O processo de morte e morrer de pacientes com Covid-19

Muitos de nós perderam entes queridos durante a pandemia da Covid-19. Num cenário de mais de 200 mil mortes, como lidar com tantas perdas?

A pandemia causada pela Covid-19 trouxe diversos problemas à humanidade. O sistema de saúde da Itália entrou em colapso dois meses depois da descoberta do vírus na China. Com um alto poder de disseminação, o vírus apresentou um comportamento inesperado, nunca antes observado pela sociedade, culminando em uma desastrosa pandemia, gerando graves danos econômicos, sociais e principalmente  em relação à saúde da população. Assim, causa uma temeridade na sociedade, inclusive no processo de morrer pelo coronavírus.

Medidas de isolamento social rapidamente foram recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). No entanto, muitos estados não seguiram as orientações. No Brasil tivemos um entrelace político que atrapalhou medidas mais eficazes, não saindo do Governo Federal um ordenamento condizente com a sociedade acadêmica e com as orientações da OMS. Muitas perdas aconteceram no ano de 2020 e continuamos nessa terrível realidade em 2021, aguardando respostas das autoridades de saúde com soluções por meio da imunização. 

Covid-19

A Covid-19 já causou mais 200 mil mortes no Brasil

Muitos de nós perderam entes queridos, outros presenciaram, enquanto profissionais da saúde, a morte de muitos usuários do serviço de saúde. Famílias sofrendo, profissionais trabalhando em uma realidade complexa, não conseguindo gerar ações de cuidado por impossibilidade. O Amazonas apresentou no início de janeiro de 2021, uma das piores realidades enfrentadas pelo Brasil. A falta de oxigênio no estado ocasionou diversos óbitos e gerou uma comoção nacional na tentativa de subsidiar a compra do material. Tudo isso para evitar maiores danos e a morte das pessoas.

A morte é algo discutido historicamente em nossa sociedade, desde o começo dos tempos. Em algumas culturas a morte era uma dádiva, em outras o encontro com o divino. Na sociedade atual, com o desenvolvimento da ciência, a morte é constantemente adiada. A ciência consegue gerar uma sobrevida com qualidade a todos nós. O conhecimento contribui para o aumento da expectativa de vida. No entanto, a atual pandemia gerou na sociedade um temor no encontro com a morte. Na verdade, a interrupção natural da vida não ocasionada pelo envelhecimento, mas por doença ou problemas de saúde, associa-se ao medo de se ver diante do mesmo processo, gerando uma infinidade de problemas à existência humana.  

De acordo com Silva et.al. (2020), a morte pode ser considerada um fenômeno que gera sentimentos de medo, angústia e exacerbação de sintomas ansiosos. Mesmo fazendo parte do processo natural é um tabu. O enfrentamento em condições naturais já é um desafio para a maioria,  mas da forma abrupta que está acontecendo, sendo qualquer pessoa possível vítima, independente das variáveis, gera pânico e uma relação conflitante com o processo de morte, seja em relação a si, ou em relação a membros da família ou entes queridos. 

As crenças sobre a morte nascem pelo aprendizado do meio social. Pensando na prática de cuidado, na dimensão espiritual, pode o profissional de saúde realizar discussões com a equipe, com familiares e com o próprio usuário, de como lidar com o incerto, em relação a Covid-19. Uma lógica de cuidado que vise o bem-estar espiritual pode gerar amparo frente ao despreparo daqueles que pensam na iminência da morte, ligado a presença de diagnóstico de coronavírus.

Muitas instituições de saúde recebem auxílio religioso, principalmente em relação à terminalidade, no entanto, a velocidade do adoecimento e dos óbitos vem gerando uma necessidade de discussão na medida preventiva sobre o processo iminente de morte e morrer. Silva et.al. (2020), revela que há lacunas nos estudos e nas ações voltadas ao enfrentamento do processo de morte e morrer. Em especial no cenário da pandemia, essas ações ficam mais escassas e não se apresentam como uma lógica de cuidado em saúde. Os sentimentos ocasionados pelo isolamento social também podem gerar vários questionamentos e esses devem ser esclarecidos pelos profissionais de saúde.

A prevenção pode tornar o processo menos doloroso?

O processo de morte e a relação com a iminência de adoecimento, os profissionais de saúde podem gerar discussões no nível da prevenção de adoecimentos e na promoção da saúde por meio dessa discussão, uma vez que o enfermeiro possui proximidade com os usuários e são os responsáveis pelas principais ações de cuidado. Dessa forma, pode-se buscar: 

  • Discutir o processo de morte e morrer, de si e de seus familiares;
  • Esclarecer quanto às incertezas do usuário;
  • Discutir sobre espiritualidade e a compreensão subjetiva da pessoa sobre tal processo;
  • Refletir sobre as perdas familiares e de entes queridos, mesmo de conhecidos;
  • Esclarecer as questões discutidas pela mídia e sua influência;
  • Discutir sobre ansiedade relacionada ao processo de morte e morrer;
  • Pensar em soluções junto aos usuários do serviço para diminuir pensamentos negativos em relação ao adoecimento;
  • Acolher e confortar pessoas que tiveram perdas familiares ou afetivas;
  • Quando a pessoa estiver no processo de adoecimento, tranquilizar a pessoa e sua família;
  • Explicar o processo terapêutico e os sinais e sintomas da doença, tranquilizando em relação ao prognóstico, mantendo atitude positiva;
  • Reforçar a importância das crenças individuais e subjetivas em relação à religião.

Ultrapassamos 200 mil mortes no Brasil. Estamos todos de luto! Por trás de cada um desses números temos pais, avós, filhos, netos, primos, tios, vizinhos, conhecidos. Membros da comunidade foram levados abruptamente por um mal invisível e avassalador. Além disso, há o problema em relação ao tratamento, que preocupa a possibilidade de cuidado. Visto os casos do AM, que geraram comoção nacional.

Todos precisamos de cuidado. Todos nós precisamos reforçar medidas de cuidado em saúde mental e compreender os processos de infecção, adoecimento e morte. Sim, morte. Temos que ter subsídios para trabalhar o processo tanatológico. Este é muito esquecido na sociedade e refutado de forma cultural. Uma vez que o encontro com a morte no ocidente é relacionado à negação ou ao fim. 

No que diz respeito à prevenção do adoecimento pela antecipação da percepção do sentimento de morte, causado pelo encontro com a Covid-19, temos que agir rapidamente, evitando maiores complicações. Assim, essa discussão se torna necessária e edificante para as práticas de saúde. 

 

Referências bibliográficas:

  • Crepaldi, M A, et.al. Terminalidade, morte e luto na pandemia de COVID-19: demandas psicológicas emergentes e implicações práticas. Estudos de Psicologia (Campinas)37,  Epub June 01, 2020.
  • De Paula GS, et.al. A enfermagem frente ao processo de morte e morrer: uma reflexão em tempos de Coronavírus. J. nurs. health. 2020;10(n.esp.):e20104018
  • Silva M da CQ dos S da, Vilela ABA, Silva RS da, Boery RNS de O. O processo morrer e morte de pacientes com Covid-19: uma reflexão à luz da espiritualidade. Cogitare enferm,  2020.

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