Relação entre duração do sono materno e infantil nos primeiros 2 anos do bebê

Embora a privação de sono seja esperada na parentalidade, baixos níveis de sono materno estão associados negativamente com estresse parental.

O sono é um aspecto crítico do desenvolvimento da primeira infância e é assunto que gera muita discussão nos dias de hoje. Um sono infantil de qualidade tem sido associado a melhores desfechos na saúde física, desenvolvimento cognitivo e psicossocial da criança. O sono materno também representa grande desafio nessa caminhada.

Embora a privação de sono seja esperada na parentalidade, baixos níveis de sono materno estão associados negativamente com estresse parental, depressão materna e declínio na satisfação conjugal. Essas condições podem, infelizmente, ter um impacto negativo na qualidade de vida da criança, da mãe e de toda a família.  

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Um estudo recente e muito interessante conduzido na University of Illinois Urbana-Champaign analisa justamente os padrões de sono materno e infantil, identificando preditores e fornecendo recomendações para incutir hábitos saudáveis no binômio. O artigo The Relationship Between Maternal and Infant Sleep Duration Across the First Two Years, de Cai e colaboradores (2023), foi publicado no periódico Journal of Developmental & Behavioral Pediatrics  e encontra-se sintetizado a seguir. 

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Metodologia 

Pais de 464 bebês do estudo prévio STRONG Kids 2 relataram a duração do sono noturno de seus próprios bebês e outras informações (como amamentação) aos 3, 12, 18 e 24 meses após o parto. O STRONG Kids 2 é um programa da própria University of Illinois Urbana-Champaign que promove a alimentação e hábitos saudáveis em famílias com crianças pequenas.  

Os critérios para exclusão de participantes foram: parto prematuro (idade gestacional inferior a 37 semanas), condições de nascimento que impediam a alimentação normal (por exemplo, fenda palatina, síndrome de Down) e baixo peso ao nascer (2,5 kg).  

O primeiro objetivo foi determinar como a duração do sono mãe-bebê está relacionada nos primeiros dois anos de vida da criança. O segundo objetivo foi determinar se essas relações mudam ao longo desses dois. Já o terceiro objetivo foi entender preditores demográficos e de saúde da relação entre sono materno e infantil. Os dados foram coletados entre setembro de 2013 e julho de 2019. 

Resultados 

Os pesquisadores descreveram que houve dois perfis de sono mãe-bebê de 3 a 24 meses (lembrando que as diretrizes de sono nos Estados Unidos recomendam o sono materno entre 7 e 8 horas por noite):                                                             

  • O padrão de baixo sono materno (PBSM) foi caracterizado por menor duração do sono materno do que a quantidade recomendada e menor duração do sono infantil: as mães que se enquadraram nesse perfil tiveram uma média de 5,74 horas de sono por noite aos 3 meses e 5,9 horas aos 12 a 24 meses. Seus filhos tiveram 9,6 e 10,52 horas, respectivamente; 
  • O padrão médio de sono materno (PMSM) foi caracterizado pela duração média do sono materno atendendo ao padrão recomendado e duração média do sono infantil: nesse perfil, as mães tiveram 7,31 horas aos 3 meses e 7,28 horas aos 12 aos 24 meses. Seus filhos tiveram uma média de 9,99 horas e 11 horas, respectivamente.  

Aproximadamente, metade das mães que começaram no perfil PBSM fizeram a transição para o perfil PMSM após 12 meses depois do parto, quando os perfis de sono se estabilizaram, com transições limitadas entre 12 e 24 meses. Mais despertares noturnos sinalizados pelo bebê, horas de dormir mais tardias, mais problemas de sono do bebê e mais amamentação exclusiva foram preditores para estar no perfil PBSM. 

 Conclusão 

Os pesquisadores concluíram que, no geral, os resultados sugerem dois perfis de sono mãe-bebê: PBSM e PMBM, de modo que as mães no perfil PBSM relataram sono significativamente menor e abaixo das diretrizes atuais de sono recomendadas nos Estados Unidos Além disso, os perfis de sono mãe-bebê se estabilizaram depois de 12 meses do pós-parto, sugerindo a necessidade de programas para remover barreiras à higiene saudável do sono (por exemplo, estresse financeiro, horas de trabalho exigentes) e ajudar as famílias a estabelecer uma rotina de sono saudável logo após os três meses de idade da criança.

Dados da literatura anteriores a esse estudo enfatizaram a importância de estabelecer rotinas para dormir a partir dos três meses de idade do bebê. Os profissionais de saúde podem desempenhar um papel fundamental na discussão da importância dos hábitos de sono materno e infantil para beneficiar toda a família, levando em consideração as diferenças individuais no temperamento da criança e as características maternas, como depressão e estresse.   

Comentários 

Diariamente, na minha prática (hospitalar e no consultório) me deparo com pais que se queixam da privação de sono com a parentalidade. De fato, nos primeiros três meses de vida, o bebê demanda muito e a mãe precisa ser preparada para essa etapa com muito carinho (vejo esse como um dos grandes motivos para que as gestantes façam consulta de pré-natal com o pediatra no terceiro trimestre de gestação).                                                                       

Concordo com os pesquisadores sobre a instituição de rotinas de sono logo aos três meses de vida do bebê, pois antes disso, a produção de melatonina ainda é muito irregular e o bebê ainda demanda muito na amamentação. Antes de completar três meses, no entanto, é extremamente relevante o apoio à mulher recém-mãe com seu recém-nascido, ambos se adaptando a uma nova realidade.

A rede de apoio é essencial e o pai não deve ser visto como parte dela: pai é pai e deve estar, sim, presente nos cuidados com a criança quando a mãe precisar descansar e se alimentar. Destaco também o papel do pediatra: acolher essa mãe e fornecer todas as informações que ela necessita para se sentir menos sobrecarregada. 

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Por fim, o estudo comenta sobre a amamentação exclusiva ser um dos preditores para a mãe se enquadrar no perfil PBSM. Sim, de fato, a criança que mama peito exclusivamente demanda muito, em especial nas madrugadas e no primeiro mês de vida. Quando a mãe quer amamentar, a privação de sono nesse início pode ser contornada com explicações à família sobre o fato de isso ser uma fase do bebê e que passa (conforme o bebê cresce, além de ele estar mais “treinado” para amamentar, seu estômago cresce, tornando as mamadas menos frequentes).

Além disso, entra aí o papel do pai ou de um membro da rede de apoio para auxiliar a mãe num momento de muitas alterações hormonais e fragilidade.  

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • CAI, Tianying et al. The Relationship Between Maternal and Infant Sleep Duration Across the First Two Years [published online ahead of print, 2023 Jun 5]. J Dev Behav Pediatr., DOI: 10.1097/DBP.0000000000001195, 2023