Teleconsultas são efetivas na Atenção Primária? Veja estudo

As teleconsultas ganharam espaço na prática médica com a pandemia de Covid-19. Confira estudo que demonstra eficácia da modalidade.

A pandemia por Covid-19 forçou mudanças nos modelos de atenção à saúde na intenção de evitar ou diminuir o contato direto entre pacientes e médicos. Em vários países, principalmente na Europa, sistemas de saúde rapidamente adotaram estratégias de telemedicina (por vídeo, telefone ou internet), tornando as teleconsultas o modo preferencial de acesso à Atenção Primária (APS).

A telemedicina pôde, assim, ajudar na organização da ida dos pacientes às unidades de saúde, limitar a exposição a doenças infecciosas e diminuir a transmissão do coronavírus. Nos Estados Unidos, em abril de 2020, as teleconsultas representavam 65,4% das consultas realizadas na APS. 

Leia também: Como fazer uma teleconsulta de qualidade na Atenção Primária?

Existe ainda bastante especulação se a crise induzida pela pandemia irá resultar em uma mudança permanente de cenário em relação à telemedicina. Fatores como a experiência do paciente e do profissional de saúde com essa prática, bem como as evidências encontradas sobre a qualidade do cuidado prestado através dela certamente irão auxiliar no direcionamento dessas tendências. Revisões ainda buscam evidências de qualidade sobre a efetividade de consultas de vídeo para pacientes com condições crônicas; no entanto, alguns estudos apontam que consultas por telefone podem ter efetividade parecida com a de consultas presenciais.

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Estudo 

Uma revisão sistemática de 2022, publicada na revista Family Practice Journal, parte do grupo Oxford Academic, buscou investigar o impacto de consultas por vídeo ou telefone em desfechos de saúde, quando comparadas a consultas presenciais. Para isso, em buscas nas bases Cochrane, Embase e Pubmed, selecionou estudos clínicos controlados, randomizados e não randomizados, com populações adultas utilizando serviços de APS, que passaram por consultas por telefone ou videoconferência em substituição a consultas presenciais.

Foram analisados desfechos relacionados aos pacientes – como qualidade de vida, melhora clínica e satisfação – e utilização de serviços de APS. Dos 296 estudos encontrados, 31 atenderam aos critérios de inclusão, de sete países diferentes (Austrália, Estados Unidos, Espanha, Canadá, Dinamarca, Japão e Escócia). 

Uma grande variedade de desfechos foi avaliada nos estudos: diagnósticos agudos não urgentes, condições de saúde mental, problemas respiratórios, desnutrição, cuidados pós-parto, dependência de nicotina e problemas crônicos de saúde. 

Resultados

Alguns estudos apontaram para uma efetividade similar da telemedicina em relação à qualidade do cuidado. As teleconsultas estiveram associadas a menor custo e menor utilização dos serviços, quando comparadas às consultas presenciais. Shi et al. demonstraram que consultas por vídeo podem melhorar significativamente algumas medidas de cuidado em saúde, como o uso adequado de antibióticos.

No entanto, as consultas presenciais apresentaram melhores resultados em relação a solicitação adequada de exames complementares e menor necessidade de consultas de retorno. Gordon et al. verificou menores custos médicos e farmacológicos por atendimento em teleconsultas, com também menos exames laboratoriais e de imagem. McKinstry et al. demonstrou acurácia similar na capacidade de o paciente se recordar das orientações e condutas do médico após consultas presenciais e por vídeo, com maior necessidade de repetição das informações, entretanto, nas presenciais.  

Com relação à cessação do tabagismo, dois estudos apontaram resultados diferentes: enquanto Nomura et al. não encontrou diferenças significativas entre os dois modelos de atendimento, Ramon et al. reportou melhores resultados por consultas presenciais. Ainda com relação a consultas de aconselhamento, mais dois estudos não encontraram diferenças significativas entre as consultas tradicionais e as teleconsultas para perda de peso e acompanhamento nutricional. Avaliando as intervenções precoces para famílias com crianças com deficiência, McCarthy et al. também não identificou diferenças significativas entre os dois tipos de atendimento.  

Mohr et al. encontrou evidências de melhor adesão ao tratamento e às consultas em pacientes com depressão, possivelmente por ajudar a diminuir as barreiras e a dificuldade relacionada à ambivalência do tratamento. 

Um ponto que se destacou em vários estudos avaliados foi uma menor tendência de continuidade e adesão longitudinal do paciente no acompanhamento pelas teleconsultas, quando comparadas às presenciais. Ou seja, a efetividade da telemedicina depende também da capacidade de aderência do paciente. 

Comentários

De uma maneira geral, pode-se dizer que a telemedicina tem a capacidade de ser tão efetiva quanto o atendimento presencial no sentido de melhorar resultados em saúde na APS. Contudo, isso não significa que essa estratégia seja adequada para todos os tipos de pacientes. Consultas presenciais são mais indicadas para aqueles com doenças de alto risco, que necessitam de exame físico ou que não conseguem se comunicar adequadamente por telefone ou vídeo.

Por outro lado, pacientes com condições crônicas de saúde, que necessitam de um acompanhamento regular, ou que possuem dificuldade de acesso às unidades de saúde (por distância geográfica, dificuldade de horários etc), parecem se beneficiar mais dos teleatendimentos. É importante notar que os estudos avaliados nessa revisão sistemática são de países desenvolvidos e os contrastes econômicos e sociais com o Brasil podem comprometer a validade de muitas de suas conclusões em nosso cenário. 

Além disso, apesar das evidências de resultados similares da qualidade do cuidado prestado por ambos os modelos, a satisfação do paciente parece ser maior em consultas presenciais. A construção de estratégias de melhoria da experiência do paciente em teleconsultas parece ser essencial nesse sentido. A comunicação empática, a abordagem centrada na pessoa e a construção de vínculo entre paciente e médico pode ajudar tanto na satisfação, quanto na continuidade e aderência aos planos de cuidado.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Carrillo de Albornoz S, Sia KL, Harris A. The effectiveness of teleconsultations in primary care: systematic review. Fam Pract. 2022;39(1):168-182. doi:10.1093/fampra/cmab077. 
  • Shi Z, Mehrotra A, Gidengil CA, Poon SJ, Uscher-Pines L, Ray KN. Quality of care for acute respiratory infections during direct-to-consumer telemedicine visits for adults. Health Aff (Millwood) 2018. 
  • Gordon AS, Adamson WC, DeVries AR. Virtual visits for acute, nonurgent care: a claims analysis of episode-level utilization. J Med Internet Res 2017. 
  • McKinstry B, Watson P, Elton RA et al. Comparison of the accuracy of patients’ recall of the content of telephone and face-to-face consultations: an exploratory study. Postgrad Med J 2011. 
  • Nomura A, Tanigawa T, Muto T et al. Clinical efficacy of telemedicine compared to face-to-face clinic visits for smoking cessation: multicenter open-label randomized controlled noninferiority trial. J Med Internet Res 2019. 
  • Ramon JM, Nerin I, Comino A et al. A multicentre randomized trial of combined individual and telephone counselling for smoking cessation. Prev Med 2013 
  • McCarthy M, Leigh G, Arthur-Kelly M. Comparison of caregiver engagement in telepractice and in-person family-centered early intervention. J Deaf Stud Deaf Educ 2020
  • Mohr DC, Ho J, Duffecy J, Reifler D, Sokol L, Burns MN, Jin L, Siddique J. Effect of telephone-administered vs face-to-face cognitive behavioral therapy on adherence to therapy and depression outcomes among primary care patients: a randomized trial. JAMA 2012.