ACEP 2022: Como tratar as principais infecções que chegam no pronto socorro

No ACEP 2022, foi realizada uma revisão do melhor esquema antibiótico para cada uma das infecções mais comuns no pronto socorro.

Algumas infecções são comuns no pronto socorro, como pneumonia, infecção do trato urinário e celulite. No entanto, a antibioticoterapia mais apropriada pode variar a depender da gravidade clínica, da resistência dos organismos mais prevalentes e das comorbidades apresentadas pelo paciente. Nessa palestra do ACEP 2022, foi realizada uma revisão do melhor esquema antibiótico para cada uma das infecções mais comuns no pronto socorro. Algumas das recomendações diferem dos esquemas utilizados no Brasil por diferenças na prevalência de organismos resistentes. Essas diferenças serão ressaltadas ao longo do texto. 

Estudo verificou a incidência de tromboembolismo pulmonar agudo em pacientes com Covid-19 no pronto-socorro

Tratamento da pneumonia 1

A definição do esquema antimicrobiano na pneumonia depende inicialmente da gravidade do quadro clínico. A duração do tratamento, em um paciente que apresenta melhora clínica pode ser ≥ cinco dias. Escores como o CURB-65 e o PORT/PSI podem ser utilizados para determinar se o paciente será tratado de forma ambulatorial ou internado. Os antibióticos mais apropriados, segundo o guideline da IDSA (Infectious Diseases Society of America) para pacientes em tratamento ambulatorial são:

  • Paciente em tratamento ambulatorial (sem comorbidades* ou fator de risco para MRSA ou Pseudomonas) – opções:
  1. Amoxicilina 1g 8/8h 
  2. Azitromicina (não deve ser utilizada em regiões onde a prevalência de pneumococo resistente ultrapassa 25% das cepas – como boa parte dos EUA) 
  3. Doxiciclina 100mg 12/12h (pouco utilizada no Brasil para essa finalidade).

*Observação: São consideradas comorbidades pelo guideline diabetes, alcoolismo, asplenia, neoplasias, e qualquer doença crônica cardíaca, pulmonar, renal ou hepática.

  • Paciente em tratamento ambulatorial com comorbidades – opções:
  1. Beta-lactâmico associado a: azitromicina ou doxiciclina
  2. Fluoroquinolonas

Nos pacientes internados, devemos definir se o quadro de pneumonia é grave ou não, para definir a escolha de antibióticos. Os critérios utilizados para fazer essa distinção estão representados na figura 1. Após definir a gravidade do quadro, os antibióticos mais apropriados para paciente internado são:

Figura 1: Critérios maiores e menores para definição de pneumonia grave. Um quadro grave é definido pela presença de qualquer critério maior ou 3 critérios menores (retirado da referência 1).
  • Paciente internado sem quadro grave (sem fator de risco para MRSA ou pseudomonas) – opções:
  1. Beta-lactâmico associado a: azitromicina ou doxiciclina
  2. Fluoroquinolonas
  • Paciente internado com quadro grave (sem fator de risco para MRSA ou pseudomonas) – opções*:
  1. Beta-lactâmico associado a: azitromicina ou doxiciclina
  2. Beta-lactâmico associado a fluoroquinolonas* 

*Observação: Na nossa prática no Brasil realizamos a cobertura desses pacientes com utilização da associação de Beta-lactâmico + Azitromicina ou Fluoroquinolonas em monoterapia. 

  • Paciente internado com fator de risco para pseudomonas ou MRSA:
  1. Vancomicina ou linezolida, associado a: cefepime ou piperacilina-tazobactam, além de cobertura para atípicos.

Observação: Os principais fatores de risco para infecção por esses agentes são a presença de infecção prévia por eles ou internação com antibioticoterapia endovenosa nos últimos 90 dias.

Observação: A cobertura de anaeróbios nas pneumonias só é necessária nos casos de abscesso ou empiema pulmonar.

O FDA americano reportou o aumento do risco (em diferentes magnitudes) de diversos efeitos adversos associado com o uso das fluoroquinolonas, como: ruptura de tendão de aquiles, convulsões, descolamento de retina, ruptura de aneurisma de aorta, exacerbação de miastenia gravis, neuropatia periférica, prolongamento de intervalo QT, e infecção por C. difficile. Assim, seu uso deveria ser restrito para situações como infecção de trato urinário, DPOC exacerbado, sinusite bacteriana aguda.

Infecções de pele e partes moles 2

O primeiro passo na abordagem de infecções de partes moles é definir se ela é purulenta ou não. Toda infecção purulenta deve ser drenada e toda infecção grave deve passar por avaliação do cirurgião para definir a necessidade de debridamento. A escolha do esquema antibiótico empírico se baseia no agente mais provável: S. aureus nas infecções purulentas e Streptococcus nas não-purulentas. São opções de antimicrobiano, segundo o guideline da IDSA (figura 2):

  • Infecção não-purulenta: 
  1. Cefazolina EV ou cefuroxima VO
  • Infecção purulenta:
  1. SMZ-TMP ou doxiciclina VO

Observação: Apesar dessas recomendações, mesmo em locais com alta prevalência de CA-MRSA, a cobertura empírica desse agente (ex: SMZ-TMP ou clindamicina) não possui benefício clínico, em comparação com a cobertura de MSSA (ex: cefalexina) 3. São fatores que aumentam o risco de MRSA: infecção prévia pelo agente, hospitalização ou antibioticoterapia recentes e pacientes que moram em instituições de longa permanência.

 

 Figura 2: Manejo ambulatorial de infecções de pele e partes moles da Infectious Diseases Society of America (IDSA). Abreviações: C&S, Cultura e sensibilidade; I&D, incisão e drenagem; MRSA, Staphylococcus aureus resistente à meticilina; MSSA, Staphylococcus aureus sensível à meticilina; TMP/SMX, trimetoprima-sulfametoxazol; SSTI, infecção de pele e tecidos moles; Rx, tratamento.

Infecções urinárias 4

O tratamento das infecções urinárias (ITU) leva em consideração se o paciente apresenta evidência de quadro de cistite aguda ou pielonefrite. Segundo o guideline da IDSA, são opções para tratamento da cistite aguda não complicada:

  • Primeira linha:
  1. Nitrofurantoína 100mg 6/6h (formulação presente no Brasil) por 5 dias
  2. SMZ-TMP 12/12h por três dias
  3. Fosfomicina 3g dose única
  • Segunda linha:
  1. Fluoroquinolona por três dias
  2. Beta-lactâmico por três a sete dias

Nos casos de pielonefrite, levamos em consideração se o paciente será tratado ambulatorialmente ou internado. São opções:

  • Tratamento ambulatorial:
  1. Fluoroquinolonas por cinco a sete dias (a depender da evolução clínica)
  2. SMZ-TMP 12/12h ou Beta-lactâmico por sete a dez dias
  • Tratamento internado
  1. Sem risco de organismos multirresistentes: Ceftriaxone ou Fluoroquinolonas
  2. Com risco de organismos multirresistentes: Cefepime ou Piperacilina-Tazobactam ou Meropenem

Observação: A decisão de início de antibioticoterapia empírica com cobertura de organismos multirresistentes (MDR) não deve se basear somente em fatores de risco, mas deve levar em consideração o quadro clínico do paciente. Nos pacientes estáveis hemodinamicamente podemos começar com cobertura mais restritiva enquanto aguardamos os resultados das culturas. Por outro lado, em pacientes com choque séptico instalado faz sentido iniciar cobertura com antibióticos de amplo espectro se houver fatores de risco para MDR, com de-escalonamento após resultado de culturas.

Mensagem final

Apesar de algumas diferenças entre o perfil dos agentes infecciosos no Brasil e EUA, boa parte do raciocínio no tratamento de infecções é semelhante. Baseado nos princípios citados no texto podemos escolher o tratamento mais adequado para as infecções mais comuns do Pronto Socorro. 

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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