Intubação orotraqueal na UTI: updates e dispositivos

Apesar de frequente, a intubação orotraqueal (IOT) demanda conhecimento técnico e anatômico para a obtenção de resultado satisfatório.

A intubação orotraqueal (IOT) é um procedimento invasivo e frequente no ambiente da Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o qual consiste na obtenção de uma via aérea definitiva pela inserção de um tubo na traqueia seguida de insuflação do cuff. Suas indicações são variadas, sendo, muitas vezes, em razão de situações ameaçadoras à vida, como o rebaixamento do nível da consciência (RNC), a insuficiência respiratória aguda (IRPA) ou a instabilidade hemodinâmica grave.

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Complicações durante a intubação como hipóxia e instabilidade cardiovascular são associadas ao aumento da mortalidade em 28 dias de pacientes na UTI. Dessa maneira, é importante que se busque otimizar o manejo da via aérea avançada, sobretudo em pacientes críticos, no que tange à pré-intubação, à escolha de dispositivos, à escolha de drogas e à ventilação mecânica.

Intubação orotraqueal na UTI updates e dispositivos

Preparo e pré-oxigenação

Pré-oxigenar o paciente antes da intubação tem como intuito aumentar o tempo de apneia durante o procedimento sem que ocorra dessaturação, reduzindo, assim, a incidência de hipóxia. Diversos métodos de pré-oxigenação estão disponíveis e possuem validação na literatura.

O uso da Ventilação Não Invasiva (VNI) mostrou-se benéfico durante a pré-oxigenação, sobretudo quando associado ao cateter nasal de alto fluxo (CNAF), implicando em uma menor incidência de hipóxia quando comparado ao uso do dispositivo bolsa-válvula-máscara. Isso se deve ao fato de que, durante a intubação, a máscara precisa ser retirada na laringoscopia, diferentemente do CNAF.

O uso do CNAF também se diferencia dos demais dispositivos ao garantir uma oxigenação sem necessariamente disparar o ciclo respiratório (oxigenação apneica). Além disso, ao associá-lo à VNI, é possível ofertar uma pressão de suporte e PEEP suficientes para que a pré-oxigenação e a oxigenação apneica sejam otimizadas, garantindo que uma melhor saturação de oxigênio seja obtida durante o procedimento.

Dispositivos e algoritmos

Garantir o sucesso da via aérea definitiva na primeira tentativa é o objetivo de todo profissional quando se busca uma intubação de sucesso. Falhas na primeira tentativa estão associadas à incidência de complicações do procedimento e até mesmo à morte.

Uma forma de predizer uma via aérea difícil é por meio do score MOCOCHA, que engloba Mallampati’s III e IV, apneia obstrutiva do sono, mobilidade cervical reduzida, limitação de abertura oral, patologia envolvida (RNC, hipoxemia) e o operador (anestesista ou não anestesista). Valores superiores a três já são considerados como via aérea difícil, sendo o valor 12 o ponto de corte para via aérea muito difícil.

Como forma de alcançar maiores sucessos em intubações na primeira tentativa, a escolha do dispositivo utilizado é de singular importância. Até o início da pandemia de covid-19, o dispositivo mais utilizado era o laringoscópio com lâmina de Macintosh. Após o período pandêmico, popularizou-se também o uso do fio guia e do bougie na intubação como facilitadores para a inserção do tubo na traqueia. Além disso, um novo advento ganhou popularidade entre os mais experientes: o videolaringocópio.

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O uso do videolaringoscópio no ambiente da UTI é recomendado e garante uma melhor visualização da via aérea. Contudo, apesar da melhor visualização da glote e das cordas vocais, inserir o tubo na traqueia ainda é um desafio. Garantir uma abertura de glote satisfatória durante a videolaringoscopia não necessariamente garantirá sucesso na intubação. Por isso, o uso desse dispositivo é indicado em pacientes com MACOCHA < 3 com falha de intubação ou pacientes com MACOCHA ≥ 3 (apenas na presença de um operador experiente, com pelo menos 50 intubações simuladas com videolaringoscópio).

Manejo hemodinâmico e escolha de drogas

A otimização hemodinâmica no paciente candidato à IOT é essencial para prevenir o colapso circulatório durante o procedimento e, consequentemente, evitar o aumento da mortalidade em 28 dias dentro da UTI. Como forma de prevenção, a avaliação de fluido responsividade seguida de expansão volêmica adequada e o uso precoce de vasopressores são alternativas para compensação hemodinâmica pré-intubação.

Já a escolha das drogas utilizadas na sequência rápida de intubação também possui efeito direto sobre a hemodinâmica do paciente. É importante que, após garantida a analgesia do paciente, a escolha do hipnótico seja individualizada.

O etomidato é o hipnótico de melhor perfil hemodinâmico, uma vez que promove poucas alterações a níveis pressóricos, porém deve ser evitado em pacientes sépticos por risco de supressão adrenal. Já a cetamina garante um efeito broncodilatador e pode ser usada com maior segurança em pacientes hipotensos. Contudo, deve ser evitada se houver risco de hipertensão craniana. Por fim, o uso do propofol e do midazolam está associado a um maior risco de hipotensão, devendo ser usado com cautela.

O uso de bloqueadores neuromusculares durante a IOT também é recomendado. A succinilcolina possui um efeito rápido e permite uma melhor visualização da glote, todavia deve ser evitado em pacientes com insuficiência renal e/ou hipercalemia. Como opção alternativa, há o rocurônio, o qual, apesar de um efeito mais tardio, pode ser revertido com o antídoto sugamadex.

Conclusão

É fato que a intubação orotraqueal compreende um dos procedimentos mais comuns e, ao mesmo tempo, mais desafiadores dentro do ambiente da UTI. A obtenção de sucesso na primeira tentativa de intubação impacta, diretamente, na incidência de complicações relacionadas ao procedimento, como hipóxia e colapso circulatório.

A predição de vias aéreas potencialmente difíceis pode ser feita por meio de scores validados pela literatura, como o score de MACOCHA. Além disso, garantir um aporte de oxigênio adequado de modo a prolongar o tempo de apneia sem dessaturação é importante e deve ser individualizado, tendo como melhores alternativas o uso da VNI+CNAF ou do dispositivo bolsa-válvula-máscara.

Conhecer os dispositivos disponíveis para a intubação e possuir domínio sobre eles garante maiores taxas de sucesso durante o procedimento, devendo o videolaringoscópio ser utilizado sempre que indicado na presença de um profissional experiente. Por fim, otimizar hemodinamicamente o paciente pré-intubação e garantir uma sedoanalgesia individualizada seguida de bloqueio neuromuscular facilitam a obtenção de sucesso na primeira tentativa de intubação.

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