Uso de dexametasona em pacientes com HIV e meningite tuberculosa

Estudo avaliou o impacto da dexametasona na mortalidade de pacientes com infecção pelo HIV e que apresentam tuberculose meníngea.

Tuberculose com comprometimento do sistema nervoso central (SNC) é uma das formas mais graves da doença, estando associada a elevada letalidade e elevada proporção de sequelas neurológicas nos sobreviventes. Com o objetivo de diminuir o processo inflamatório que contribuiria para a morbimortalidade da doença, estudos prévios avaliaram potenciais benefícios do uso de corticoterapia adjuvante. Embora a administração de dexametasona tenha sido associada com redução de mortalidade, o benefício em indivíduos com HIV permanece incerto.

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Diante dessa incerteza, um estudo publicado na The New England Journal of Medicine procurou avaliar o impacto da administração de dexametasona na mortalidade de pacientes com infecção pelo HIV e que apresentam tuberculose meníngea.

Uso de dexametasona em pacientes com HIV e meningite tuberculosa

Materiais e métodos

Trata-se de um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, e controlado por placebo, que foi conduzido em hospitais no Vietnã e na Indonésia, no período de 2019 a 2021. Eram elegíveis pacientes adultos, com infecção pelo HIV, e com diagnóstico de clínico de tuberculose meníngea. Foram excluídos os indivíduos com suspeita de outra infecção em SNC, os com tratamento para tuberculose por mais de 6 dias consecutivos, os que receberam corticoides sistêmicos por mais de três dias consecutivos e os em que seu uso foi considerado essencial ou contraindicado.

Os participantes incluídos foram randomizados na proporção de 1:1 para receber dexametasona ou placebo, com estratificação por gravidade do quadro neurológico. Todos os participantes receberam o tratamento padrão para tuberculose. Para os que ainda não a haviam iniciado, terapia antirretroviral (TARV) foi programada para seis a oito semanas após o início do tratamento de tuberculose.

O desfecho primário foi morte por todas as causas em 12 meses após a randomização. Os desfechos secundários foram disfunção neurológica em 12 meses, presença de síndrome inflamatória de reconstituição imune (IRIS) em seis meses, evento neurológico novo ou morte, novo evento definidor de AIDS ou morte, diagnóstico de neoplasia associada ao HIV, uso de corticoides por qualquer motivo, cirurgia de derivação e eventos adversos graves.

Resultados

Durante o período do estudo, foram avaliados 779 indivíduos, dos quais 520 foram incluídos e randomizados, sendo 263 alocados no grupo que recebeu dexametasona e 257, no grupo que recebeu placebo. Após exclusões, a população conforme o protocolo foi de 249 participantes no grupo da dexametasona e de 238 no grupo placebo.

Em relação ao desfecho primário, 116 dos 263 (44,1%) participantes no grupo da dexametasona morreram durante o período de 12 meses de seguimento, comparados com 126 dos 257 (49,0%) do grupo placebo, uma diferença sem significância estatística (HR = 0,85; IC 95% = 0,66 – 1,10; p = 0,22). Os resultados foram semelhantes após ajuste por gravidade do quadro neurológico e nas análises por subgrupo, tanto na avaliação por intenção de tratamento quanto na conforme o protocolo. A incidência dos desfechos secundários também não apresentou diferença entre os grupos, com chances semelhantes de disfunção neurológica (OR = 1,31; IC 95% = 0,80 – 2,14), eventos neurológicos novos ou morte (HR = 0,85; IC 95% = 0,67 – 1,08), e eventos definidores de AIDS ou morte (HR = 0,87; IC 95% = 0,68 – 1,12).

Entre os que não estavam em uso de TARV, a mediana de tempo para seu início foi de 31 dias (IIQ = 15 – 53) em 81 participantes no grupo da dexametasona e de 36 dias (IIQ = 16 – 61) em 66 participantes no grupo placebo. IRIS foi detectada em 11 dos 263 (4,2%) indivíduos no grupo da dexametasona e em 9 dos 257 (3,5%) no grupo placebo (HR = 1,11; IC 95% = 0,46 – 2,69). Não foi relatado nenhum caso de neoplasia associada ao HIV durante os 12 meses de seguimento do estudo e somente um participante — no grupo que recebeu dexametasona — foi submetido à derivação cirúrgica.

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Não se encontrou benefício na administração de dexametasona em nenhuma das análises por subgrupos dos desfechos secundários. Uma possível exceção foi no subgrupo de 52 pacientes na análise por intenção de tratamento que foram classificados como tendo tuberculose meníngea possível. Os que receberam dexametasona apresentaram menor incidência de novos eventos neurológicos ou morte em comparação com o grupo placebo.

A frequência de eventos adversos graves também foi semelhante entre os grupos (73,0% no grupo da dexametasona vs. 75.5% no grupo placebo; p = 0,52). A incidência de eventos adversos graves neurológicos — predominantemente rebaixamento do nível de consciência e déficits neurológicos novos — foi menor no grupo que recebeu dexametasona. Elevação de TGP foi mais provável no grupo da dexametasona do que no grupo placebo (13,7% vs. 7,8%, respectivamente).

Mensagens práticas

  • Mortalidade em indivíduos com HIV e diagnóstico de tuberculose meníngea é elevada, aproximando-se a 50%.
  • O uso de dexametasona adjuvante, nesse estudo, não mostrou benefício na redução de mortalidade e nem de disfunção neurológica.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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