Estatinas realmente causam sintomas musculares?

Estudo realizou metanálise com o objetivo de obter mais informações sobre dor muscular como efeito colateral do uso de estatinas.

As estatinas são utilizadas como forma de prevenção secundária para pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) e acidente vascular cerebral (AVC) com grande benefício em redução de eventos no longo prazo. Também há benefícios de seu uso no contexto da prevenção primária, independente de sexo ou idade.

É bastante conhecido que essa classe de medicações pode, raramente, causar miopatia (1 caso a cada 10 mil pessoas ano) e, mais raramente ainda, rabdomiólise (2 a 3 casos por 100 mil pessoas ano). Apesar de estudos observacionais sugerirem que pode haver dor muscular como efeito colateral, alguns estudos randomizados vem sugerindo a hipótese de efeito nocebo, ou seja, o efeito colateral de dor muscular não seria efeito direto da medicação.

A informação amplamente divulgada sobre dor muscular e estatinas pode acabar atrapalhando a aderência a esta classe de medicações. Foi feita então uma metanálise, publicada recentemente, com o objetivo de obter mais informações sobre este tema.

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Estatinas realmente causam sintomas musculares

Métodos do estudo e população envolvida

Foram incluídos todos os estudos duplo-cego que compararam tratamento com estatina e placebo ou tratamento com estatinas de alta potência comparado às de menor potência que tinham mais de 1000 pacientes e foram seguidos por pelo menos 2 anos. As estatinas foram divididas em potências baixa, moderada ou alta.

As alterações musculares avaliadas foram mialgia, fraqueza e miopatia. Outros sintomas incluídos foram dor em membros, outras dores músculo-esqueléticas, espasmos musculares e cãibras, fadiga ou fraqueza muscular. Miopatia foi inicialmente definida como dor muscular ou fraqueza associada a creatino-quinase (CK) mais de 10 vezes o limite superior, porém como havia poucas dosagens de CK foi modificado para qualquer evento compatível com miopatia ou rabdomiólise.

Resultados

Havia 123.940 pacientes nos 19 ensaios clínicos randomizados duplo cego comparando estatina e placebo. Esses pacientes tinham idade média de 63 anos, 28% eram mulheres, 48% tinham doença vascular prévia e 18% diabetes. 27,1% do grupo estatina e 26,6% do grupo placebo relataram algum sintoma muscular em um seguimento médio de 4,3 anos, sem diferença estatística. No primeiro ano, a chance de sintomas musculares foi maior no grupo estatina, porém essa diferença não se manteve após, e a ocorrência de sintomas variou muito de estudo para estudo.

Quando os grupos foram subdivididos por tipo e dose de estatina, não houve diferença em relação a ocorrência dos sintomas. Mulheres tiveram mais sintomas relacionados ao uso de estatinas de baixa e moderada potência de forma significativa quando comparado aos homens, principalmente no primeiro ano, porém este achado não se manteve ao avaliar estatina comparada a placebo. Também não houve diferença em relação a outras características dos pacientes.

Os 30.724 paciente dos 4 ensaios clínicos randomizados duplo cego comparando tratamento com estatinas de diferentes potências foram seguidos por média de 4,2 anos. Tinham idade média de 62 anos e todos tinham doença vascular conhecida. Estatinas de alta potência tinham maior risco de sintomas musculares, porém sem diferença estatística.

A dosagem de CK estava disponível em apenas 6% dos pacientes com relato de sintomas e, em quase 97% deles, estava abaixo de três vezes o limite superior.

Comentários e conclusão

Esse estudo mostrou que há um aumento pequeno na ocorrência de sintomas musculares em pacientes em uso de estatina no primeiro ano de tratamento. Alguns estudos sugerem que os sintomas são mais frequentes logo após o início da medicação, porém boa parte deles não pode ser atribuído diretamente às estatinas.

A gravidade dos sintomas não foi maior no grupo estatina comparado ao placebo e não houve diferença entre os tipos de estatina ou sua dose, apesar de no primeiro ano de seguimento, as estatinas de alta potência terem maior tendência de causar sintomas que as de potência menor. Além disso, a presença de sintomas não teve impacto no tratamento, já que não houve repercussão na aderência medicamentosa.

Esse estudo tem algumas limitações, como a grande heterogeneidade entre os estudos selecionados e o fato de não haver coleta de CK ou relato sobre outras comorbidades, como hipotireoidismo, que podem se manifestar com dor muscular.

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A redução absoluta do risco de eventos cardiovasculares pelo uso de estatinas é muito maior que a ocorrência de sintomas musculares, o benefício do uso da medicação é maior a longo prazo e a ocorrência de sintomas musculares parece reduzir ao longo do tempo.

Esses achados corroboram a segurança do uso das estatinas no longo prazo e o fato de que provavelmente os sintomas musculares não têm relação direta com a medicação, já que são encontrados no grupo placebo praticamente na mesma proporção no longo prazo.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Cholesterol Treatment Trialists' Collaboration. Effect of statin therapy on muscle symptoms: an individual participant data meta-analysis of large-scale, randomised, double-blind trials. The Lancet. 2022;400(10355):832-845. DOI: 10.1016/ S0140-6736(22)01545-8

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