O que sabemos sobre ortoceratologia no controle da miopia?

Recentemente foi considerada um dos tratamentos mais efetivos no controle da miopia, com eficácia similar a atropina. Conheça estudo.

A ortoceratologia utiliza lentes especialmente desenhadas para uso noturno com o objetivo de remodelar a córnea e corrigir o erro refrativo, particularmente a miopia. A melhora da acuidade visual sem correção que acompanha a redução temporária do erro refrativo é obtida por aplanamento da curvatura corneana central com lentes rígidas especiais chamadas lentes de geometria reversa. Essas lentes são capazes de reduzir a dependência do uso diário de lentes de contato ou óculos. A eficácia e segurança da ortoceratologia (OK) moderna foi demonstrada em vários estudos.

Desde os anos 2000 tem se discutido a utilização da OK para o controle da miopia. Vários estudos foram publicados mostrando a efetividade da OK no controle da progressão. Recentemente foi considerada um dos tratamentos mais efetivos no controle da miopia, com eficácia similar a atropina. Um artigo publicado esse ano na Eye and Contact Lens revisou a literatura sobre a eficácia da OK no controle da miopia.

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O mecanismo aceito seria de que a OK diminuiria a progressão baseada na teoria da refração periférica em que o borramento retiniano periférico hiperópico seria importante gatilho para o alongamento axial e progressão miópica. OK induz um formato oblado da córnea (córnea central aplanada e média periferia encurvada) levando a área circular de miopia periférica aumentada na superfície corneana. Isso reduz o defocus hiperópico periférico diminuindo o feedback visual para alongamento do olho. Alguns artigos também já encontraram forte associação entre aberração esférica positiva e diminuição do alongamento axial em crianças tratadas com OK. As aberrações de alta ordem tem importante papel na progressão da miopia em crianças mas como atuam ainda não se sabe ao certo.  

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Estudo

O primeiro estudo foi publicado em 2005 por Cho et al monitorando o crescimento axial em 35 crianças (7-12 anos) submetidas a OK e comparando com um grupo usando visão simples. Após dois anos o alongamento axial foi de 0.29±0.27 mm e  0.54±0.27 mm no grupo OK e visão simples respectivamente, indicando que o alongamento axial foi 46% menor no grupo da OK. Walline et al. também reportaram uma mudança significativa no comprimento axial em 2 anos em 28 crianças (8-11 anos) tratadas com OK (0.25mm x 0.57mm), correspondendo a uma diminuição de 55% no alongamento axial. 

Outros estudos não randomizados confirmam a teoria. O primeiro estudo controlado randomizado chamado ROMIO (retardation of myopia in orthokeratology) foi conduzido em Hong Kong por Cho et al. Nesse estudo os participantes de 6 a 10 anos foram randomicamente colocados no grupo OK ou visão simples. 78 pacientes (37 OK x 41 grupo controle) completaram o estudo uma diferença significativa no alongamento axial foi encontrada (0.36mm x 0.63mm), indicando redução de 43% no grupo OK. O controle da miopia em crianças com alta miopia foi avaliado por Charm et al. usando uma combinação de redução parcial com OK e óculos para o erro refrativo residual. Na prática foi feita uma redução miópica de 4 graus com a OK e correção do restante com óculos. Um total de 28 participantes (12 com OK e 16 no grupo controle) com refração entre -5.50 e -8.25 completaram o estudo mostrando um alongamento axial de 0.19x 0.51 (no controle).  Comparando os grupos o alongamento axial foi 63% menor no grupo com redução parcial com OK. Para avaliar a eficácia do desenho tórico nas lentes de OK, Chen et al conduziram o estudo TO-SEE (myopia control using toric orthokeratology) com crianças com miopia e moderado a alto astigmatismo. Um total de 35 OK e 23 controles (de 6 a 12 anos) com astigmatismos de 1.25 a 3.50 completaram o estudo os 2 anos. A média de alongamento axial foi de 0.31x 0.64 respectivamente (52% menor no grupo tratado com OK tórica).  O efeito inibitório da OK na progressão também foi investigada em pares de gêmeos idênticos. O gêmeo A foi tratado com OK e o gêmeo B usou somente óculos de visão simples. O alongamento axial foi de 11%x 87% (Ax B – olho direito) e 48%x 67% (AxB – olho esquerdo), demonstrando a efetividade da OK no controle da miopia. 

De 2015 a 2016, 4 meta análises foram publicadas. Si et al. conduziram uma meta análise de 7 estudos envolvendo 435 pacientes de 6 a 16 anos. Foi encontrada diferença de  −0.26 mm no alongamento no grupo OK e controle em 2 anos. Wen et al. publicaram revisão sistemática de 8 estudos envolvendo 769 pacientes e reportaram uma diferença significativa no aumento do entre o grupo OK 3 controle, indicando uma diferença de -0.25mm entre os grupos em 2 anos.  Sun et al em outra metanálise encontrou 0.27mm de diminuição no alongamento axial no grupo OK quando comparado com o grupo controle, indicando uma redução na progressão de 45%. Em outra metanálise. Li et al. utilizaram 9 estudos com 667 crianças de 6 a 16 anos e mostraram que a diferença da média do alongamento axial em 2 anos nos estudos clínicos  foi de −0.28 mm e nas coort3s de −0.27 mm e o efeito foi maior em crianças com miopia moderada a alta em comparação com crianças com baixa miopia (−0.35 vs. −0.25 mm). Dados esses resultados concluiu se que a ortoceratologia foi eficaz e com maior controle da miopia em crianças com maior miopia inicial. 

Em relação a estudos com maior tempo de acompanhamento, Hiraoka et al acompanharam 43 crianças por 5 anos e o alongamento axial foi de 0.99 no grupo ortoceratologia X 1.41 no grupo controle, indicando uma diminuição no alongamento axial de 30%. Além disso os pacientes no grupo OK tiveram alongamento axial anual  progressivamente menor durante 3 anos. O mesmo não aconteceu no quarto e quinto anos. Outro estudo longo conduzido por Santodomingo-Rubido et al. com 7 anos de follow up de 30 pacientes com alongamento axial 0.44mm menor no grupo OK, correspondendo a uma redução de 33%. Recentemente Hiraoka et al. divulgaram estudo retrospectivo de 10 anos em total de 92 pacientes com idade entre 8 e 16 anos, comparando as taxas de progressão entre OK e lentes de contato gelatinosas, encontrando que a progressão foi significativamente menor no grupo OK, exceto no grupo de 16 anos. Não houve diferença entre o número de eventos adversos entre os grupos.  Esses dados suportam a eficácia e segurança da ortoceratologia. 

Resultados

Cho et al analisaram a combinação dos resultados dos estudos ROMIO e TO SEE para investigar a influência da OK na progressão rápida da miopia, definida com aumento anual do CA maior que 0.36mm. O risco relativo de progressão rápida teve diferença no grupo mais jovem (6-8 anos).  Dessa forma a OK poderia prevenir a rápida progressão em crianças mais jovens em um tratamento de 2 anos, sugerindo se que o tratamento deva ser começado em crianças menores. 

Kinoshita et al demonstraram o efeito aditivo da OK com atropina 0,01% em 40 crianças de 8 a 12 anos. O alongamento axial foi de 0.09mm no grupo combinado e 0.19mm no grupo com monoterapia em 1 ano. No acompanhamento de 2 anos, o alongamento axial foi 0.29x 0.40 respectivamente. O efeito aditivo na terapia combinada foi maior em crianças com menor miopia inicial (−1.00 to −3.00 D). Tan et al avaliaram 58 pacientes com a mesma divisão de grupos. No primeiro ano a diferença foi de 0.07mm no grupo combinado e 0.16 no grupo monoterapia. 

A ortoceratologia tem diversas vantagens: a eficácia no controle da miopia, a conveniência no uso noturno para os pacientes que não querem usar óculos ou lentes durante o dia, a liberdade para aqueles que praticam esportes ou necessitam de visão segura sem depender de nada ao longo do dia. Como desvantagem sabemos que em crianças precisa haver supervisão e controle dos pais no manuseio das lentes, a irregularidade e as aberrações de alta ordem podem ser uma desvantagem, a redução na sensibilidade ao.contraste. Outras complicações insignificantes como depósito de ferro, linhas fibrilares, alterações transitórias na biomecânica também foram reportadas.  Além disso o uso noturno pode estar associado a aento do risco de infecção corneana. Um estudo multicêntrico de larga escala reportou uma incidência de 7.7 casos por 10000 usuários ano. Os pacientes devem ser bem orientados em relação ao uso, seguindo os regimes de cuidado e follow ups regulares para prevenir complicações. 

Conclusão 

O estudo conclui que a OK é eficiente no controle da miopia geralmente inibindo o crescimento axial em dois anos em 32 a 63% a depender do estudo. A possibilidade de rebote após cessar o tratamento e a duração ideal do tratamento ainda são discutidos.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Hiraoka T. Myopia Control With Orthokeratology: A Review. Eye Contact Lens. 2022 Mar

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