormente mencionado, avaliou um grupo muito semelhante de pacientes, porém sob uma nova ótica: a manutenção com lenalidomida até progressão de doença.  

Desenho do estudo

 Trata-se de um ensaio clínico randomizado, open-label, fase 3, com recrutamento de participantes com diagnóstico de mieloma múltiplo clássico em 56 centros nos Estados Unidos entre 2010 e 2018. Os participantes deveriam ter entre 18 e 65 anos e uma pontuação entre 0 e 2 na ECOG scale. Pacientes com disfunções orgânicas graves, que realizaram tratamento prévio, com amiloidose sistêmica, invasão de sistema nervoso central foram excluídos. A randomização foi feita 1:1 da seguinte maneira: 

  1.  Braço intervenção: um ciclo de VRD -> Randomização -> dois ciclos de VRD -> TMO auto -> dois ciclos adicionais de VRD -> lenalidomida de manutenção
  2. Braço controle: 01 ciclo de VRD -> Randomização -> dois ciclos de VRD -> Mobilização e coleta de células tronco sem TMO -> cinco ciclos adicionais de VRD -> lenalidomida de manutenção

Importante destacar que ambos os braços foram submetidos à mobilização e coleta de células CD34+ em sangue periférico. No entanto, apenas o braço intervenção foi submetido a melfalano em altas doses e encaminhado para TMO. 

Os braços estavam bem balanceados nos quesitos: alterações citogenéticas de alto risco, pontuação na escala International Staging System (ISS). 

Nos casos de recaída ou refratariedade de doença, a segunda linha foi decidida a critério do médico assistente e do paciente e familiares (podendo incluir TMO autólogo). Os critérios do International Myeloma Working Group (IMWG)foram usados para definir resposta ou não resposta.  

O desfecho primário escolhido foi sobrevida livre de progressão (SLP). Como desfechos secundários tivemos taxas de resposta, duração de resposta, tempo para progressão de doença, sobrevida global, qualidade de vida (questionário EORTC QLQ-C30) e efeitos adversos.  

A análise primária foi feita por intenção de tratar e as perdas de follow-up foram menores de 10%.

Resultados observados e discussões apresentadas

A mediana de idade foi de 57 anos no grupo VRD e 55 anos no grupo VRD + TMO auto. Em uma mediana de follow-up de 76 meses, o risco de progressão de doença ou morte foi 56% maior no grupo submetido apenas a VRD, sem TMO auto, com um HR de 1.53 (95% Intervalo de confiança [IC], 1.23 to 1.91; P<0.001). A mediana de tempo de SLP foi de 46,2 meses para o grupo controle e de 67,5 meses para o braço intervenção. A sobrevida global (SG) em cinco anos foi de 79,2% e 80,7%, respectivamente. As taxas de resposta foram semelhantes apesar da duração das mesmas ser significativamente maior no grupo VRD + TMO auto (38,9 meses x 56,4 meses). Eventos adversos graduados como grau 3 ou superior foram mais frequentes no grupo intervenção (78,2% vs 94,2%). Quando avaliada qualidade de vida, os resultados foram transitoriamente desfavoráveis para o braço TMO, no entanto, os autores advogam que a grande maioria dos eventos adversos e que também impactaram na qualidade de vida dos pacientes foi transitória e, associado a isso, foi observado um efeito rebote. Vamos explicar: em análises interim realizadas no período pós-TMO, os pacientes submetidos a essa intervenção, apesar de terem enfrentado eventos adversos mais intensos, respondiam estar melhores do que antes nessas abordagens posteriores. Interessante notar que, proporcionalmente, o número de mortes que ocorreram em pacientes sem progressão diagnosticada foi de 0,5% no grupo VRD e 7,9% no grupo VRD + TMO auto. Ainda, após a conclusão do estudo, o número de mortes relacionadas ao tratamento foi de 0,4% (1 evento) no grupo VRD e 1,4% (cinco eventos) no grupo VRD + TMO auto. Infelizmente esse dado foi pouco abordado na discussão do artigo.

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Conclusão

Os dados apresentados no DETERMINATION vão ao encontro dos dados apresentados no IFM 2009, mostrando melhor SLP nos pacientes submetidos à consolidação com TMO autólogo. Ainda, foi observado um período de 20,2 meses a mais de SLP no presente estudo no grupo intervenção, o que foi atribuído ao uso de lenalidomida de manutenção até progressão ou intolerância/toxicidade. Infelizmente não tivemos análise de subgrupo pois o estudo não apresentava força estatística suficiente. Levando em consideração os dados sobre toxicidade e mortalidade aliados aos crescentes dados observados abordando o benefício de negativar a doença residual mensurável, acredito que a opção de consolidar o tratamento com TMO autólogo na era das novas drogas deva ser considerada caso-a-caso, principalmente se os anticorpos monoclonais forem utilizados em uma terapia quádrupla. Os pacientes de maior risco citogenético, mais jovens e com DRM positiva ao final da indução parecem ser os que mais se beneficiariam da consolidação com TMO apesar de tal recomendação ainda não estar definida em literatura.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Richardson PG, Jacobus SJ, Weller EA, et al. Triplet Therapy, Transplantation, and Maintenance until Progression in Myeloma. N Engl J Med. 2022;387(2):132-147. doi:10.1056/NEJMoa2204925 

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