De 2017 a 2019 o banco de olhos no Brasil teve uma média anual de 16.850 doadores de tecidos oculares. Foram 31.791 córneas processadas e 17.205 transplantes de córnea de acordo com a Anvisa. De acordo com o Sistema Nacional de Transplantes foram 15.380 transplantes por ano no período.
Um aumento significativo era esperado para 2020, porém a covid-19 frustrou essas expectativas. A Apabo divulgou um guideline recomendando medidas preventivas incluindo a covid-19 nos critérios de exclusão para doadores.
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A Anvisa divulgou a parcial do primeiro semestre de 2020, de 37 dos 51 bancos autorizados: foram feitos 3.171 transplantes de córnea nessas unidades. Os dados do Sistema Nacional de Transplantes foram de 3.930 transplantes (31,9% em janeiro, 28,9% em fevereiro, 26,2% em março, 2,9% em abril, 4,7% em maio e 5,4% em junho). Esse conflito de informações é consequência da falta de um sistema unificado e padronizado. Um estudo publicado nos Arquivos Brasileiros de Oftalmologia neste ano divulgou o resultado de um questionário preparado pela Apabo para 50 bancos de olhos brasileiros (dos 51 autorizados a operar).
Métodos
Quarenta e quatro desses bancos responderam as questões, sendo que 40 as responderam totalmente, dois parcialmente e dois revelaram não ter operado nesse período. Dos que não responderam, três estavam inoperantes. As informações presentes no estudo correspondem a 80,5% das instituições que forneceram córneas para transplante nos primeiros oito meses de 2020 (37 bancos de 20 estados).
Resultados
Nesses foram obtidos 3.060 doadores de tecidos oculares no período (61,7% dos doadores no brasil durante o período de acordo com o sistema nacional de transplantes, com um total de 6.052 córneas processadas). Das 3.060 doações, dois terços foram obtidos de doadores por parada cardíaca e um terço por doadores com morte cerebral. No primeiro trimestre os doadores por parada cardíaca representavam 80,4% das doações, no segundo trimestre caíram para 23,2%. Vinte e dois bancos de olhos reportaram uma redução e 11 tiveram um aumento pequeno nas doações por morte cerebral.
Das 6.052 córneas processadas, 71,8% foram oferecidas dos bancos ao centro de distribuição para pacientes nas listas de espera (73,5% por indicações ópticas e 26,5% por indicações não ópticas). De todas as córneas processadas, 3.167 (52,3%) foram transplantadas (Índice de utilização geral), 84,5% por indicações ópticas. Dezesseis por cento das córneas que poderiam ser usadas para transplantes ópticos não foram utilizadas, de acordo com o centro de distribuição principalmente por atrasos na distribuição, seguido de inviabilidade das córneas por expiração do período de preservação. Cirurgiões não disponíveis corresponderam a 14,3% (71,2% no primeiro bimestre) e pacientes não disponíveis representou 8,2% (52,4% no primeiro bimestre).
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Discussão
Depois de decretada a pandemia, os bancos de olhos continuaram restringindo ou até suspendendo atividades como medida de segurança. Em abril de 2020, o ministro da Saúde reforçou a recomendação de doadores não terem achados clínicos e epidemiológicos para covid-19 validados por teste negativo para SARS-CoV-2. Essas recomendações se mantiveram por pelo menos seis meses.
Desde o início da pandemia foi vista, portanto, uma queda massiva nas doações, dificuldades com os bancos de olhos, um impacto negativo nos receptores e dúvidas na comunidade oftalmológica.
Com as restrições, o artigo conclui que houve uma queda de 85,7% nas doações de tecidos oculares do primeiro ao terceiro bimestre. Usando o primeiro bimestre como uma projeção para o período analisado, as taxas atingidas nos primeiros oito meses seriam 57% menores se comparadas com o que poderia ser atingido sem a interferência da pandemia. A consequência é um aumento de 14,7% do número de pacientes aguardando um transplante de córnea, de acordo com o SNT.