Neobrain Brasil 2019: hipotermia terapêutica em neonatologia

O dr. Guilherme Sant’Anna (McGill University, Montreal, Canadá) falou sobre as recomendações para hipotermia terapêutica (HT) em neonatologia.

No Neobrain Brasil 2019, o dr. Guilherme Sant’Anna (McGill University, Montreal, Canadá) falou sobre as recomendações para hipotermia terapêutica (HT) em neonatologia. Seguem os principais tópicos abordados pelo especialista.

Sobre a HT:

  • A HT deve ser realizada em recém-nascidos (RN) que preencham os critérios de inclusão e todos os hospitais devem estar atentos a possíveis candidatos;
  • A HT deve ser realizada em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) com: conhecimento, equipamento, equipe com treinamento adequado e protocolos específicos (“centros de hipotermia”).

Os centros de hipotermia devem ser capacitados para oferecer:

  • Monitorização dos sinais vitais (incluindo temperatura e gasometria);
  • Ventilação mecânica (VM);
  • Capacidade de detectar convulsões [monitorização de eletroencefalograma (EEG) ou eletroencefalograma de amplitude integrada (aEEG)];
  • Neurologia pediátrica;
  • Neuroimagem [incluindo ultrassonografia transfontanela (USTF) e ressonância magnética (RM)];
  • Seguimento em longo prazo dessas crianças.

A monitoração deve ser rigorosa:

  1. Monitor cardíaco, pressão arterial invasiva (PAI), saturação arterial de oxigênio (SatO2) e aEEG no leito;
  2. A temperatura do cobertor, da pele e do esôfago/retal precisam ser registradas a cada hora nas primeiras 12 horas de HT;
  3. Após esse período, devem ser registradas a cada duas horas;
  4. Os sinais vitais devem ser aferidos a cada 15 minutos nas primeiras quatro horas, a cada hora nas oito horas seguintes e a cada duas horas até o período de resfriamento.

Em relação aos exames laboratoriais: glicose, ureia, creatinina, cálcio, magnésio, transaminases hepáticas e eletrólitos devem ser dosados no momento da admissão e a cada 24 horas.

Sobre hiponatremia: RN em HT apresentam risco elevado de hiponatremia dilucional, secundária a excesso de líquidos e/ou lesão renal e/ou síndrome de secreção inapropriada de hormônio antidiurético (SIHAD), cujo diagnóstico é bastante difícil. Portanto, a recomendação é que o balanço hídrico (BH) seja mantido adequado, monitorando a diurese e evitando a utilização de sódio nas primeiras 24 horas de vida do bebê. No BH, devem ser anotados, rigorosamente, a infusão e a perda de fluidos: todos os bolus e todas as transfusões devem ser computadas no total de líquidos administrados no RN por dia.

Suporte ventilatório invasivo: os RN em HT podem ser submetidos a suporte ventilatório invasivo ou não. Dr. Guilherme referiu, inclusive, que a maioria dos neonatos na UTIN onde trabalha, em Montreal, está extubada. Além disso, o resfriamento não é indicação de intubação e a VM e não é contraindicação de extubação. A extubação deve ser facilitada em RN que respiram espontaneamente em VM.

Suporte ventilatório: o objetivo do suporte ventilatório é manter valores normais de gasometria corrigidos para a temperatura do paciente: pH 7,35-7,45; pCO2 35-45 mmHg, pO2 pré-ductal 50-80 mmHg e SatO2 91-95%.

Ventilação mecânica: a VM deve ser indicada em RN com quedas repetidas de SatO2, associadas ou não a crises convulsivas. Outras indicações são: insuficiência respiratória com aumento das necessidades de oxigênio (O2) e/ou acidose respiratória.

Gasometrias: devem ser colhidas na admissão e, após, a cada quatro a seis horas nas primeiras 24 horas. A necessidade de gasometrias extras deve ser reavaliada de acordo com as necessidades de cada bebê. As gasometrias devem ser corrigidas para a temperatura corporal (TC): à medida em que a TC diminui, a solubilidades dos gases sanguíneos arteriais aumenta. Dessa forma, pO2 e pCO2 diminuem e o pH aumenta. Portanto, deve ser utilizado o pH-stat, em que os resultados da gasometria são corrigidos para a TC do RN.

Hiperventilação: deve ser evitada em RN com encefalopatia hipóxico-isquêmica (EHI) moderada ou grave, pelo risco de se fazer hipocapnia. A hipocapnia pode ser um marcador de lesão cerebral: existem estudos associando hipocapnia com lesão cerebral e problemas de desenvolvimento em neonatos com EHI moderada ou grave.

Bicarbonato de sódio: o uso de bicarbonato deve ser evitado em RN com acidose metabólica. Os esforços devem ser concentrados na compreensão e no tratamento da causa ou das causas subjacentes da acidose. A utilização de bicarbonato está associada a possíveis efeitos adversos, como flutuações no fluxo sanguíneo cerebral; hemorragia intracraniana; entrega reduzida de O2 aos tecidos, piorando a acidose intracelular; agravamento da lesão miocárdica e deterioração da função cardíaca.

Hemograma: deve ser colhido na admissão e, após, com 24 horas de vida. Depois desse período, deve ser colhido somente quando necessário. É de extrema importância manter a contagem de plaquetas igual ou superior a 100.000.

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PT/PTT: devem ser colhidos na admissão. Após, somente se houver necessidade ou na presença de sangramento. Deve-se checar se os resultados de coagulação foram corrigidos para a presença de heparina (heparina absorb) antes de tratar.

Glicemia: tanto hipoglicemia quanto hiperglicemia devem ser evitadas.

Insuficiência renal: o rim é um dos órgãos mais frequentemente afetados em neonatos com asfixia, portanto estes bebês são bastante propensos a desenvolver insuficiência renal aguda (IRA). A diurese deve ser mensurada com uma bolsa coletora de urina ou cateter vesical de demora (nesse caso, atenção pois pode aumentar o risco de infecção ascendente do trato urinário). Oligúria (diurese inferior a 1,0 mL/kg/h) ou anúria indicam IRA incipiente. No entanto, 60% dos neonatos com IRA depois de uma asfixia grave apresentam débito urinário normal.

Resfriamento: o resfriamento diminui as perdas insensíveis.

Taxa hídrica: a taxa hídrica total (THT) a ser administrada deve estar em torno de 40 a 60 mL/kg/dia. THT mais baixas devem ser aplicadas em RN mais graves com alto risco de IRA e/ou naqueles bebês que receberam bolus no hospital de referência e que apresentam BH muito positivo. A THT deve ser reajustada a cada seis a 12 horas, de acordo com o BH. O BH positivo deve ser evitado tanto quanto possível, assim como a desidratação, pois pode aumentar ainda mais a lesão renal. A perda fisiológica de peso entre 10 a 15% deve ser aceitada.

Avaliação multidisciplinar:

  • Sempre deve ser solicitada avaliação da Cardiologia Pediátrica nas seguintes situações: instabilidade hemodinâmica, necessidade de aminas vasoativas e/ou na suspeita de hipertensão pulmonar;
  • O exame neurológico deve ser registrado em folhas apropriadas, na admissão e diariamente nos primeiros quatro dias. A persistência de EHI grave com 72 horas e o exame neurológico anormal na alta estão associados a um maior risco de morte ou incapacidade aos 18 meses;
  • A ultrassonografia transfontanela (USTF) deve ser realizada imediatamente após o nascimento, para avaliar: anormalidades estruturais cerebrais congênitas, lesão cerebral fetal, hipoplasia de corpo caloso (hiperglicemia não cetótica), cistos na matriz germinal (distúrbios mitocondriais ou peroxissômicos) e ecogenicidade grave da substância branca (deficiência de molibdênio). Uma maior ecogenicidade da substância branca observada no dia do nascimento sugere início pré-natal da encefalopatia neonatal;
  • Hemorragias talâmicas associadas a uma hemorragia intraventricular podem ser causadas por trombose do sistema venoso profundo. Alterações no fluxo sanguíneo cerebral podem ser observadas usando Doppler;
  • Todos os RN tratados com HT devem ser seguidos em clínica especializada multidisciplinar até os dois anos de idade.

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