A infecção pelo Helicobacter pylori é uma das infecções bacterianas crônicas mais comuns em seres humanos, acometendo cerca de 4,4 bilhões de pessoas¹. A infecção por H. pylori está associada ao desenvolvimento de diversas complicações como gastrite, dispepsia, úlcera péptica e neoplasias gástricas, como o linfoma MALT e o adenocarcinoma. Acredita-se que o H. pylori seja responsável por até 15% da carga total de neoplasias e até 89% de todos os cânceres gástricos². Dessa forma, a maioria das Sociedades de Gastroenterologia recomenda, atualmente, a erradicação da bactéria sempre que for documentada a infecção. Por outro lado, o uso indiscriminado de antibióticos está associado ao aumento da resistência antimicrobiana do H. pylori, sendo cada vez mais frequente falhas ao tratamento e infecções refratárias. Estudo recente, com mais 50.000 pacientes de 45 países, demonstrou uma resistência global de 10-34% a claritromicina, 11-30% a levofloxacino e 23-56% a metronidazol, com grande heterogeneidade entre diferentes regiões do mundo³. Nesse sentido, o Núcleo Brasileiro para Estudo do H. pylori e Microbiota elaborou um consenso de diagnóstico e tratamento do H. pylori no Brasil, o qual periodicamente é atualizado4.
Diagnóstico
O diagnóstico da infecção por H. pylori pode ser realizada por diversas maneiras. As técnicas mais disponíveis no país são o teste da urease e histologia após biópsia gástrica por endoscopia digestiva alta, além do teste respiratório da ureia marcada com carbono 13/14, esse último mais restrito a grandes centros, porém realizado por metodologia não-invasiva. Para realização dos testes diagnósticos é fundamental descontinuar o uso de inibidor de bomba de prótons (IBP) 2 semanas antes e de antibióticos e sais de bismuto 4 semanas antes do procedimento endoscópico ou teste respiratório4. Outras opções menos empregadas na prática clínica são a pesquisa de antígeno fecal de H. pylori e a sorologia para pesquisa de anticorpos anti-H. pylori IgG.
Tratamento de H. pylori
A escolha do melhor esquema de tratamento deve levar em conta a exposição prévia a antibióticos, especialmente macrolídeos (claritromicina, azitromicina ou estreptomicina), história de alergia à penicilina, além de custos e possibilidade de eventos adversos. O esquema de primeira linha recomendado pelo último consenso brasileiro é o de claritromicina + amoxicilina + IBP por 14 dias4. Alternativas incluem o uso de terapia quádrupla com bismuto + tetraciclina + metronidazol + IBP por 10-14 dias; ou amoxicilina + claritromicina + metronidazol ou tinidazol + IBP. No caso de falha, recomenda-se terapia tripla com amoxicilina + levofloxacino + IBP. Diversas outras combinações e esquemas sequenciais são também propostos, devendo o médico assistente individualizar sua escolha de acordo com o perfil do paciente e história de tratamentos. No entanto, efeitos colaterais, como náuseas, vômitos, disgeusia, dor abdominal e diarreia, limitam a adesão a essas terapias e impactam negativamente nas taxas de erradicação.
Inovações: uso de probióticos
O uso de probióticos na erradicação do H. pylori constitui uma tentativa de otimizar a erradicação e minimizar os efeitos adversos relacionados ao tratamento. Alguns estudos demonstraram que a infecção por H. pylori altera a microbiota gastrointestinal e que essa alteração é reversível com a erradicação dessa bactéria5. Além disso, esquemas de tratamento com antibióticos podem induzir a disbiose intestinal e levar ao aumento do gene erm (B), o qual pode comprometer a eficácia da terapia de erradicação de esquemas que incluem macrolídeos6,7. Por outro lado, algumas cepas de Lactobacilli podem reduzir a carga de H. pylori, a inflamação da mucosa e a hiperacidez gástrica, além de competir por sítios de ligação e produzir bacteriocinas. Um dos probióticos mais estudados é o Lactobacillus rhamnosus GG (LGG), o qual é capaz de resistir ao ácido e a bile e persistir viável no ambiente inóspito do estômago. A maioria dos estudos com LGG demonstrou que essa cepa é capaz de reduzir significativamente os efeitos adversos relacionados aos tratamentos com antibióticos, o que se traduz em aumento na taxa de erradicação por ganho na aderência8. No entanto, pesquisas in vitro também relataram um efeito inibitório direto do LGG sobre o H. pylori, além de uma potencial modulação da resposta imune local, com redução da produção de interleucina-89. Dessa maneira, apesar de não serem considerados uma alternativa isolada aos antimicrobianos, os probióticos podem ser empregados como coadjuvantes nas terapias padrão para H. pylori, aumentando tanto a tolerância, como as taxas de erradicação do tratamento padrão.10
Conclusão
O tratamento do H. pylori continua sendo um desafio na prática médica, especialmente com o aumento progressivo das taxas de resistência bacteriana. O uso de probióticos pode aumentar a taxa de erradicação e reduzir os efeitos colaterais associados a terapia padrão.