Troponina aumentada e piores desfechos na estenose aórtica (EA) assintomática

Estudo mostrou que a maioria dos pacientes com estenose aórtica (EA) assintomática tem níveis de troponina normais, independente da gravidade da EA.

Estenose aórtica (EA) degenerativa é doença cada vez mais prevalente na população maior que 65 anos e até 75% desses pacientes têm doença arterial coronariana (DAC) concomitante. Muitas vezes é difícil identificar se a ocorrência de sintomas de angina ou insuficiência cardíaca é secundaria a progressão de EA ou DAC.

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A troponina ultrassensível é um marcador de isquemia e injuria miocárdica decorrente de sobrecarga pressórica e alguns estudos já tentaram avaliar sua utilização como marcador de progressão de doença e necessidade de troca valvar aórtica, porém atualmente não há recomendação de utilizá-la para monitorar pacientes com EA. Também não há definição sobre quais valores de troponina esperar de pacientes estáveis com EA não grave assintomática, assim como se seus valores aumentados se relacionam com a EA ou DAC.

Baseado nisso foi feita uma análise post-hoc do estudo SEAS no intuito de avaliar quais características dos pacientes estão associadas a níveis de troponina aumentados, se há mudanças nos valores no seguimento de 1 ano e se os valores de base têm relação com desfechos clínicos adversos.

e piores desfechos na estenose aórtica assintomática

Métodos do estudo e população envolvida

O estudo SEAS foi um grande estudo randomizado que avaliou o efeito do tratamento hipolipemiante em 1873 pacientes com EA assintomática, função sistólica preservada e ausência de DAC. Foi estudo multicêntrico, cego, placebo controlado que testou sinvastatina 40 mg associado à ezetimibe 10 mg nestes pacientes.

Foram incluídos 1.873 pacientes entre 2003 e 2004, com idade entre 45 e 85 anos, fração de ejeção (FE) do ventrículo esquerdo (VE) normal e velocidade máxima trans-aórtica (Vmax) no ecocardiograma entre 2,5 e 4,0 m/s. Critérios de exclusão eram DAC, diabetes e/ou indicação de medicação hipolipemiante.

A análise post-hoc avaliou a associação da concentração de troponina T ultra-sensível basal com a gravidade da EA e desfechos cardiovasculares em um seguimento de 5 anos, além de se a concentração de troponina permanecia estável durante o primeiro ano de seguimento.

Havia 1.739 pacientes com dosagem de troponina basal, porém 125 desses não tinham a dosagem em 1 ano. O corte utilizado para este kit de troponina foi 14 pg/mL, correspondente ao percentil 99. EA grave foi definida pela presença de área valvar aórtica (AVA) < 1 cm2, Vmax ≥ 4 m/s, gradiente médio de pressão aórtica ≥ 40 mmHg e razão das velocidades < 0,25. Quando não havia esses critérios definia-se EA não grave.

O desfecho primário foi composto por primeira ocorrência de mortalidade por todas as causas, troca valvar isolada e eventos coronários isquêmicos. Os desfechos secundários foram mortalidade por todas as causas, troca valvar com ou sem revascularização associada e eventos coronários isquêmicos.

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Resultados

Foram avaliados 1.739 pacientes, sendo 39% mulheres e 61% homens, com idade média de 67,5 anos e FEVE 65%. Do total, 302 (17,4%) tinham EA grave, com área valvar média de 0,8 cm2, Vmax 3,7 m/s, gradiente médio de 33,2 mmHg e razão de velocidades 0,22.

Do total de pacientes, 26% tinham troponina maior que 14 pg/mL. Esses pacientes tinham mais fatores de risco cardiovasculares e maior quantidade de alteração dos parâmetros do ecocardiograma. Houve associação positiva desses valores com sexo masculino, idade, índice de massa do VE e gradiente médio, porém não houve correlação com o grau da estenose aórtica (EA).

A variação média dos níveis de troponina em 1 ano foi de 0,8 pg/mL e em 1 ano, 30,3% tinham troponina > 14 pg/mL. Níveis persistentemente aumentados (basal e em 1 ano) foram encontrados em 20,6% dos pacientes e 15,5% tiveram aumento de níveis ≤ 14 pg/mL para > 14 pg/mL em 1 ano. Pacientes desses dois grupos eram mais velhos, com risco mais alto pelo escore de Framingham, com maior prevalência de fibrilação atrial e maior índice de massa do VE.

Em relação aos desfechos, no período de seguimento médio de 4,35 anos, 652 pacientes (37,5%) tiveram desfecho primário, sendo 7,2% morte, 19,2% troca valvar e 11,1% eventos coronários isquêmicos, que compreenderam 2,5% de infarto agudo do miocárdio (IAM), 0,9% de angioplastias, 7,8% de cirurgias de revascularização miocárdica associada a troca valvar.

Os desfechos primários foram mais frequentes nos quartis com troponina mais alta, sendo o quarto quartil o pior. Quando a troponina foi maior que 14 pg/mL o risco de desfecho primário foi 41% maior e quando avaliados os eventos isoladamente, pacientes com troponina aumentada tinham probabilidade 2 vezes maior de ter evento isquêmico e mortalidade como primeiro evento, porém a ocorrência de troca valvar era semelhante quando a troponina era maior ou menor que o corte estabelecido.

Na análise de risco, quem tinha troponina maior que 14 pg/mL teve risco 71% maior de ocorrência de eventos isquêmicos em 5 anos, sem relação com troca valvar ou mortalidade. Troponina foi o fator de risco independente mais forte para evento isquêmico e não houve relação da troponina com a gravidade da EA.

Comentários e conclusão

Esse estudo mostrou que a maioria dos pacientes com EA assintomática tem níveis de troponina normais e os valores em 1 ano aumentaram muito pouco, independente da gravidade da EA.

Pacientes com troponina > 14 pg/mL tiveram maior risco de ocorrência do desfecho primário às custas de eventos coronários isquêmicos. Essa associação se manteve significativa após ajustes para o escore de risco de Framingham e tratamento hipolipemiante, podendo talvez a troponina ser utilizada como um marcador de risco objetivo para DAC nesses pacientes.

Mensagem prática

Baseado nesses resultados, não há indicação de coleta de troponina de rotina nos pacientes com estenose aórtica (EA) não grave assintomática, porém troponina aumentada nessa população pode servir como um alerta para a presença de DAC subclínica. Importante lembrar que não podemos generalizar esses achados para pacientes sintomáticos e mais estudos são necessários para melhor entendimento do papel da troponina na população com EA.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Hadziselimovic E, et al. Association of high-sensitivity troponin T with outcomes in asymptomatic non-severe aortic stenosis: a post-hoc substudy of the SEAS trial. The Lancet. 2023 Abril;58:101875. DOI: 10.1016/j.eclinm.2023.101875

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