Estudo concluiu que o uso de um protocolo reduziu complicações associadas a sepse pediátrica

O uso de um protocolo simples e de baixo custo reduziu complicações associadas a sepse pediátrica em um hospital público no Brasil.

O uso de um protocolo simples e de baixo custo reduziu complicações associadas a sepse pediátrica resultando em diminuição da mortalidade e de progressão de disfunções orgânicas, além de ter sido associado a uma probabilidade reduzida de desenvolver choque séptico em um hospital geral público de uma região de baixa renda no Brasil. Esses são os resultados do estudo “A Pediatric Sepsis Protocol Reduced Mortality and Dysfunctions in a Brazilian Public Hospital”, publicado em 08 de novembro no jornal Frontiers in Pediatrics e cujos objetivos foram: avaliar se o uso de um protocolo de sepse resultaria em redução da mortalidade hospitalar por sepse, sepse grave e choque séptico; e avaliar a prevenção de choque séptico e disfunção orgânica com a utilização desse protocolo.

A sepse tem uma taxa de mortalidade variável entre 4,5 e 21%, enquanto a mortalidade por choque séptico é de 17 a 34%. Desde 2002, o American College of Critical Care Medicine – Pediatric Advanced Life Support (ACCM/PALS) vem publicando diretrizes para o tratamento do choque séptico, mas muitos estudos mostram uma baixa taxa de adesão. Infelizmente, o prognóstico depende muito do tempo de diagnóstico e tratamento e a literatura relata que crianças com sepse grave em países em desenvolvimento têm quatro vezes mais chances de óbito do que crianças em países desenvolvidos. Além disso, poucos estudos na literatura discutem os benefícios da adesão aos bundles de sepse em hospitais de países de baixa e média renda, onde os recursos são limitados e a mortalidade é alta.

Leia também: Revisão sistemática e meta-análise avaliam os critérios para sepse em pediatria

Estudo concluiu que o uso de um protocolo reduziu complicações associadas a sepse pediátrica

Metodologia

Os pesquisadores realizaram um estudo de coorte retrospectivo em um hospital público de uma região de baixa renda do Brasil e avaliaram se a utilização de um protocolo de sepse estaria associada à redução da mortalidade hospitalar por sepse, sepse grave e choque séptico, bem como à prevenção de choque séptico e disfunção orgânica.

Foram coletados dados de 2008 a agosto de 2016 no banco de dados do Departamento de Qualidade e Serviço de Arquivo Médico e Estatístico do Hospital Dr. Moysés Deutsch — M’Boi Mirim (HMMD), em São Paulo (inaugurado em abril de 2008). O hospital possui 300 leitos e está localizado em uma área de baixa renda que atende uma população de 650.000 habitantes.

Definições

Sepse, sepse grave, choque séptico e disfunção orgânica foram definidos com base nos critérios estabelecidos pela International Pediatric Sepsis Consensus Conference de 2005 (IPSCC), e o tratamento foi determinado com base na Surviving Sepsis Campaign 2012.

Critérios de inclusão e de exclusão

Durante o período de pré-implementação, foram incluídos pacientes que receberam um dos seguintes códigos de alta da Classificação Internacional de Doenças 10ª Edição (CID-10) – período entre agosto de 2008 a dezembro de 2014:

  • 41 (Septicemia);
  • 57 (Choque);
  • 39 (Meningococcemia).

Foram excluídos os registros médicos que não atendiam aos critérios do IPSCC.

Em seguida, durante o período pós-implantação (fevereiro de 2015 a agosto de 2016), foram incluídos:

  • Pacientes incluídos no protocolo de sepse;
  • Pacientes com CID-10 A.41, R.57 ou A.39 que não foram incluídos no protocolo e atenderam aos critérios do IPSCC.

Foram também excluídos os pacientes que desenvolveram sepse, sepse grave ou choque séptico na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP), Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) ou na Enfermaria de Pediatria e pacientes transferidos de outros serviços com sepse, sepse grave ou choque séptico.

Conformidade com o protocolo

A conformidade do bundle exigia o preenchimento de três itens:

  • Obtenção de hemograma e cultura, gasometria arterial ou venosa e níveis de lactato arterial ou venoso;

As hemoculturas foram coletadas após rigorosa antissepsia com álcool 70%, aplicada de 3 a 4 vezes na pele. Amostras de sangue de 1–3 mL foram colocadas em um frasco Bac tec® (PEDS PLUS / F).

  • Infusão de antibiótico na primeira hora do diagnóstico;
  • Infusão de solução salina 10 a 20 mL/kg na primeira hora do diagnóstico.

Saiba mais: Estudo mostra que as prevalências de sepse e de choque séptico em crianças no Brasil são elevadas

O protocolo

O protocolo foi iniciado no pronto-socorro pediátrico (PSP) em fevereiro de 2015 e consistia na triagem de pacientes que apresentavam história de febre ou hipotermia na triagem ou primeiro atendimento médico com um dos seguintes sinais:

  • Taquicardia;
  • Taquipneia;
  • Hipotensão;
  • Perfusão tecidual alterada;
  • Desconforto respiratório;
  • Saturação de oxigênio <92%;
  • Alteração do nível de consciência;
  • Oligúria.

O prontuário era eletrônico, mas o sistema não alertava se havia alteração de sinais vitais. Para facilitar o processo, os pesquisadores colocaram um banner em cada local de tratamento que mostrava a faixa normal de sinais vitais para diferentes faixas etárias. Então a equipe poderia reconhecer as alterações dos sinais vitais e abrir o protocolo. Sempre que um protocolo era aberto, o enfermeiro ou médico da triagem do primeiro atendimento médico preenchia um formulário.

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Resultados

Foram incluídas 548 crianças com sepse, sepse grave ou choque séptico atendidas no PSP do HMMD. Durante o período pós-implementação, 27% dos pacientes com triagem positiva (levando à notificação) foram posteriormente considerados como não tendo sepse (os sinais vitais não estavam alterados de acordo com os parâmetros do protocolo ou porque não eram pacientes com sepse). Nenhum deles apresentou complicações associadas ao tratamento da sepse e recebeu alta. Isso foi comum durante o primeiro semestre de implementação.

Dentre os 548 pacientes, 371 foram incluídos no grupo de protocolo. A mediana de idade dos pacientes foi de 8,75 meses no grupo que não recebeu o protocolo (n = 177) e 19 meses no grupo que o recebeu. No grupo “sem protocolo”, 57,4% dos pacientes eram do sexo masculino. Já no grupo “protocolo”, 52,7% eram meninos.

Os pacientes que foram submetidos ao protocolo tiveram um menor tempo médio de internação (3 dias versus 11 dias; p < 0,001), menos disfunções orgânicas durante a hospitalização (0 versus 2, p < 0,001) e um menor probabilidade de desenvolver choque séptico. De acordo com uma análise de escore de propensão, a mortalidade foi menor durante o período pós-implementação [2,75 versus 15,4% (risco relativo 0,13; intervalo de confiança de 95% 0,06 – 0,27); p < 0,001)].

Conclusão

Os pesquisadores concluíram que o uso de um protocolo simples de baixo custo foi viável e apresentou bons resultados em um hospital geral de uma região de baixa renda no Brasil: o protocolo auxiliou no diagnóstico da sepse em estágios iniciais, o que ajudou a evitar mais complicações e resultou em diminuição da mortalidade e progressão das disfunções que, por sua vez, foi associada uma probabilidade reduzida de desenvolver choque séptico.

Comentário

Esse estudo é um grande avanço para a Medicina Intensiva Pediátrica Brasileira e foi publicado bem próximo ao Dia do Intensivista. No entanto, em um país com poucos recursos e tão vasto, uma das possíveis barreiras para a adesão a um protocolo são a falta de recursos humanos e insumos em muitos locais para a sua execução. Muitas barreiras para a adesão também são relacionadas a cultura das instituições. Dessa forma, a divulgação de trabalhos tão relevantes como esse pode permitir a promoção dessas recomendações. Mudança de cultura requer muito treinamento e dedicação por parte de todos nós, profissionais de saúde. É um caminho longo a se percorrer, porém os desfechos favoráveis decorrentes da implementação das diretrizes são inestimáveis.

Referências bibliográficas:

  • Medeiros DNM. A Pediatric Sepsis Protocol Reduced Mortality and Dysfunctions in a Brazilian Public Hospital. Front. Pediatr. 2021;9;757721. doi: 10.3389/fped.2021.757721.

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