Coronavírus e gestação: o que sabemos até agora?

Um novo coronavírus, denominado SARS-CoV-2, causou uma pandemia por todo o globo. Nesse cenário, é esperado que gestantes sejam infectadas. O que esperar?

Os coronavírus são vírus esféricos, envelopados, conhecidos desde meados dos anos 1960, que causam infecções respiratórias em seres humanos e animais com variável espectro de gravidade. Até dezembro de 2019, um total de seis espécies de coronavírus eram capazes de causar infecção humana: HCoV-229E e HCoV-NL63 pertencentes ao gênero Alfacoronavirus; HCoV-OC43, HCoV-HKU1, MERS-CoV e SARS-CoV, pertencentes ao gênero Betacoronavirus.

Em dezembro de 2019, um novo coronavírus, denominado SARS-CoV-2, se espalhou pela China e, posteriormente, pelo resto do mundo, causando uma pandemia com elevada sobrecarga dos sistemas de saúde. Nesse cenário, é esperado que gestantes sejam infectadas, sendo o desfecho materno-fetal pouco conhecido até o momento. Esse artigo tem como objetivo analisar os dados disponíveis até o momento nesta subpopulação.

Mulher grávida, tira dúvidas sobre a gestação durante a pandemia de coronavírus.

Complicações na gestação e coronavírus

A ocorrência de pneumonia de qualquer etiologia é uma importante causa de morbimortalidade durante a gestação, sendo a principal causa não obstétrica de infecção nesse período. Estima-se que até 25% das gestantes que desenvolvem pneumonia necessitem de hospitalização em centros de terapia intensiva para suporte ventilatório.

Os principais desfechos obstétricos adversos associados a pneumonias maternas por todas as causas são rotura prematura de membranas, parto pré-termo, crescimento intrauterino restrito, morte neonatal e morte fetal intrauterina.

Durante a epidemia por SARS-CoV de 2002-2003, 12 gestantes foram infectadas pelo vírus, com 25% de mortalidade. Quatro mulheres evoluíram com abortamento no primeiro trimestre, quatro com parto prematuro e dois fetos apresentaram crescimento intrauterino restrito. Dessa forma, existe uma grande preocupação sobre os potenciais desfechos da infecção por SARS-CoV-2 (Covid-19) em gestantes.

Gestação, parto e SARS-CoV-2

Recentemente, Schwartz analisou uma série de casos de 38 gestantes infectadas por SARS-CoV-2 na China. Diferentemente da infecção por SARS-CoV, o vírus que entrou em circulação em 2019 não foi associado a mortalidade materna. Além disso, análises do material placentário, líquido amniótico, sangue de cordão umbilical, leite materno e swab de orofaringe do recém-nascido não revelaram risco de transmissão vertical materno-fetal.

Embora tenham sido relatados dois casos de Covid-19 em recém-nascidos poucos dias após o parto, não é possível afirmar que a infecção tenha ocorrido pela via materno-fetal, uma vez que os bebês foram expostos a ambientes intra-hospitalares com altas taxas de infecção e ao contato materno.

Estudo recente publicado por Cheng e colaboradores demonstrou uma baixa expressão do receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2) em todos os tecidos da interface materno-fetal, o que em tese dificultaria a transmissão materno-fetal, já que o SARS-CoV-2 se liga ao ACE2 na superfície celular.

Por outro lado, Mullins e colaboradores identificaram 47% de parto pré-termo entre 32 gestantes infectadas, embora o motivo da indicação do parto não tenha ficado claro na maioria dos casos. A alta taxa de prematuridade foi associada a maior morbidade neonatal, com necessidade de suporte intensivo a pré-termos. Ainda não existem estudos que avaliaram o risco de má-formações congênitas relacionadas ao vírus.

Em relação as manifestações clínico-laboratoriais da doença em gestantes, Chen e colaboradores demonstraram um perfil muito semelhante ao restante da população, com predomínio de febre (78%), tosse (44%) e linfopenia (78%). Em outro estudo, uma Comissão da Organização Mundial da Saúde avaliou 147 gestantes com infecção suspeita ou confirmada por SARS-CoV-2, sendo observado 8% dos casos com evolução grave e 1% crítico, sem óbitos maternos até o momento.

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Conclusão

Até o momento, não foi registrada transmissão vertical de SARS-CoV-2. A COVID-19 em gestantes parece evoluir como no restante da população, sem aumento expressivo da mortalidade como na infecção por SARS-CoV de 2002.

Observa-se possível aumento das taxas de parto prematuro, embora os desfechos neonatais tenham sido, em sua maioria, positivos. Não existem dados para avaliação do risco de má-formações congênitas ou desfechos associados ao primeiro trimestre da gestação.

 

Referências bibliográficas:

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