Prevenção do suicídio em adolescentes na atenção primária à saúde

O suicídio em adolescentes é um fenômeno que alcançou grandes proporções. Como frear esse alarmante problema de saúde pública?

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O comportamento suicida em adolescentes é um fenômeno que alcança cada vez maior posição de destaque nos dias atuais. Pais, profissionais que atuam com adolescentes, sejam da área da educação ou da saúde, e a sociedade como um todo tenta entender melhor como prevenir, ou ao menos, reduzir o impacto do suicídio, esse alarmante problema de saúde pública. 

Dados do Ministério da Saúde (2017) indicam que a população entre 10-19 anos representa de 17 a 24% das tentativas de suicídio perpetradas em todas as idades. Embora a mortalidade nessa faixa etária não seja a mais alta, o número preocupa. Isso acontece porque acredita-se que esses dados sejam subestimados, e não levam em consideração outros comportamentos suicidas, como a ideação e os comportamentos autolesivos, popularmente conhecidos como automutilações.  

O profissional da atenção primária tem uma importância fundamental em medidas preventivas para o suicídio, nessa faixa etária (e em outras também). Como se encontram na porta de entrada do sistema de saúde, o Médico de Família e Comunidade e/ou o Pediatra passam muitas vezes a ser a primeira oportunidade de rastreio do adolescente em sofrimento psíquico. 

Leia mais: Setembro Amarelo: cuidados na prevenção do suicídio

Muitas vezes, é esse profissional que vai ter o primeiro, e porque não, o único olhar para aquela questão que passou despercebida pela família e pela escola. Esse profissional também pode servir para o adolescente como uma referência adulta fora do contexto escolar, que pode ser procurado em situações de crise. Além disso, é o profissional que habitualmente irá triar e encaminhar os pacientes que necessitam de atendimento com médico especialista. 

É fundamental, portanto, que os profissionais da APS estejam alertas e orientados para os fatores de risco do suicídio em adolescentes e preparados para atuar em medidas de prevenção. 

Segue abaixo uma breve orientação em relação a esses fatores.

Sexo

O sexo é um fator relevante ao se realizar a avaliação do suicídio na adolescência. Meninas apresentam maior número de tentativas que os meninos. Entretanto, esses apresentam taxas de mortalidade mais altas, uma vez que os métodos utilizados costumam ser mais agressivos.

Tentativas prévias de suicídio

Existem inúmeros fatores de risco para o comportamento suicida. Um dos mais importantes é a presença de tentativas prévias de suicídio. Portanto, sempre olhar esses pacientes com mais cuidado, uma vez que esse comportamento intui que existe um comportamento mais direcionado para o planejamento e execução do ato.

Depressão

Os transtornos psiquiátricos estão fortemente relacionados ao ato suicida. Dentre os transtornos, o mais comumente relacionado é a depressão. É muito importante a observação do comportamento do adolescente, tanto no momento da consulta, quanto em seu convívio com família e amigos e na escola. Os indícios de depressão em adolescentes diferem daqueles vistos em adultos, e nem sempre a tristeza intensa é descrita por eles. Tédio (“a todo o tempo”), a irritabilidade / agressividade, queda do rendimento escolar e transtornos de conduta podem ser indícios de um adolescente deprimido e com maior risco para o suicídio.

Acesso à arma de fogo ou outros meios de lesão intencional

É extremamente importante que o médico da APS questione ativamente sobre o acesso do adolescente a armas de fogo. Embora o porte de arma de fogo não seja liberado extensivamente no Brasil, muitos adolescentes vêm de famílias onde um de seus membros tem permissão para o porte, ou mesmo, estão em locais onde o acesso é feito a armas não registradas. Estima-se que a limitação do acesso a esses dispositivos seja uma das melhores estratégias para a prevenção. Portanto, a orientação de pais e cuidadores de como armazenar de forma adequada suas armas, se for o caso, é fundamental.

Uso de drogas ilícitas

O consumo de substâncias lícitas e/ou ilícitas está intimamente relacionado a atos suicidas, seja por indicar uma maneira de se “automedicar” para se livrar da dor emocional, seja porque a intoxicação aumenta a impulsividade e retirar os mecanismos de controle emocional do adolescente.

Eventos de estresse agudo

Muitas tentativas de suicídio ocorrem após algum evento de estresse agudo, seja no ambiente familiar, escolar ou outros. Importante ensinar maneiras de lidar com essas situações, além de estabelecer pessoas e locais seguros, para que o adolescente possa ajustar seus sentimentos e se reorganizar.

Conectividade escolar e familiar

Diversos estudos demonstram a importância da conectividade escolar e familiar na vida dos adolescentes. Existem algumas definições de conectividade, mas a maior parte dessas definições se relaciona ao sentimento que o adolescente tem de pertencimento e aceitação naquele local. Dessa forma, estimular o contato familiar intenso, orientar a família sobre maneiras de potencializar esses sentimentos e ajudar a resolver conflitos familiares são medidas que podem contribuir para o aumento da conectividade familiar.

Da mesma forma, se o médico da APS conseguir abertura dentro do contexto escolar, tentar abordar formas de gerenciamentos de conflitos com o paciente e seus amigos. Também é importante convidar professores e outros profissionais da escola a melhorar a aceitação e o pertencimento desse paciente ao grupo e tentar avaliar e amenizar situações de bullying e assédio pode ser de fundamental importância para o adolescente. Não se esquecer de sempre perguntar ao adolescente e sua família a respeito da dinâmica familiar e escolar, tentando perceber que nem sempre o que importa é o que é dito explicitamente.

Encaminhamento para profissionais especializados

Nem todos os adolescentes em sofrimento psíquico devem necessariamente ser encaminhados para profissionais de saúde especializados. Muitas vezes o aprendizado de técnicas de controle emocional, de lidar com situações difíceis e de melhoria da autoconfiança pode colaborar para amenizar tais situações. Porém, sempre atentar para pacientes que apresentem fatores de risco importantes, como tentativas prévias de suicídio, presença de transtornos psiquiátricos subjacentes e abuso de substâncias, que podem necessitar de uma avaliação e um tratamento mais individualizado.

 

Referências:

  • Perfil Epidemiológico das tentativas e óbitos por suicídio no Brasil e a rede de atenção à saúde. Boletim Epidemiológico – Volume 48 – N° 30 – 2017.
  • Taliaferro LA, Oberstar JV, Borowsky IW. Prevention of youth suicide: the role of the primary care physician. JCOM, v. 9, p. 270-83, 2012.
  • Steiner RJ, et al. Adolescent Connectedness and Adult Health Outcomes. Pediatrics, p. e20183766, 2019.

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