Efeitos da deficiência de ferro em crianças em seus escores cognitivos

Estudo analisando o nível de ferro no sangue e escores cognitivos foi realizado com crianças de 12 a 40 meses em Toronto.

Um estudo longitudinal de referência, realizado na Costa Rica na década de 1980, constatou que crianças com deficiência crônica de ferro (DCF) na infância tinham escores cognitivos de 8 a 9 pontos mais baixos do que aquelas com suficiência de ferro (SF), até a idade de 19 anos. Com o objetivo de avaliar essa associação em um ambiente contemporâneo com mais recursos, pesquisadores do Canadá (Gingoyon e colaboradores) conduziram um estudo observacional prospectivo que foi publicado recentemente no periódico americano Pediatrics.

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Efeitos da deficiência de ferro em crianças em seus escores cognitivos

Metodologia

O estudo foi realizado entre 15 de junho de 2012 e 9 de novembro de 2018. Foram incluídas crianças de 12 a 40 meses de idade rastreadas com hemoglobina e ferritina sérica, recrutadas durante uma visita programada de acompanhamento  em 1 de 8 clínicas de cuidados primários participantes de uma coorte longitudinal e rede de pesquisa baseada na prática chamada TARGet Kids! em Toronto. Essa coorte enfoca os resultados de exposições no início da vida para crianças de 0 a 5 anos de idade: as crianças frequentam várias consultas nos primeiros 5 anos de vida, de acordo com as diretrizes nacionais, inclusive aos 12, 15, 18, 24 e 36 meses de idade.

Usando os critérios de elegibilidade da coorte TARGet Kids!, os participantes foram excluídos por:

  • Condições de saúde genéticas ou crônicas (exceto asma);
  • Atraso grave no desenvolvimento;
  • Idade gestacional < 32 semanas;
  • Doença aguda;
  • Pais incapazes de se comunicar em inglês;

Critérios adicionais de exclusão foram:

  • Uso de ferro oral no momento do estudo;
  • Idade gestacional < 35 semanas;
  • Peso ao nascer < 2.500 g;
  • Proteína-C-reativa (PCR) ≥ 10 mg/L ou ausente;
  • Uma exclusão imprevista foi a participação simultânea em outro estudo.

As crianças foram convidadas a participar se os resultados de suas amostras de sangue atendessem aos critérios para 1 das 3 categorias de status de ferro:

  • Anemia por deficiência de ferro (ADF): hemoglobina < 11 g/dL, ferritina sérica < 14 μg/L;
  • Deficiência de ferro não anêmica: (DFNA): hemoglobina ≥ 11 g/dL, ferritina sérica < 14 μg/L;
  • SF: hemoglobina ≥ 11 g/dL, ferritina sérica ≥ 14 μg/L. Dado o grande número de crianças com SF, apenas uma amostra aleatória foi convidada a participar.

Após 4 meses, as crianças foram agrupadas como:

  • DCF: anemia por deficiência de ferro no início do estudo ou deficiência de ferro não anêmica persistente; ou
  • SF: no início do estudo ou DFNA resolvida.

Todos os pais receberam aconselhamento dietético. As crianças receberam ferro oral de acordo com o status de ferro:

  • Crianças com ADF: sulfato ferroso oral (6 mg de ferro elementar/kg/dia) por 4 meses de acordo com a prática usual;
  • Crianças com DFNA foram randomizadas para receber sulfato ferroso (mesma dose e duração) ou placebo conforme descrito anteriormente no estudo randomizado aninhado (devido a um desvio de protocolo, 3 crianças elegíveis não foram randomizadas e receberam sulfato ferroso);
  • Crianças com SF não receberam receber qualquer produto oral.

Os desfechos medidos aos 4 e 12 meses incluíram o Early Learning Composite (ELC) (das Escalas Mullen de Aprendizado Precoce) e a ferritina sérica.

Resultados

De um total de 1.478 crianças rastreadas e elegíveis após a triagem, 130 foram inscritas de acordo com as 3 categorias básicas de status de ferro:

  • ADF (n = 37);
  • DFNA (n = 63);
  • SF (n = 30).

Aos 4 meses, 116 crianças tinham dados de exposição e desfecho disponíveis e foram alocadas em 1 de 2 grupos:

  • DCF (n = 41); ou
  • SF (n = 75).

Aos 12 meses, 91 crianças tinham pontuações ELC disponíveis:

  • DCF (n = 31); ou
  • SF (n = 60).

Usando análises multivariáveis, a média das diferenças entre os grupos no ELC aos 4 meses foi de 6,4 pontos e aos 12 meses foi de 7,4 pontos. A diferença média entre os grupos na ferritina sérica aos 4 meses foi de 14,3 mg/L  e não foi significativamente diferente aos 12 meses.

Conclusão

Crianças com DCF, em comparação com crianças com SF, demonstraram melhora no nível de ferro, mas pontuações cognitivas de 6 a 7 pontos mais baixas aos 4 e 12 meses após a intervenção, em um ambiente contemporâneo com muitos recursos. Os pesquisadores destacam que estudos futuros podem avaliar os desfechos de uma estratégia de triagem com base na detecção precoce da deficiência de ferro usando ferritina sérica.

Comentários

Na sessão “Comentários” da Pediatrics, Greer e Baker analisaram os desfechos do estudo e apontaram várias limitações importantes. Uma delas se refere ao pequeno número do tamanho da amostra, especialmente no grupo de DCF. Além disso, houve perda de seguimento de 30% e a duração da DCF é desconhecida. Greer e Baker também ressaltaram que ainda não se sabe se os escores cognitivos de bebês com DCF melhorarão em longo prazo em um ambiente com mães com alto nível de escolaridade e, presumivelmente, com status socioeconômico mais alto. Por fim, enfatizaram que tanto o estudo de Gingoyon e colaboradores quanto o realizado na Costa Rica incorrem nas armadilhas de um pequeno estudo observacional: no Canadá, os pesquisadores acompanharam os participantes por apenas 12 meses versus 19 anos no trabalho de Lozoff et al.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Gingoyon A, et al. Chronic Iron Deficiency and Cognitive Function in Early Childhood. Pediatrics. 2022;150(6):e2021055926. DOI: 10.1542/peds.2021-055926
  • Greer FR, Baker RD. Early Childhood Chronic Iron Deficiency and Later Cognitive Function: The Conundrum Continues. Pediatrics. 2022;150(6):e2022058591. DOI: 10.1542/peds.2022-058591