Piúria é um dado isolado confiável para o diagnóstico de bacteriúria?

Um artigo publicado em setembro buscou estabelecer uma correlação entre intensidade da piúria e diagnóstico de bacteriúria. 

Um artigo publicado em setembro de 2022, no periódico The American Journal of Medicine, por pesquisadores de Blacksburg, Virgínia, buscou estabelecer uma correlação entre intensidade da piúria e diagnóstico de bacteriúria. 

Apesar de não haver dados provenientes de ensaios clínicos randomizados que estabeleçam tal regra, é comum encontrarmos nos guidelines das sociedades de clínica médica, nefrologia, urologia e infectologia a máxima de que não devemos tratar como infecção urinária pacientes que apresentem bacteriúria assintomática e/ou com achado de piúria no exame simples de urina com algumas exceções. Tal constatação é, portanto, considerada boa prática clínica e deve ser ainda utilizada no dia a dia.  

No entanto, quando levamos em consideração pacientes que se encontram em situações especiais, como pacientes diagnosticados com uma demência de base ou em delirium e que não conseguem referir sintomas adequadamente, o encontro de bacteriúria ou piúria pode levantar suspeitas quanto à necessidade de tratamento de uma possível infecção urinária (rotineiramente realizado na prática clínica).  

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Diante deste contexto, os pesquisadores tentaram estabelecer, através de um estudo observacional e com características retrospectivas, um ponto de corte adequado em que fosse possível correlacionar as chances de um paciente apresentar bacteriúria (independente se clinicamente significativa ou não) com base nos níveis de piúria, definida em termos de células (leucócitos)/campo de grande aumento (cga). Os dados disponíveis na literatura e que abordam a mesma questão até o momento são contraditórios.

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Métodos 

Utilizaram-se dados de 46.127 pacientes em regime de internação hospitalar obtidos a partir de registros de um provedor de saúde privado dos Estados Unidos no intuito de estabelecer uma correlação entre intensidade da piúria (observada em amostra de urina não-centrifugada) versus diagnóstico de bacteriúria. 

Os pesquisadores se utilizaram do CID-10 atribuído a cada paciente no registro para identificar aqueles que foram rotulados como tendo infecção de trato urinário (N39.0). A partir de então buscaram nos dados laboratoriais resultados de análise de urina simples e urocultura atribuídas a esses pacientes. 

Do total de pacientes analisados, 21% eram do sexo masculino e 3% apenas apresentavam história de cateterismo vesical ou procedimento invasivo de vias urinárias.  

Aqueles que apresentaram na urocultura crescimento de fungos ou vírus foram excluídos da amostra. Esses exames foram então estratificados quanto aos resultados em: 0-5 células/cga, 5-10 células/cga, 10-25 células/cga, > 25 células/cga. Foi definido como bacteriúria qualquer crescimento bacteriano observado. Foi definido como bacteriúria de significado clínico os casos com ≥ 1 x 105 unidades formadoras de colônia/microlitro (ufc/mL).

Os resultados foram plotados na curva ROC para determinação da sensibilidade e especificidade do teste e resultados com área abaixo da curva (AUC) > 0,7 foram indicativos de acurácia moderada, enquanto valores de AUC > 0,8 foram estabelecidos como boa acurácia. 

Resultados 

Utilizando-se dos estratos propostos (mencionados no tópico acima), os pesquisadores encontraram, respectivamente: 25,4%, 28,2%, 33%, 53,8% de positividade nas uroculturas para crescimento bacteriano. Assim, o ponto de corte mais adequado em termos de equilíbrio entre sensibilidade e especificidade para o desfecho primário proposto foi de > 25 células/cga. No entanto, outro dado pôde ser observado: dentre os resultados positivos observados dentro de cada grupo, pelo menos 79,7% destes evidenciaram uma bacteriúria com significância clínica.

Dessa forma, apesar das diferenças estatísticas observadas na incidência de bacteriúria entre os diferentes grupos de piúria, tal informação não se provou válida clinicamente para diferenciar qual grupo poderia se beneficiar de um possível tratamento. A AUC geral obtida para piúria em termos de correlação com a presença de bacteriúria foi de 0,637 sendo insuficiente em acurácia para estabelecer tal vínculo.

Conclusão 

Podemos discutir diversas limitações do estudo desde a alta porcentagem de pacientes do sexo feminino (aproximadamente 80%), dificultando generalizações, até o design do mesmo. Podemos inclusive questionar se pacientes com piúria > 25 células/cga deveriam ser mais bem investigados quanto a uma possível infecção urinária (ITU) de base. No entanto, cabe aqui recomendar que piúria como dado isolado não deve ser abordado como ITU.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Cheng B, Zaman M, Cox W. Correlation of Pyuria and Bacteriuria in Acute Care. Am J Med. 2022;135(9):e353-e358. doi:10.1016/j.amjmed.2022.04.022 

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