Influência da microbiota intestinal na compulsão alimentar por doces

Neste artigo trataremos da relação entre alterações da microbiota intestinal e respostas comportamentais para o consumo de doces.

Este conteúdo foi produzido pela PEBMED em parceria com Cellera Farma de acordo com a Política Editorial e de Publicidade do Portal PEBMED.

É crescente a compreensão sobre o comportamento alimentar dos indivíduos e dos fatores envolvidos nesse processo, como a genética, a palatabilidade dos alimentos e os hábitos alimentares. Recentemente, foi evidenciado o papel da microbiota intestinal no comportamento alimentar, em especial no consumo excessivo de alimentos palatáveis, ricos em carboidratos.1

Os açúcares, com destaque para a sacarose, são um dos sabores preferidos no reino animal, sendo também uma reserva energética primária fundamental em uma perspectiva evolutiva. Apesar disso, o excesso desse macronutriente pode trazer diversos danos à saúde, como diabetes, obesidade e doenças cardiovasculares.2  Com o passar dos anos, novas discussões sobre os alimentos ultraprocessados e ricos em carboidratos ganham espaço, levantando preocupações sobre o consumo excessivo e a cascata de comorbidades associadas à ele.3

Influência da microbiota intestinal na compulsão alimentar por doces

Processamento dos alimentos

A regulação dos comportamentos alimentares é fundamental para a saúde. Do ponto de vista fisiológico, o processamento dos alimentos ricos em sacarose acontece em vários níveis. O processo se inicia na cavidade oral, através do primeiro contato do alimento com a língua, transmitindo a percepção de qualidade, palatabilidade e de intensidade, resultando na percepção do sabor.  O eixo cérebro-intestino também é ativado, tanto por meio do sistema hepatoportal, como também por meio das vias vagais, codificando a recompensa e o valor nutricional dos alimentos. Por fim, a via cerebral acessa circuitos envolvidos no controle da ingestão dos alimentos.2 Os diversos sinais metabólicos circulantes, os feedbacks gastrointestinais e a palatabilidade dos alimentos atuam de forma sincronizada para coordenar a busca e o consumo de alimentos.1

Estudo da relação entre microbiota intestinal e alimentos doces

Com o objetivo de avaliar a relação entre as alterações da microbiota intestinal e as respostas comportamentais para o consumo de alimentos palatáveis, James Ousey e colaboradores realizaram um estudo experimental em camundongos. Os animais foram divididos em um grupo controle e um grupo intervenção no qual a microbiota foi modificada por meio do uso de antibióticos, como ampicilina, neomicina, metronidazol e vancomicina, ofertados durante oito semanas. Posteriormente, foi realizada a análise molecular da microbiota fecal destes camundongos. Alimentos palatáveis ricos em sacarose eram oferecidos para ambos os grupos, assim como outros grupos alimentares. Por fim, regiões cerebrais relacionadas ao comportamento foram avaliadas e os resultados dessa intervenção foram mensurados.1 Os dados sugerem que os camundongos com microbiota intestinal alterada apresentam uma motivação aumentada para buscar recompensas através do alto teor de sacarose. A ativação de regiões cerebrais foi associada à motivação, e o comportamento de busca de recompensa foi expressivo nesses camundongos após o consumo de alto teor de sacarose.1

Foram evidenciadas mudanças dependentes da microbiota na atividade neural na área tegmental ventral e no núcleo accumbens, regiões associadas à alimentação hedônica, reforçando que as perturbações da microbiota afetam a atividade cerebral. Fisiologicamente, reguladores centrais da ingestão de alimentos palatáveis, incluindo dopamina, fator neurotrófico derivado do cérebro e endocanabinoides, atuam ativamente nesse processo, visto que os seus níveis diferem entre camundongos com microbiota intacta comparado com aqueles que tiveram a microbiota alterada.  Essas moléculas parecem regular as vias de recompensa que influenciam os efeitos da microbiota no consumo de alimentos palatáveis.4

Efeitos da alteração induzida da microbiota intestinal

Em contrapartida, a restauração da microbiota intestinal por meio do transplante de microbiota fecal em camundongos foi suficiente para resgatar o consumo excessivo de alimentos com alto teor de sacarose, reduzindo o consumo excessivo de sacarose em um modelo de compulsão alimentar induzida por antibióticos. Esses resultados reforçam a hipótese que influências externas sobre a microbiota intestinal podem se relacionar com alterações na resposta comportamental a alimentos palatáveis.1

Alterações da microbiota intestinal foram associadas a possíveis transtornos alimentares humanos, incluindo anorexia nervosa e transtorno da compulsão alimentar periódica, bem como evidenciado pelo estudo supracitado realizado em camundongos, sobre ingestão de alimentos palatáveis, preferência alimentar e modelos de transtorno alimentar.1 Esses achados sugerem que a modulação funcional da microbiota intestinal seja um alvo potencial para regulação do comportamento alimentar. Embora os resultados obtidos em laboratório com animais sejam promissores, são necessários mais estudos para determinar se as mesmas observações se aplicam aos seres humanos.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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  • 1. Ousey J, Boktor JC, Mazmanian SK. (2023). Gut microbiota suppress feeding induced by palatable foods. Current biology: CB, 33(1), 147–157.e7. DOI: 10.1016/j.cub.2022.10.066.
  • 2. Gutierrez R, Fonseca E, Simon SA. The neuroscience of sugars in taste, gut-reward, feeding circuits, and obesity. Cell Mol Life Sci. 2020 Sep;77(18):3469-3502. DOI: 10.1007/s00018-020-03458-2.
  • 3. Marino M, Puppo F, Del Bo' C, et al. (2021). A Systematic Review of Worldwide Consumption of Ultra-Processed Foods: Findings and Criticisms. Nutrients, 13(8), 2778. DOI: 10.3390/nu13082778.
  • 4. Yu KB, Hsiao EY. Gut microbiota: A sweet tale of mice and microbes. Curr Biol. 2023;33(1):R18-R20. DOI: 10.1016/j.cub.2022.11.058