Manejo de suicídio para clínicos

Setembro amarelo: o suicídio geralmente ocorre no contexto de um transtorno mental, sendo os transtornos de humor os mais frequentes.

Suicídio é um importante problema de saúde pública. A Organização Mundial de Saúde estima que mais de 800 mil pessoas morrem a cada ano por suicídio (e ainda se acredita que as taxas sejam subestimadas por documentação incorreta da causa de morte). Calcula-se que o número de tentativas seja 10-20 vezes maior que o número de mortes por suicídio.   

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O suicídio geralmente ocorre no contexto de um transtorno mental, sendo os transtornos de humor os mais frequentes – algumas literaturas sugerem que em 97% dos casos havia um diagnóstico psiquiátrico no momento do ato fatal. Outros transtornos mentais frequentes são transtorno de personalidade, transtorno por uso de substâncias, transtornos de ansiedade e esquizofrenia.   

Algumas condições clínicas que acometem o sistema nervoso central, como epilepsia, doença de Huntington, traumatismo cranioencefálico e acidente cerebrovascular, também possuem risco aumentado de suicídio. Por fim, doenças cerebrovasculares e diabetes também carregam um risco elevado. Dor é, por sua vez, um fator de risco independente.  

Na maior parte do mundo, os homens têm maiores taxas de morte por suicídio (os homens costumam usar métodos mais letais), enquanto as mulheres têm um maior número de tentativas. No que diz respeito à idade, pessoas com mais de 70 anos, independente do gênero, possuem as maiores taxas de suicídio, mas se observa um crescimento progressivo das taxas entre jovens (suicídio é a segunda causa de morte nas pessoas entre 15-29 anos).  

Pessoas divorciadas, viúvas e solteiras possuem risco aumentado de morte por suicídio, sendo que, entre as pessoas casadas, aquelas que possuem filhos têm o menor risco de suicídio.  

As pessoas que vivem em situações socioeconômicas desfavoráveis, possuem menor renda e tiveram menos acesso à educação estão em maior risco para o suicídio. Além disso, as taxas de suicídio aumentam durante crises econômicas.  

Do ponto de vista clínico, o manejo do paciente com ideação suicida compreende quatro principais pilares: o diagnóstico e tratamento de transtorno mental, se existente; a avaliação minuciosa do risco de suicídio; a restrição de acesso a meios letais; e as intervenções para reduzir o risco de suicídio.  

Todos os pacientes psiquiátricos devem ser avaliados quanto ao risco de suicídio. Após uma tentativa de suicídio, o risco de morte por essa causa é 20 vezes maior que a população em geral. Pessoas do sexo masculino, que têm ou tiveram diagnóstico de transtorno por uso de substância ou outros transtornos psiquiátricos, que têm uso recente de psicotrópicos, história de autolesão, foram admitidas no serviço de saúde durante à noite e/ou tentaram suicídio por enforcamento ou overdose de medicação, possuem risco aumentado de novas tentativas.

Deve-se, ainda, ser avaliado a existência de suporte social e familiar, de plano suicida e de condições objetivas de execução do plano.  

Uma parte importante da avaliação clínica baseia-se nas informações fornecidas pelos pacientes, mas é importante estar atento: pacientes mais determinados a se matar podem falsear as informações fornecidas deliberadamente, razão pela qual é sempre importante incorporar informações coletadas a uma história colateral com um familiar ou pessoa próxima ao paciente.   

São fatores de proteção: responsabilidades familiares, ter filhos pequenos, medo do suicídio, medo da desaprovação social e valores culturais de afirmação da vida.  

suicídio

Mensagem prática   

A restrição ao acesso a meios letais é uma parte importante da prevenção de suicídio – tentativas empregando meios mais letais, como armas de fogo ou pesticidas, por exemplo, resultam em maiores taxas de morte. Considerando a natureza transitória de uma “crise suicida”, a restrição a meios letais pode permitir que a crise cesse ou resultar em uma tentativa de suicídio de menor letalidade. Aproximadamente 90% das pessoas que sobrevivem a uma tentativa de suicídio não vão morrer por suicídio mais tarde na vida.  

É importante que possamos construir com os pacientes ferramentas e recursos para que eles possam lidar com a ideação suicida. Um plano de segurança é uma intervenção importante neste processo. O plano deve ser um dispositivo físico, feito em um pedaço de papel, que deve estar acessível ao paciente e ser partilhado com o médico que está o acompanhando. Nele, devem conter:  

  • sinais de alarme (pensamentos, imagens, humor, situações, comportamentos) associados à crise suicida; 
  • estratégias de enfrentamento internas (coisas que podem ser feitas para desfocar da ideação suicida sem contatar outras pessoas); 
  • situações sociais ou pessoas que podem ajudar e servir como distração; 
  • pessoas para as quais possam pedir ajuda em uma crise suicida: profissionais ou atendimento telefônico que pode ser usado durante uma crise; 
  • estratégias para deixar o ambiente mais seguro. 

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O suicídio tem um impacto pessoal e social incomensurável e sua prevenção é uma tarefa desafiadora, atravessada por inúmeras dificuldades clínicas que levam a detecção de muitos casos falsos-positivos e falsos-negativos. É importante que todos os elos da cadeia de cuidados em saúde, principalmente médicos não-especialistas, atentem-se e ativamente investiguem sinais clínicos de ideação suicida, para que direcionem adequadamente esses pacientes para o melhor cuidado clínico.  

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Fazel S, Vazquez-Montes MDLA, Molero Y, et al. Risk of death by suicide following self-harm presentations to healthcare: development and validation of a multivariable clinical prediction rule (OxSATS). BMJ Ment Health 2023;26:e300673. 
  • Sher L, Oquendo MA. Suicide: An Overview for Clinicians. Med Clin North Am. 2023 Jan;107(1):119-130.