3 armadilhas diagnósticas que você talvez não conheça

Já aconteceu alguma vez de você estar frente a um paciente com queixas específicas e os diagnósticos começarem a surgir repentinamente nos seus pensamentos?

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Já aconteceu alguma vez de você estar frente a um paciente com queixas específicas e os diagnósticos começarem a surgir repentinamente nos seus pensamentos? Já se viu citando mentalmente uma hipótese ou uma síndrome, por vezes antes mesmo de o paciente concluir sua história? “Dor no peito” – será Infarto Agudo do Miocárdio?, “Vozes de comando” – será Esquizofrenia?, “Perda de memória” – será Doença de Alzheimer?

Essas conclusões parciais fazem parte do dia a dia da maioria dos profissionais, não apenas da saúde. Frequentemente, tais precipitações resultam de processos cognitivos não racionais chamados de “heurísticas”, como citado no artigo “NIGHT SHIFT: um jogo virtual para aniquilar erros diagnósticos?”. São simplificações lógicas úteis na interpretação de informações e na tomada cotidiana de decisão, como usar atalhos ao invés de caminhos mais longos.

A etimologia da palavra heurística indica uma origem no grego antigo (εὑρίσκω, transl. heurísko), que significaria algo similar a “eu encontro”. Pode ainda se referir aos verbos “achar”, “descobrir”, “inventar” e “obter”. Segundo estudiosos seria a mesma origem da palavra exclamada pelo matemático grego Arquimedes, segundo a tradição (“heureca!”).

Como discutido anteriormente, as heurísticas podem acarretar agilidade e assertividade quando bem estruturadas dentro dos conhecimentos médicos, assim como podem funcionar como pedras e armadilhas no caminho do raciocínio clínico. Vickrey e colaboradores expõem seus desdobramentos, demonstrando exemplos factíveis para aprender a reconhecer essas situações e sugerindo soluções plausíveis para driblar eventuais os “pitfalls” ou armadilhas.

Existem, pelo menos, três grupos básicos de heurísticas:

Heurística da Disponibilidade: o diagnóstico mais provável é o primeiro que se torna disponível no pensamento. Por vezes irrefutável, tal heurística se relaciona com a frequência e proximidade temporal de casos similares.

Um exemplo é a apresentação de um paciente com pródromo inespecífico – tal como cefaleia e mialgia – no setor de emergência durante o inverno. A incidência de gripe e resfriados por agentes virais inespecíficos nesse período é grande e a procura pelo setor de emergência pode se tornar muito frequente. Por isso, o plantonista automaticamente poderá se precipitar e concluir se tratar de uma gripe ou resfriado, sem sequer considerar outras causas de Síndrome Gripal.

LEIA MAIS: Ciclo de tomada de decisão baseada em evidências – os 6 passos

Heurística da Representatividade: o diagnóstico mais provável é o que tem o quadro clínico mais “parecido” com o caso em investigação. O raciocínio tende a ser enviesado baseando-se em um estereótipo comum da doença e ignorando outras informações, como a epidemiologia.

Pode ser ilustrada por meio de um generalista no Rio de Janeiro que, diante de um quadro marcado por febre, sudorese noturna e emagrecimento em um rapaz jovem, cogita e estaciona na hipótese de Linfoma, não descartando outras possibilidades frequentes, como Tuberculose Pulmonar. Tal negligência se dá principalmente pela semelhança das apresentações e pode ocorrer também quando se ignoram outras informações do paciente, como a história familiar.

Heurística da Ancoragem e Ajustamento: o diagnóstico mais provável é aquele que é justificado pela história patológica pregressa do paciente. O ponto de partida para o raciocínio clínico se torna a comorbidade do paciente, reduzindo-se os possíveis nexos causais.

Citemos um paciente com HAS há mais de 10 anos, que se queixa de “perda visual” recente. Talvez o primeiro raciocínio fisiopatológico culpe a própria doença de base pelo déficit visual, taxando-o imediatamente como portador de retinopatia hipertensiva. Pensar no mais óbvio é indispensável, o problema é restringir hipóteses ancorando-se unicamente em uma ou outra comorbidade. Pode ser mais uma pedra no caminho!

Muitas outras heurísticas derivam desses três grupos básicos. Entretanto, como podemos usufruir dessas estratégias que nos facilitam e evitar as mais armadilhas inerentes? Em breve abordaremos esse tópico.

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Referências:

  1. BASTOS, R. O Método Clínico. Editora Bartlebee. 2013.
  2. MACEDO, MAS.; OLIVEIRA, MA.; ALYRIO, DR.; ANDRADE, ROB.Heurísticas e vieses de decisão: a racionalidade limitada no processo decisório. Organizational Behavior and Human Resources Management Paper Sessions.
  3. VICKREY, BG.; SAMUELS, MA.; ROPPER, AH. How neurologists think: a cognitive psychology perspective on missed diagnoses. Annals of Neurology. DOI: 10.1002/ana.21907. Posted online on April, 2010.

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