Paciente do sexo masculino, 36 anos, iniciou com dor tipo cólica no andar inferior do abdome e dor em membros inferiores há dois dias. Qual o diagnóstico?
Quiz
Limite de tempo: 0
Sumário do Quiz
0 de 1 questões completadas
Perguntas:
1
Information
Quiz PEBMED
Você já fez este questionário anteriormente. Portanto, não pode fazê-lo novamente.
Quiz is loading...
You must sign in or sign up to start the quiz.
Para iniciar este questionário, você precisa terminar, antes, este questionário:
Resultados
0 de 1 perguntas respondidas corretamente
Seu tempo:
Acabou o tempo
Você conseguiu 0 de 0 pontos possíveis (0)
Categorias
Sem categoria0%
1
Respondido
Revisão
Pergunta 1 de 1
1. Pergunta
Introdução do caso:
Paciente do sexo masculino, 36 anos, iniciou com dor tipo cólica no andar inferior do abdome e dor em membros inferiores há dois dias. Portador de anemia falciforme, com múltiplas transfusões sanguíneas prévias, e de hepatopatia crônica fibrosante de diagnóstico recente. Nega etilismo e história familiar de hepatopatias. Diagnosticada crise álgica secundária à drepanocitose, sendo realizada admissão hospitalar para propedêutica laboratorial e de imagem – ressonância magnética (RM) do abdome –, a fim de elucidar a etiologia da hepatopatia.
Imagem 1: Ressonância magnética do abdome superior, ponderação em T2, corte axial, nível de L2.
Imagem 1: Ressonância magnética do abdome superior, ponderação em T2, corte axial, nível de L2.
Imagem 2: Exames laboratoriais com resultados e valores de referência. AST (aspartato aminotransferase), ALT (alanina aminotransferase), GGT (gama glutamil transpeptidase), FA (fosfatase alcalina), IST (índice de saturação de transferrina).
Pergunta: Com base na história clínica, nos exames laboratoriais e na RM, qual a etiologia mais provável da hepatopatia?
Correto
Imagem 1: Ressonância magnética do abdome superior, ponderada em T2, corte axial, nível de L2. Fígado de dimensões reduzidas, contornos irregulares e significativo hipossinal sugestivo de sobrecarga férrica (vermelho). Sem sinais de dilatação das vias biliares intra e extra-hepáticas. Baço ausente (status pós-esplenectomia). Esse exame foi utilizado para análise quantitativa da concentração hepática estimada de ferro: ver Imagem 3.
Imagem 3: Avaliação da concentração hepática de ferro em RM de abdome pelo software MRQuantIF (Pr Yves Gandon, Université de Rennes). São escolhidas três regiões de interesse em lobo hepático direito e duas áreas em musculatura paravertebral para análise da intensidade do sinal e de sua queda à medida que o tempo de eco se prolonga – compara-se a intensidade hepática à muscular pois este é um tecido que não sofre deposição de ferro. As médias da intensidade de sinal das medidas hepáticas e musculares são usadas para cálculo da razão de intensidade de sinal (RIS), a partir da qual se obtém a concentração hepática estimada de ferro (CHEF). No gráfico, o eixo “y” representa a intensidade de sinal na RM e o eixo “x”, o tempo de eco. O traçado em amarelo demonstra a queda de intensidade de sinal no tecido hepático e, o traçado em rosa, no tecido muscular. A análise desses valores foi compatível com sobrecarga férrica, com concentração estimada em 476 µmol/g (VR < 36µmol/g).
Hepatopatia crônica fibrosante (HCF) sem causa definida requer definição etiológica por ser potencialmente tratável. Sorologias para hepatites virais negativas, autoanticorpos não reagentes, hiperferritinemia e aumento do índice de saturação de transferrina sugerem sobrecarga férrica.
Sobrecarga férrica pode ser secundária ao excesso de ferro administrado por via parenteral (v.g. transfusões múltiplas) ou por elevada absorção (v.g. hemocromatose hereditária). A história prévia de múltiplas transfusões, com afastamento de outras causas de hepatopatia, etilismo e história familiar de hemocromatose, sugerem sobrecarga secundária de ferro como etiologia da HCF.
Como o ferro não tem mecanismo de excreção ativa no corpo humano, seu excesso é absorvido por hepatócitos, cardiomiócitos e células de órgãos endócrinos, nos quais o ferro reage com o peróxido de hidrogênio produzindo espécies oxidantes que danificam o tecido, cursando com inflamação e fibrose. São consequências da sobrecarga de ferro: HCF, defeitos de condução cardíaca, diabetes mellitus e alterações pituitárias.
Para confirmação diagnóstica, o padrão-ouro é a biópsia hepática – exame invasivo e com considerável morbidade. Como alternativa, realizam-se exames de imagem, sendo a ressonância magnética (RM) com quantificação de ferro o principal deles (Figura 1) por permitir a quantificação da sobrecarga férrica, conforme descrito previamente, além de não empregar radiação ionizante. A tomografia computadorizada (TC) é outra opção, mas não é capaz de fazer essa quantificação (Figura 2).
Neste caso, a doença de Wilson é um diagnóstico diferencial importante de hepatopatia com ceruloplasmina baixa. No entanto, dizem contra essa possibilidade a dosagem de cobre urinário de 24h normal, história familiar negativa para hepatopatia e ausência de sintomas neuropsiquiátricos e de anéis de Kayser-Fleischer nos olhos.
A doença hepática gordurosa não-alcoólica, por sua vez, é um diagnóstico de exclusão. Seu aspecto ultrassonográfico é semelhante ao da hemocromatose (hiperecogenicidade do parênquima hepático), porém a cinética do ferro auxilia no diagnóstico diferencial. Além disso, na RM, o padrão da esteatose é de hipersinal em T2, enquanto o da hemocromatose apresenta hipossinal. À TC, por outro lado, a esteatose se traduz com hipoatenuação do parênquima hepático e a hemocromatose por hiperatenuação.
Há ainda a hepatite autoimune, que deve ser pesquisada especialmente em hepatopatas jovens. É mais prevalente em mulheres, com pico entre 10 e 30 anos, e está associada com positividade de autoanticorpos (FAN, anti-músculo liso e anti-LKM1) e hipergamaglobulinemia, devendo ser confirmada por meio de exame anatomopatológico (ver caso 312).
O tratamento da HFC secundária à sobrecarga de ferro implica flebotomias seriadas, quando os parâmetros hematimétricos dos pacientes permitem, e uso de quelantes do ferro, nos significativamente anêmicos. Os pacientes que recebem transfusões sanguíneas devem monitorar periodicamente a ferritina sérica, com alvo menor que 1000 a 1500 ng/mL.
Figura 1: Ressonância magnética, abdome superior, ponderação em T2, corte axial, nível de L2. (A) Fígado com concentração estimada de ferro dentro dos limites de normalidade. (B) Fígado com sobrecarga férrica. Observa-se evidente diferença de intensidade de sinal entre os fígados. Fonte: Bourbon Filho et al 2011.
Figura 2: Tomografia computadorizada, abdome superior, sem administração de meio de contraste, corte axial, nível de L2. Fígado de dimensões aumentadas com parênquima hiperatenuante difusamente, sugestivo de doença de depósito hepático. Fonte: Radiopedia, caso cortesia do Dr. Abdallah Al Khateeb. Acessado em 10 de junho de 2019. Disponível em radiopaedia.org/cases/secondary-haemochromatosis-1?lang=us.
Referências bibliográficas:
Leonis MA, Balistreri WF. Outros transtornos metabólicos hereditários do fígado. In: Feldman M, Friedman LS, Brandt LJ. Tratado gastrointestinal e doenças do fígado. 9 ed. Rio de Janeiro. Elsevier. 2014. p. 1283-1305.
Bourbon Filho LA, Ferrão TO, França AVC, Rocha RD, Dantas LD, Carvalho LFP, Moreira MDAB, Cipolotti R. Sobrecarga de ferro transfusional em portadores de anemia falciforme: comparação entre ressonância magnética e ferritina sérica. Radiol Bras. 2011;44(3):151-155.
Pinho IF, Nobeschi L, Goto RE, Munhoz BNS, Melo HJF. A importância da ressonância magnética no diagnóstico da hemocromatose hereditária. Atas de Ciência da Saúde. 2014;(2):01-13.
Schrier SL, Bacon BR, Kwiatkowski J. Approach to the patient with suspected iron overload. In: UpToDate.
Incorreto
Imagem 1: Ressonância magnética do abdome superior, ponderada em T2, corte axial, nível de L2. Fígado de dimensões reduzidas, contornos irregulares e significativo hipossinal sugestivo de sobrecarga férrica (vermelho). Sem sinais de dilatação das vias biliares intra e extra-hepáticas. Baço ausente (status pós-esplenectomia). Esse exame foi utilizado para análise quantitativa da concentração hepática estimada de ferro: ver Imagem 3.
Imagem 3: Avaliação da concentração hepática de ferro em RM de abdome pelo software MRQuantIF (Pr Yves Gandon, Université de Rennes). São escolhidas três regiões de interesse em lobo hepático direito e duas áreas em musculatura paravertebral para análise da intensidade do sinal e de sua queda à medida que o tempo de eco se prolonga – compara-se a intensidade hepática à muscular pois este é um tecido que não sofre deposição de ferro. As médias da intensidade de sinal das medidas hepáticas e musculares são usadas para cálculo da razão de intensidade de sinal (RIS), a partir da qual se obtém a concentração hepática estimada de ferro (CHEF). No gráfico, o eixo “y” representa a intensidade de sinal na RM e o eixo “x”, o tempo de eco. O traçado em amarelo demonstra a queda de intensidade de sinal no tecido hepático e, o traçado em rosa, no tecido muscular. A análise desses valores foi compatível com sobrecarga férrica, com concentração estimada em 476 µmol/g (VR < 36µmol/g).
Hepatopatia crônica fibrosante (HCF) sem causa definida requer definição etiológica por ser potencialmente tratável. Sorologias para hepatites virais negativas, autoanticorpos não reagentes, hiperferritinemia e aumento do índice de saturação de transferrina sugerem sobrecarga férrica.
Sobrecarga férrica pode ser secundária ao excesso de ferro administrado por via parenteral (v.g. transfusões múltiplas) ou por elevada absorção (v.g. hemocromatose hereditária). A história prévia de múltiplas transfusões, com afastamento de outras causas de hepatopatia, etilismo e história familiar de hemocromatose, sugerem sobrecarga secundária de ferro como etiologia da HCF.
Como o ferro não tem mecanismo de excreção ativa no corpo humano, seu excesso é absorvido por hepatócitos, cardiomiócitos e células de órgãos endócrinos, nos quais o ferro reage com o peróxido de hidrogênio produzindo espécies oxidantes que danificam o tecido, cursando com inflamação e fibrose. São consequências da sobrecarga de ferro: HCF, defeitos de condução cardíaca, diabetes mellitus e alterações pituitárias.
Para confirmação diagnóstica, o padrão-ouro é a biópsia hepática – exame invasivo e com considerável morbidade. Como alternativa, realizam-se exames de imagem, sendo a ressonância magnética (RM) com quantificação de ferro o principal deles (Figura 1) por permitir a quantificação da sobrecarga férrica, conforme descrito previamente, além de não empregar radiação ionizante. A tomografia computadorizada (TC) é outra opção, mas não é capaz de fazer essa quantificação (Figura 2).
Neste caso, a doença de Wilson é um diagnóstico diferencial importante de hepatopatia com ceruloplasmina baixa. No entanto, dizem contra essa possibilidade a dosagem de cobre urinário de 24h normal, história familiar negativa para hepatopatia e ausência de sintomas neuropsiquiátricos e de anéis de Kayser-Fleischer nos olhos.
A doença hepática gordurosa não-alcoólica, por sua vez, é um diagnóstico de exclusão. Seu aspecto ultrassonográfico é semelhante ao da hemocromatose (hiperecogenicidade do parênquima hepático), porém a cinética do ferro auxilia no diagnóstico diferencial. Além disso, na RM, o padrão da esteatose é de hipersinal em T2, enquanto o da hemocromatose apresenta hipossinal. À TC, por outro lado, a esteatose se traduz com hipoatenuação do parênquima hepático e a hemocromatose por hiperatenuação.
Há ainda a hepatite autoimune, que deve ser pesquisada especialmente em hepatopatas jovens. É mais prevalente em mulheres, com pico entre 10 e 30 anos, e está associada com positividade de autoanticorpos (FAN, anti-músculo liso e anti-LKM1) e hipergamaglobulinemia, devendo ser confirmada por meio de exame anatomopatológico (ver caso 312).
O tratamento da HFC secundária à sobrecarga de ferro implica flebotomias seriadas, quando os parâmetros hematimétricos dos pacientes permitem, e uso de quelantes do ferro, nos significativamente anêmicos. Os pacientes que recebem transfusões sanguíneas devem monitorar periodicamente a ferritina sérica, com alvo menor que 1000 a 1500 ng/mL.
Figura 1: Ressonância magnética, abdome superior, ponderação em T2, corte axial, nível de L2. (A) Fígado com concentração estimada de ferro dentro dos limites de normalidade. (B) Fígado com sobrecarga férrica. Observa-se evidente diferença de intensidade de sinal entre os fígados. Fonte: Bourbon Filho et al 2011.
Figura 2: Tomografia computadorizada, abdome superior, sem administração de meio de contraste, corte axial, nível de L2. Fígado de dimensões aumentadas com parênquima hiperatenuante difusamente, sugestivo de doença de depósito hepático. Fonte: Radiopedia, caso cortesia do Dr. Abdallah Al Khateeb. Acessado em 10 de junho de 2019. Disponível em radiopaedia.org/cases/secondary-haemochromatosis-1?lang=us.
Referências bibliográficas:
Leonis MA, Balistreri WF. Outros transtornos metabólicos hereditários do fígado. In: Feldman M, Friedman LS, Brandt LJ. Tratado gastrointestinal e doenças do fígado. 9 ed. Rio de Janeiro. Elsevier. 2014. p. 1283-1305.
Bourbon Filho LA, Ferrão TO, França AVC, Rocha RD, Dantas LD, Carvalho LFP, Moreira MDAB, Cipolotti R. Sobrecarga de ferro transfusional em portadores de anemia falciforme: comparação entre ressonância magnética e ferritina sérica. Radiol Bras. 2011;44(3):151-155.
Pinho IF, Nobeschi L, Goto RE, Munhoz BNS, Melo HJF. A importância da ressonância magnética no diagnóstico da hemocromatose hereditária. Atas de Ciência da Saúde. 2014;(2):01-13.
Schrier SL, Bacon BR, Kwiatkowski J. Approach to the patient with suspected iron overload. In: UpToDate.
Revisores: Gustavo Monteiro, Fernando Amorim, Bruno Campos, Luiz Gustavo, Rafael Valério, Prof. José Nelson Mendes Vieira, Profa. Viviane Santuari Parisotto Marino.
Orientador: Luciana Costa Faria, médica gastroenterologista e hepatologista, Professora Associada do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG.
Continue testando seus conhecimento em outros quizzes:
A respeito do acompanhamento desta paciente e de outros casos de abortamento provocado, qual das alternativas a seguir você deve considerar como sendo mais adequada? Clique no banner abaixo e responda no nosso fórum.