Estima-se que, a cada ano, 1,5 milhões de pessoas sejam diagnosticadas com infecção crônica pelo vírus da hepatite B (HBV) e que 820 mil pessoas morram em decorrência da infecção (principalmente por cirrose e carcinoma hepatocelular). Assim, fica claro que a hepatite B crônica é um importante problema de saúde mundial e, por isso, esforços contínuos são dispensados na pesquisa do tratamento.
O objetivo da terapia nessa condição é alcançar a cura funcional, ou seja, HBsAg não reagente, com ou sem soroconversão do anti-HBs, e carga viral do HBV indetectável de forma sustentada após o término. Apesar do tratamento prolongado, menos de 5% dos pacientes apresentam HBsAg negativo após 12 meses, o que destaca a necessidade do surgimento de novas medicações.
Bepirovirsen para hepatite B crônica
O bepirovirsen (GSK 3228836), uma medicação que tem como alvo os RNAs do HBV (incluindo o mensageiro e o pré-genômino), mostrou no estudo de fase 2A que quatro semanas de seu uso provocavam uma rápida redução nos níveis de HBsAg e, em alguns participantes, inclusive negativação, o que pode ter relação com a estimulação do receptor toll-like. Assim, foi conduzido, recentemente, um estudo de fase 2B para avaliar a eficácia e segurança do tratamento com essa medicação por 12 e 24 semanas em participantes com hepatite B crônica que estavam recebendo ou não um análogo de nucleotídeo (NA).
O estudo foi randomizado e sem ocultação do investigador. Os participantes tinham pelo menos 18 anos e apresentavam hepatite B crônica por pelo menos seis meses com um nível de HBsAg de mais de 100 UI/mL. Os principais critérios de exclusão foram a presença de hepatite C, HIV, infecção pelo vírus da hepatite D, cirrose e carcinoma hepatocelular. Os participantes foram alocados aleatoriamente em uma proporção de 3:3:3:1 para receber injeções subcutâneas semanais de bepirovirsen da seguinte forma:
- Grupo 1: 300 mg por 24 semanas;
- Grupo 2: 300 mg por 12 semanas e depois 150 mg por 12 semanas;
- Grupo 3: 300 mg por 12 semanas e depois placebo por 12 semanas;
- Grupo 4: placebo por 12 semanas e depois a 300 mg por 12 semanas.
Os grupos 1, 2 e 3 receberam doses de ataque de bepirovirsen. O grupo 4, então, foi pensado para permitir a avaliação do efeito da dose de ataque e da segurança nas primeiras 12 semanas.
O estudo
O desfecho primário foi um nível de HBsAg abaixo do limite inferior de detecção (0,05 UI/mL) e carga viral do HBV abaixo do limite inferior de quantificação (20 UI/mL) mantido por 24 semanas após o término planejado do tratamento e com ausência de qualquer medicamento iniciado com a finalidade de suprimir a replicação do HBV. Os desfechos secundários incluíram as diferenças entre os grupos 1, 2 e 3, a proporção de participantes com HBsAg e carga viral do HBV abaixo do limite inferior ao final do tratamento, alterações de log da linha de base nos níveis de HBsAg, carga viral do HBV, HBeAg e anti-HBS e normalização da ALT na ausência de tratamento antiviral recém-iniciado em participantes com nível de ALT acima do limite superior da normalidade. Os resultados de segurança incluíram avaliações clínicas, medições laboratoriais e eventos adversos.
A população com intenção de tratar foi de 457 participantes (227 recebendo terapia NA e 230 não recebendo terapia NA). Entre aqueles que receberam NA, seis apresentaram desfecho primário (9%; IC95%, 0 a 31) no grupo 1, seis (9%; IC95%, 0 a 43) no grupo 2, dois (3%; IC95%, 0 a 16) no grupo 3.
Entre os participantes que não receberam NA, o desfecho primário ocorreu em 7 participantes (10%; IC95%, 0 a 38), 4 (6%; IC95%, 0 a 25) no grupo 1, 1 (1%; intervalo de credibilidade post hoc, 0 a 6) no grupo 2 e 0 (0%; intervalo de credibilidade post hoc, 0 a 8) no grupo.
Assim, o bepirovirsen na dose de 300 mg por semana durante 24 semanas resultou em queda sustentada de HBsAg e carga viral do HBV em 9 a 10% dos participantes com infecção crônica e os resultados foram semelhantes entre os participantes que receberam ou não NA.
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Principais efeitos colaterais
Durante as primeiras 12 semanas do estudo, quando o grupo 4 recebeu placebo, os eventos adversos foram mais comuns com bepirovirsen do que com placebo. Os comumente relatados foram pirexia e fadiga. Oito eventos adversos graves ocorreram nas primeiras 12 semanas de tratamento com bepirovirsen e nenhum com o recebimento de placebo.
No geral, as reações no local da injeção foram os mais comuns e dois participantes desistiram devido a esse efeito. Entre os participantes que receberam NA e os que não receberam NA, o bepirovirsen na dose de 300 mg semanalmente por 24 semanas não mostrou nenhuma diferença marcante na segurança ou no perfil de efeitos colaterais em comparação com outros regimes.