O que fazer com imunossupressores da paciente que está planejando a gestação?

Neste artigo revisaremos os principais ajustes no tratamento que precisam ser feitos para cada etapa da gestação da paciente com DRIM.

Os imunossupressores e imunomoduladores (incluindo os medicamentos modificadores do curso da artrite reumatoide e outras doenças reumáticas [MMCD]) são frequentemente prescritos para pacientes em idade reprodutiva, visto que as doenças reumáticas imunomediadas (DRIM) e outras doenças autoimunes são mais frequentes nessa parcela da população. Dessa maneira, não é de se surpreender que as pacientes apresentem desejo de gestação ao longo do tratamento da sua doença.

Um complicador nessa situação é que as gestantes são sempre excluídas de ensaios clínicos pivotais, uma vez que desconhecemos o potencial teratogênico de novas drogas. Consequentemente, as decisões que são tomadas relativas ao uso de determinados medicamentos nesse contexto são derivadas da análise de de estudos de vida real, nos quais as pacientes engravidam em uso dessas drogas sem o consentimento médico.

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Com base nisso, a ideia geral é tentar usar o mínimo de medicamentos durante a gestação, sempre que possível, visto que esse potencial teratogênico é amplamente desconhecido. No entanto, devemos sempre considerar o risco de reativação da doença de base da paciente, que pode ser inúmeras vezes mais danosa do que o uso de medicamentos considerados seguros na gestação. Essa análise de risco/benefício é que nos auxiliará na melhor tomada de decisão.

Nessa revisão, vamos passar pelas diversas fases da gestação, descrevendo os principais ajustes no tratamento que precisam ser feitos para cada etapa, caso a paciente portadora de DRIM em uso de imunossupressor/imunomodulador manifeste o interesse em gestar.

O que fazer com imunossupressores da paciente que está planejando a gestação

Paciente sem desejo de gestar

Nesse contexto, o uso de qualquer medicamento é autorizado, desde que sejam tomados os devidos cuidados. Caso a paciente inicie o uso de medicamentos teratogênicos, como o metotrexato, leflunomida, micofenolato mofetil e ciclofosfamida, ou de medicamentos que desconhecemos o impacto gestacional, como biológicos não anti-TNF e inibidores da JAK, deve ser oferecida contracepção de alta eficácia, como DIU ou progestágenos (orais ou injetáveis). Lembre-se: a ausência de desejo de gestar não significa que a paciente não vá engravidar!

Período pré-concepcional

Nessa fase, a paciente está em programação para início das tentativas de engravidar. Sendo assim, esse é o melhor momento para se realizar os ajustes terapêuticos para que a paciente esteja livre de drogas teratogênicas por um período seguro antes do início das tentativas, o que varia de um medicamento para o outro.

Para que a paciente seja autorizada a engravidar, o ideal é que a doença de base esteja sob bom controle por, no mínimo, 6-12 meses. Isso ajuda a garantir um menor risco de reativação e, consequentemente, melhorar os desfechos gestacionais.

Nessa fase, os seguintes medicamentos devem ser suspensos (com seus respectivos tempos de suspensão antes da concepção):

  • Metotrexato: pelo menos 1 mês (geralmente 3 meses);
  • Leflunomida: pelo menos 3 meses. Nesse caso, devemos fazer uso da colestiramina na dose de 11 g 8/8 horas por 11 dias para auxiliar no washout da droga;
  • Ciclofosfamida: pelo menos 3 meses;
  • Micofenolato: pelo menos 6 semanas (geralmente 3 meses);
  • Inibidores da JAK (iJAK): pelo menos 2 semanas;
  • Biológicos não anti-TNF: geralmente 3 meses, mas faltam dados conclusivos.

No entanto, para manter o bom controle da doença, outros medicamentos podem ser introduzidos, em substituição àqueles teratogênicos, como: prednisona (na menor dose necessária), hidroxicloroquina, sulfassalazina, azatioprina, ciclosporina, tacrolimo, imunoglobulina endovenosa humana, infliximabe, etanercepte, adalimumabe, golimumabe, certolizumabe.

Após a troca, como uma boa estratégia prática, podemos observar a paciente durante 1-3 meses antes de liberá-la para concepção, de modo a verificar se houve reativação do quadro (o que agravaria os desfechos gestacionais).

Saiba mais: Novos guidelines sobre uso de medicamentos da reumatologia na gestação e lactação

Primeiro trimestre da gestação

Nesse período, as drogas que são consideradas seguras para uso na gestação, conforme descrito na seção anterior, podem ser mantidas. Relembrando, são as seguintes: prednisona (na menor dose necessária), hidroxicloroquina, sulfassalazina, azatioprina, ciclosporina, tacrolimo, imunoglobulina endovenosa humana, infliximabe, etanercepte, adalimumabe, golimumabe, certolizumabe.

Segundo e terceiro trimestre da gestação

É nesse período que se intensifica a transferência placentária de anticorpos IgG da mãe para o feto. Desse modo, as medicações biológicas que são anticorpos monoclonais necessitam de suspensão nesse momento, caso seja possível. Os períodos de suspensão são os seguintes:

  • Infliximabe: interromper com 20 semanas;
  • Etanercepte: interromper com 32 semanas;
  • Adalimumabe: interromper com 28 semanas;
  • Golimumabe: interromper com 28 semanas.

Caso o paciente tenha interrompido essas medicações nos períodos preconizados, a Sociedade Britânica de Reumatologia recomenda que o neonato pode receber o esquema vacinal normalmente. Do contrário, as vacinas de microrganismos atenuados (incluindo TB) devem ser postergadas até os 6 meses de idade. Dica prática: caso as vacinas atenuadas estejam proscritas nesse momento, é importante informar ao berçário sobre essa contraindicação, já que a BCG é aplicada já na maternidade, até o momento da alta.

Lactação

Após o nascimento da criança, também são necessárias orientações relativas ao uso dos medicamentos durante a lactação. De modo geral, as medicações seguras na gestação também são seguras na lactação.

Com relação aos biológicos, apesar da falta de estudos com todas as classes, por serem macromoléculas com pouca passagem para o leite materno e que sofrem digestão ao serem digeridas pelo trato gastrointestinal do neonato, especialistas consideram o seu uso seguro na gestação, independente da classe.

O metotrexato, a leflunomida, o micofenolato, a ciclofosfamida e os inibidores da JAK são pequenas moléculas com amplo potencial de passagem para o leite materno; assim, não devem ser administrados durante a lactação, sob o risco de transferência no leite materno e efeitos deletérios para o neonato.

Conclusão

O uso de medicamentos imunossupressores/imunomoduladores na gestação deve ser feito de maneira cautelosa. O conhecimento daqueles que podem ser utilizados com segurança em cada período da gestação é fundamental para uma prescrição correta neste contexto.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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