Vacinas contra a Covid-19: quais as recomendações para pacientes oncológicos?

Força-tarefa publicou recentemente recomendações sobre a vacinação contra a Covid-19 em pacientes oncológicos após revisar a literatura.

A força-tarefa da AACR (American Association for Cancer Research) publicou recentemente suas recomendações sobre a vacinação contra a Covid-19 em pacientes oncológicos após revisar a literatura disponível até o momento. Eles revisaram os principais estudos clínicos (28) sobre as taxas de mortalidade da Covid-19 em pacientes oncológicos, a maioria com grupos controle de pacientes sem câncer para facilitar a comparação. A maioria indicou uma taxa de mortalidade mais alta para os pacientes portadores de câncer, algumas vezes o dobro. Estes pacientes têm se mostrado em caso de contaminação pelo SARS Cov-2 como tendo maior risco para desenvolvimento de formas graves de Covid-19, em especial aqueles com neoplasia de pulmão, neoplasias hematológicas e os metastáticos. Pacientes em seguimento tardio (>5 anos) teriam menor risco. Só nos EUA estima-se que 17 milhões de pessoas tenham câncer em atividade ou história de terem tido. Fundamental entender quem tem maior risco. Importante destacar que essas evidências são preliminares baseadas em análises retrospectivas. Essa recomendação da AACR de vacinar prioritariamente pacientes oncológicos está em linha com a da ACIP (Advisory Committee on Immunization Practices) e também com as recomendações do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), ambas entidades norte-americanas.

Ribas A, et al (2021)
Ribas A, et al (2021)

A ANVISA decidiu, no dia 23 de fevereiro, pela concessão do registro definitivo da vacina do Laboratório Pfizer/BioNTech contra Covid-19.

Recomendações de outras agências

Para a ESMO – European Society of Medical Oncology, pacientes com câncer hematológico e tumores sólidos em atividade, especialmente aqueles em quimioterapia, têm risco aumentado de formas severas de Covid-19, mas aqueles pacientes com história de tumores sólidos < 5 anos também estão incluídos na recomendação para receber vacinas de forma prioritária independente da idade e de outras comorbidades, com exceção de pacientes transplantados que na ausência de doença enxerto versus hospedeiro, deveriam ser vacinados 6 meses após o transplante. A ESMO ressalta ainda que pacientes em protocolos de pesquisa clínica não deveriam deixar de receber vacinação, para isso emendas nos protocolos poderão ser necessárias, já que habitualmente não são permitidas outras medicações concomitantes sem aprovação definitiva, como é o caso das vacinas anti-Covid-19 neste momento.

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A ASCO – American Society of Clinical Oncology, desenvolveu uma parceria com a Infectious Diseases Society of America (IDSA) e destacou a extrema consistência dos dados de segurança para as vacinas aplicadas nos voluntários em geral, mas ressaltam que os dados do COVID-19 and Cancer Consortium Registry (CCC19) já incluíram os dados de 6.000 pacientes com Covid confirmado e mostram que, independente da idade e de outros fatores, tratamento de câncer nos últimos 3 meses é um fator de risco 3-5 vezes maior para pacientes oncológicos desenvolverem complicações no caso de infecção pelo SARS-Cov-2. A ASCO estimula que os oncologistas sigam as regras gerais que já são usadas para vacinação contra o vírus da influenza e sugere dicas como: esperar 1-2 semanas do último tratamento e se possível 1 semana antes do próximo; manter máscara, lavagens da mãos, distanciamento social mesmo após a segunda dose das vacinas.

A evidência de vacinação (em geral) em pacientes oncológicos é limitada, mas já existem evidências prévias para referendar vacinação contra doenças infecciosas em geral, excluindo vacinas com vírus vivo atenuado, mesmo em pacientes que estão se submetendo a terapia imunossupressora. No entanto a eficácia pode ser inferior em pacientes que recebem terapias que levam à diminuição de linfócitos B (anticorpos monoclonais anti-CD19, anti-CD20, anti-CD10 e CD19 CART-cells. Isto pode valer também para os pacientes que recebem transplantes de células tronco hematopoiéticas.

Isto posto, extrapolando os dados de outras vacinações em pacientes oncológicos como a para influenza e conhecendo os mecanismos das vacinas aprovadas ou em desenvolvimento contra a Covid-19 é honesto afirmar que a eficácia possa ser semelhante à da população em geral, mas obviamente faltam dados dos estudos clínicos. Apenas 3,7% dos 43.540 voluntários do estudo clínico da vacina BNT162b2 mRNA contra COVID-19 eram portadores de câncer, sendo que destes apenas 1 no grupo vacina e 4 no grupo placebo desenvolveram Covid-19. Não temos ainda dados para avaliar a interação entre as inúmeras terapias oncológicas ativas (quimioterapia, radioterapia, anticorpos monoclonais — exceto os já citados antes, imunoterapia, anticorpos conjugado droga) e a capacidade de produzir anticorpos neutralizantes e consequentemente imunidade protetora contra a Covid-19.

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Com a evidência de que as vacinas anti-Covid-19 sejam capazes de induzir altos níveis de anticorpos neutralizantes contra a infecção pelo SARS Cov-2 em número significativo de pessoas seria de fundamental importância oferecer vacinação prioritária para pacientes oncológicos em quimioterapia, imunoterapia, anticorpos monoclonais mesmo aqueles portadores de neoplasias hematológicas. Mas, em base individual, conversar com a equipe médica é fundamental para a tomada de decisão.

A priorização para pacientes oncológicos pode variar (e já está variando) de país para país. No momento da redação deste texto mais de 50 países (cerca de 35 milhões de pessoas) já iniciaram algum tipo de vacinação anti-Covid-19. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera pacientes idosos e profissionais de saúde como grupo 1 de priorização, e pacientes oncológicos seriam grupo 2. Como temos visto a idade também tem variado na definição de prioridade (> 75 anos? > 80? > 60?). No Brasil em princípio pacientes portadores de comorbidades — câncer incluído — seriam (ou serão) grupo 3, mas os estados têm autonomia para definir prioridades diferentes. Importante ter em mente que pacientes oncológicos são um grupo extremamente heterogêneo, e neste particular pacientes antigos apenas em seguimento oncológico, sem doença em atividade devem ter o risco baseado na idade e em outras comorbidades e não no histórico antigo de câncer.

Parece claro para todos os especialistas que na maioria dos casos os benefícios da vacinação superam e muito os riscos, mesmo naqueles pacientes que já iniciaram a terapia. E não podemos esquecer que vacinar todo o estafe envolvido no atendimento oncológico pode reduzir o risco de transmissão nosocomial.

A geração de anticorpos neutralizantes contra o SARS Cov-2, é o “santo Graal” da imunidade contra a Covid-19, especial anticorpos contra o domínio ligante do receptor da proteína espicular (spike) molécula que facilita a entrada viral nas células epiteliais do sistema respiratório do hospedeiro através da interação com o receptor epitelial da enzima conversora da angiotensina 2. Temos ainda a preocupação com as pessoas que não tem níveis detectáveis destes anticorpos ou os têm por um período limitado havendo um decaimento com os meses. Por outro lado, nos convalescentes a imunidade celular não é avaliada através destes anticorpos. Sabemos que há resposta de imunidade através de linfócitos T CD4+ e CD8+ e que o corpo desenvolve memória. Esta resposta celular pode ser contra antígenos derivados da matriz do vírus, do envelope ou da proteína do núcleo assim como contra a proteína da espícula. Não sabemos ainda a história natural desta imunidade humoral (anticorpos) e celular, provavelmente há uma integração ou combinação de ambas, certamente ainda aprenderemos muito a respeito deste e de outros aspectos sobre a vacinação e sobre a Covid-19. Não poderemos avaliar a eficácia das vacinas apenas através da documentação de anticorpos.

Tivemos a aprovação emergencial pela ANVISA no dia 17/01/2021 de 2 vacinas em nosso país:

  • A ChAdOx1 nCoV-19, conhecida como vacina Oxford-AstraZeneca é uma vacina vetor viral não replicante de adenovírus de chimpanzé.  O adenovírus é manipulado geneticamente para inserir o gene da proteína “Spike” do Sars-CoV-2. Depois de obtido, os adenovírus são amplificados usando células cultivadas. Os adenovírus não podem se replicar na pessoa vacinada (vírus não replicante), mas desencadeiam uma resposta imunológica específica para a proteína S, gerando anticorpos e a ativação das células T contra o novo coronavírus. A eficácia relatada pode variar de 62-70-90% conforme o desfecho avaliado, dose e intervalo;
  • A CoronaVac que é uma vacina de vírus inativado, desenvolvida pela Sinovac e pelo Instituto Butantan. O vírus é inativado em laboratório pelo calor e produtos químicos para não serem capazes de se reproduzir mas não são capazes de induzir a Covid-19, mas geram resposta imune ativando os linfócitos que produzem anticorpos e seria capaz de reduzir as formas moderadas e severas de Covid-19 em 78-100% ainda que a eficácia geral seja de 50,38%.

Ambas são muito seguras, com custo relativamente bem mais baixo quando comparadas com as de RNA-m, e sem a necessidade de congelamento em baixíssimas temperaturas por não serem termossensíveis. Ainda que dúvidas persistam, inclusive para os pacientes oncológicos, numa pandemia sem precedentes que já ceifou a vida de mais de 200 mil brasileiros, é hora de vacinar!

Vacina boa é aquela que está disponível, vacina boa é aquela que a população está disposta a tomar e efetivamente toma DUAS DOSES! Pacientes oncológicos em especial com doença em atividade têm prioridade, mas no fundo estamos torcendo para que TODOS os brasileiros tenham acesso à elas o mais rápido possível.

Eu já estou pronto para me vacinar. Qual vacina? Aquela que estiver disponível na minha cidade na hora que meu grupo prioritário puder tomá-la, sem medo de ser feliz.

Referências bibliográficas:

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