Sífilis primária: qual a abordagem do paciente?

Após um período de incubação de 10 a 90 dias (média de 3 semanas), a manifestação típica da sífilis primária é a presença de úlcera.

A sífilis é uma infecção bacteriana causada por bactérias da espécie Treponema pallidum, cuja transmissão ocorre predominantemente por via sexual. É uma doença sistêmica, crônica e curável, exclusiva do ser humano. 

Nos últimos anos, tem-se observado mundialmente um aumento no número de casos notificados de sífilis. De acordo com a estimativa mais recente da Organização Mundial de Saúde, em 2012 existiam aproximadamente 17,7 milhões de adultos entre 15 e 49 anos de idade com sífilis no mundo. Em 2016, estimou-se um número de 6,3 milhões de casos novos. 

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Devido ao seu grau de variabilidade clínica, seu diagnóstico pode ser difícil em algumas situações. Por esse motivo, é importante que o médico assistente esteja atento para suspeitar da doença e realizar o diagnóstico e indicar tratamento adequado de forma precoce. 

sífilis primária

Apresentação clínica 

A história natural da sífilis pode ser dividida em estágios, que vão orientar o tratamento. As classificações são baseadas no tempo provável de evolução e sintomatologia: 

  • Sífilis recente (primária, secundária e latente recente): até um ano de evolução 
  • Sífilis tardia (latente tardia e terciária): mais de um ano de evolução 

A sífilis primária é uma das fases em que a transmissibilidade da doença é maior, uma vez que as lesões apresentam grande quantidade de treponemas, que penetram diretamente nas membranas mucosas ou entram por abrasões na pele. 

Após um período de incubação de 10 a 90 dias (média de 3 semanas), a manifestação típica da sífilis primária é a presença de úlcera, geralmente única e indolor, com bordas bem definidas e regulares, base endurecida e fundo limpo (cancro duro), localizada no local de inoculação – pênis, vagina, vulva, colo uterino, ânus, boca. Frequentemente ocorre linfonodomegalia regional associada, com aumento indolor de linfonodos próximos ao local da lesão primária. 

O tempo de duração da lesão é variável, geralmente 3 a 8 semanas, e é autolimitada, desaparecendo mesmo sem tratamento. A lesão ulcerosa pode passar despercebida pelo paciente, o que dificulta o diagnóstico. Sem tratamento adequado, a doença evolui para os demais estágios, podendo causar manifestações variadas. 

Como as características da úlcera não são específicas, qualquer lesão ulcerosa deve ter sífilis primária como uma hipótese diagnóstica. Outros diagnósticos diferenciais incluem herpes simples genital, linfogranuloma venéreo, doença de Behçet, granuloma inguinal, entre outros. 

Diagnóstico 

O diagnóstico de sífilis é predominantemente sorológico. Anticorpos contra o T. pallidum são detectáveis cerca de 10 a 15 dias após o aparecimento da lesão primária, sendo de dois tipos: não-treponêmicos – os quais utilizam antígenos sintetizados a partir de lecitina, colesterol e cardiolipina – e treponêmicos – os quais detectam anticorpos contra proteínas treponêmicas. Os últimos comumente persistem por toda a vida, podendo ser usados como testes confirmatórios ou de rastreio, dependendo do algoritmo. Já os primeiros podem ser utilizados para diagnóstico e para controle de cura. 

Exemplos de testes diagnósticos estão a seguir: 

Testes não treponêmicos  RPR, VDRL, TRUST, USR 
Testes treponêmicos  FTA-Abs, TPPA, TPHA, ELISA, CMIA, teste rápido 

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Tratamento 

O tratamento da sífilis é baseado na administração de penicilina benzatina, com dose de acordo com o estágio clínico. Exceções são casos de comprometimento de sistema nervoso central, em que o tratamento de escolha é penicilina cristalina. Doxiciclina e ceftriaxona são alternativas possíveis. 

Então, como manejar? 

O primeiro passo é sempre suspeitar da possibilidade da doença. Todo paciente com úlcera genital ou em possível local de inoculação, especialmente se única e indolor, deve ser investigado para sífilis. História de tratamento prévio para sífilis deve ser questionado, incluindo medicamento prescrito, doses e tempo. Possíveis exposições também devem ser investigadas. 

Alguns casos apresentam indicação de rastreio de sífilis mesmo sem sintomas, como é o caso de gestantes, durante o pré-natal e no momento do parto, indivíduos em que se faz diagnóstico de outra infecção sexualmente transmissível (IST) ou indivíduos em que se identifica exposição de risco. 

O algoritmo atual do Ministério da Saúde recomenda a utilização de testes treponêmicos – preferencialmente teste rápido – como forma de rastreio e de testes não treponêmicos como testes confirmatórios. Para casos sem história prévia de tratamento de sífilis, as possibilidades de testes e suas interpretações estão sumarizadas no quadro a seguir: 

Primeiro teste Segundo teste Possíveis interpretações 
Teste treponêmico reagente  Teste não treponêmico reagente   Diagnóstico de sífilis 
Teste treponêmico reagente  Teste não treponêmico não reagente  Realizar novo teste treponêmico com metodologia diferente 

– não reagente: falso-reagente; exclui diagnóstico de sífilis 

– reagente: diagnóstico de sífilis 

Teste não treponêmico reagente   Teste treponêmico reagente  Diagnóstico de sífilis 
Teste não treponêmico reagente  Teste treponêmico não reagente  Realizar novo teste treponêmico com metodologia diferente 

– não reagente: falso-reagente; exclui diagnóstico de sífilis 

– reagente: diagnóstico de sífilis 

Teste treponêmico ou não treponêmico não reagente   Sem indicação de outro teste se não houver suspeita clínica de sífilis primária  Sem infecção ou em período de janela (se houver suspeita clínica, solicitar nova coleta em 30 dias) 

Uma vez que se tenha feito o diagnóstico, ou quando há alta suspeita e há risco de perda de seguimento, o tratamento deve ser indicado, sendo a penicilina benzatina a droga de escolha: 

Estágio da sífilis Esquema terapêutico Esquema alternativo (exceto gestantes)  Seguimento 
Sífilis recente (primária, secundária e latente recente)  Penicilina benzatina 2,4 milhões IM dose única (1,2 milhão em cada glúteo)  Doxiciclina 100mg, 12/12h, VO, por 15 dias  Teste não treponêmico trimestral (em gestantes, o controle deve ser mensal) 

O acompanhamento é realizado com testes não treponêmicos, preferencialmente com o mesmo método utilizado para diagnóstico. Considera-se como resposta adequada ao tratamento, a queda na titulação em duas diluições em até seis meses ou sua negativação. 

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Alguns indivíduos podem apresentar títulos persistentemente positivos. Nesses casos, deve-se investigar reinfecção ou reativação e, na ausência desses, pode-se considerar a possibilidade de cicatriz sorológica, a qual ocorre mais frequentemente com títulos baixos e nos casos de sífilis tardia. 

Outras medidas importantes incluem: 

  • Rastreio para outras ISTs 
  • Aconselhamento em relação a medidas preventivas, especialmente uso de preservativos
  • Rastreio e tratamento de parcerias sexuais, se possível 
  • Orientação em relação à importância de adesão ao tratamento e seguimento 

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